OE 2025. Conversas antes das férias

Vai ser um longo processo negocial em que o governo quer mostrar disponibilidade para acolher ideias. Se correr bem, o OE passa; se não, é a melhor forma para ir a eleições

Desde que tomou posse como primeiro-ministro que Luís Montenegro sabe que o momento decisivo da sobrevivência do seu Governo tem uma mês marcado: outubro de 2024, data em que tem de entregar a proposta de Orçamento do Estado para 2025 na Assembleia da República.

Se a ação do Governo ao longo destes primeiros meses e os resultados das eleições europeias são marcos importantes para refrear tentações de acelerar nova crise política, não são, no entanto, suficientes para garantir que o chumbo do Orçamento é uma hipótese totalmente afastada.

Nos últimos dias, vozes do PS têm-se feito ouvir, lamentando a ausência de diálogo do Governo com os partidos da Oposição, e esse tem sido o argumento para deixar tudo em aberto. Do «praticamente impossível» inicial, ao «muito difícil» mais recente, os socialistas continuam a não fechar completamente as portas a uma possível viailização do orçamento através da abstenção. As dúvidas colocam-se desde logo porque no interior do partido não há consenso sobre o que fazer, e a própria direção espera para ver o evoluir dos acontecimentos, sendo certo que Pedro Nuno Santos preferiria que fosse o Chega a dar a mão a Montenegro, deixando os socialistas de fora.

Do lado do Chega, a imprevisibilidade é a nota dominante. Ao longo dos meses de governação foram mais as vezes em que AD e Chega se desentenderam do que aquelas em que houve entendimentos. No Governo e na bancada parlamentar dos sociais-democratas multiplicam-se as queixas sobre a quebra de compromissos, tornando o partido de André Ventura uma incógnita e um parceiro não confiável.

Conversas com a oposição começam já em julho 

Apesar de só ser apresentado em outubro para votação na generalidade, o Governo quer iniciar o mais breve possível os trabalhos para a elaboração do documento. 

Ao que sabe o Nascer do SOL, «o Governo vai preventivamente falar com os partidos todos» já nas próximas semanas. Fonte governamental diz ao nosso jornal que a ideia é manter «um contacto permanente»ao longo de todo o processo. «Queremos recolher ideias e contributos», ao mesmo tempo que o orçamento vai sendo construído no Ministério das Finanças. 

A forma como as conversas vão decorrer está ainda a ser pensada no núcleo duro do Governo. Por decidir está ainda se e quando é que pode haver uma intervenção do próprio primeiro-ministro. Em princípio, é certo que o processo negocial terá um momento solene de visibilidade em que Luís Montenegro chamará os líderes dos vários partidos para audiências formais em São Bento. Por decidir está ainda se este vai ser o momento inicial do processo, ou se ele só ocorrerá mais tarde, depois dos primeiros contactos no Parlamento. É provavel que a rentrée política venha a ser marcada por esses encontros, até porque, desde que tomou posse, Montenegro ainda não recebeu os líderes da Oposição na Residência Oficial de S. Bento. A negociação do orçamento deverá ser o momento escolhido para esses primeiros encontros formais. 

Pedro Duarte e Sarmento serão os negociadores 

A negociação mais substancial será assumida pelos ministros dos Assuntos Parlamentares e das Finanças. Os dois terão um longo trabalho para conseguirem chegar à elaboração de um orçamento que possa ter hipóteses de ser aprovado no Parlamento mais fragmentado de sempre. 

Nas várias conversas, os dois ministros vão «sondar o que pode ser determinante para viabilizar», conscientes de que até essa tarefa não será fácil. 

Esta semana, António Mendonça Mendes, ex-secretário de Estado Adjunto de António Costa, traçava as metas futuras para o Governo: «O Governo vai ter que decidir com quem quer negociar o Orçamento e se essa negociação ocorrerá antes ou depois da apresentação do Orçamento na Assembleia da República». 

Uma das questões está respondida, o Governo quer mesmo negociar com a Oposição durante o processo de elaboração do orçamento. Mas a tarefa não será fácil, porque o documento deve refletir as opções do programa da AD e, simultaneamente, dar sinais ao Chega, ao PS ou aos dois partidos de que algumas das suas exigências também estão incluídas, para dar margem a uma possível aprovação, com ganhos claros para o(s) partido(s) que o decida(m) fazer.

Nas contas do orçamento deverão ser incluídas medidas já aprovadas na Assembleia da República pela Oposição contra a vontade do Governo, como é o caso da extinção de portagens das SCUT, o alargamento da deduçãode despesas com habitação em sede de IRS, o aumento do consumo de eletricidade sujeito à taxa reduzida de IVA – todas elas com impacto orçamental. 

Se a tudo isto Chega e PS quiserem juntar mais despesa para admitirem votar o Orçamento, as coisas podem complicar-se muito para o lado do Governo.

Não foi por acaso que Luís Montenegro fez questão de juntar PS e Chega na apresentação de propostas irresponsáveis que podem colocar em risco as contas públicas. O primeiro-ministro quer começar já a condicionar as exigências para o processo de negociação orçamental e sabe que agitar com as contas certas é o melhor argumento para tentar refrear tentações despesistas do.

 A aposta é procurar entendimentos, mas na cabeça de Montenegro está também o ‘plano b’: aproveitar um processo negocial falhado para ganhar votos em eventuais eleições antecipadas.