A polémica surgiu pela voz de Pedro Nuno Santos, que, no fim de semana da semana passada, levantou suspeitas sobre a intervenção de consultores externos na elaboração do plano de emergência para a Saúde anunciado pelo Governo de Luís Montenegro. O líder socialista exigiu saber se essa colaboração teria acontecido e se a empresa, ou os consultores, teriam tido acesso a dados confidenciais do SNS.
O Governo esclareceu nas horas seguintes. O recurso aos consultores da IQVIA tinha acontecido, tal como já o tinha sido inúmeras vezes por iniciativa dos Governos socialistas. Nas horas seguintes, foram publicados na imprensa os 55 contratos e o valor pago pelos anteriores Governos à IQVIA.
Da IQVIA para o Governo
O que não dito é que Manuel Delgado foi diretor-geral da consultora IASIST Portugal (que pertence ao grupo de empresas da IQVIA) e que nos últimos anos tem feito consultoria ao Ministério da Saúde. Cargo que abandonou quando Adalberto Campos Fernandes, ministro da Saúde do primeiro Governo de António Costa, o convidou para ocupar o lugar de secretário de Estado. Entre 2015 e 2017, Manuel Delgado foi colega de Pedro Nuno Santos, na altura secretário de Estado Adjunto do então primeiro-ministro.
O agora consultor do Ministério da Saúde, em representação da IQVIA, só abandonou o Governo na sequência do escândalo Raríssimas, um caso de desvio de verbas da associação em que esteve envolvida a sua presidente Paula Brito e Costa e o secretário de Estado da tutela, Manuel Delgado, que tinha sido consultor da associação. Apesar de estar a par da situação irregular da Raríssimas, o ex -secretário de Estado aceitou o pagamento de 3000€ mensais, sabendo que estava a ser pago com subsídios do Estado destinadas ao apoio de crianças com doenças raras. No total, Manuel Delgado recebeu 63 mil euros da associação.
O escândalo levou à sua demissão do Governo. Mas, pouco tempo depois, o ex-secretário de Estado voltou a trabalhar com o Ministério da Saúde. Regressado à empresa na qualidade de consultor, funções que desempenha atualmente, Delgado recorreu aos seus conhecimentos no Ministério da Saúde e voltou a trabalhar com os Governos socialistas. Mesmo depois de Adalberto Campos Fernandes ter sido sibstituído no cargo por Marta Temido.
Pedro Nuno quis criar um caso mas enganou-se no alvo
Aparentemente, o líder socialista foi insuficientemente informado quando lhe falaram no recurso a consultores externos na elaboração do plano de emergência para a Saúde.
A gaffe acabou por cair em cima do partido e da própria cabeça de lista às eleições europeias, que, na tentativa de defender as denúncias do líder, acabou a ter que justificar a sua própria ação, assim que se soube que também ela tinha recorrido aos mesmos consultores.
Para piorar a situação, Pedro Nuno Santos, que esteve sempre ao lado de Marta Temido na campanha eleitoral, não apareceu na passada segunda-feira e deixou a candidata ao Parlamento Europeu a ter que se justificar-se sozinha, ao mesmo tempo que lhe coube a difícil tarefa de explicar as acusações do secretário-geral do partido.
O que faltava saber é que a consultora foi representada no Ministério por alguém que chegou a fazer parte do Governo, tendo depois regressado para a mesma empresa e continuado a colaborar com os governantes socialistas.
Manuel Delgado é licenciado em Economia e pós-graduado em administração hospitalar. Antes de integrar o grupo IQVIA, ocupou lugares de administração em vários hospitais públicos da região de Lisboa.
No Governo de António Guterres foi membro do Conselho de Reflexão sobre a Saúde, grupo de trabalho nomeado pelo Governo para o estudo da reforma do sistema de saúde português.
Ingressa no grupo de consultores IQVIA em 2010, de onde sai para assumir um lugar no Governo de António Costa entre 2015 e 2017.
Assim que abandonou o Governo, Manuel Delgado regressou ao grupo, onde exerceu várias funções de direção, sendo atualmente consultor do grupo.
Um currículo quase sempre ligado a Governos socialistas, que Pedro Nuno Santos não deveria desconhecer e que acabou por descredibilizar um ataque que pretendia violento contra o Governo da AD.