Que os festivais de verão são um motor importante para a economia, é certo. Basta reparar que, na pandemia, em 2020, o efeito do cancelamento destes espetáculos teve um impacto superior a 1,6 mil milhões de euros na economia portuguesa.
No entanto, não se sabe ao certo quanto é que os festivais de verão dão à economia portuguesa. Podemos dizer que são milhares de milhões mas não há estudos que o comprovem. Ao i, Daniel Sá, diretor executivo do Instituto Português de Administração de Marketing (IPAM), defende que a indústria dos festivais de música em Portugal “não tem esse impacto calculado, ou seja, não existem dados para a realidade portuguesa do impacto nacional deste conjunto de indústrias”.
Mas lembra que vão aparecendo alguns estudos em relação a festivais específicos como é o caso do Primavera Sound. Os dados mais recentes mostram que este festival, que se realiza no Porto, gerou este ano menos cinco milhões de euros de impacto económico (43,4 milhões de euros) do que em 2023 (48,5 milhões de euros) que já tinha ultrapassado em 12,4 milhões de euros a edição de 2022. Esta é a conclusão do estudo do ISAG-European Business School e do Centro de Investigação em Ciências Empresariais e Turismo da Fundação Consuelo Vieira da Costa (CICETFCVC), que acrescenta que os visitantes gastaram, em média, 126,85 euros no recinto do festival. Já os residentes fora da Área Metropolitana do Porto (AMP) ou no estrangeiro realizaram uma despesa média diária de 397,87 euros.
O diretor executivo do IPAM defende, no entanto, que “é fácil perceber, mesmo sem termos estudos, que à quantidade de festivais, à diversidade de localizações e ao número de bilhetes vendidos, estamos a falar de uma indústria importante e que gera impactos diretos e indiretos na economia nacional. Isso é inegável e são boas notícias para a economia portuguesa”, defende ao i.
Mas nem todos são a favor da importância dos festivais de verão e há quem diga que Portugal tem este género de eventos em excesso. Uma ideia que Daniel Sá rejeita, ainda que a entenda. “A questão do excesso de oferta é discutível”, começa por dizer. Mas explica: “Fica essa sensação, evidente que sim. Parece que estamos aqui três ou quatro meses seguidos com festivais uns atrás dos outros mas é preciso entender que o modelo de negócio da indústria da música mudou muito nos últimos anos”, detalhando que as bandas e as editoras “ganhavam dinheiro, durante muitas décadas, com a venda dos discos, dos CDs e, neste momento, com a questão do streaming, o modelo de negócio reinventou-se”. Daniel Sá explica ainda que o peso da música ao vivo “ganhou uma importância extraordinária em termos de receitas. Significa isto que uma banda, para sobreviver, tem que dar muito mais espetáculos ao vivo hoje do que há 10, 20 ou 30 anos porque depende muito mais disso em termos das receitas e da sobrevivência”.
A explicação continua: “A indústria moldou-se de alguma forma para o ‘ao vivo’ e a música, sendo possível segmentá-la para tantos públicos diferentes, há sempre forma de ir alimentando esta indústria com diferentes festivais e ainda por cima porque se continua a atrair também públicos estrangeiros, quer os que já cá estão em turismo quer os que propositadamente vêm para cá”.
Daniel Sá admite, no entanto, que “ainda não estamos no momento de saturação dos festivais de música, acho que ainda há espaço para crescer”.
É preciso ainda ter em conta que há milhares de estrangeiros a vir ao nosso país para assistir a concertos. Algo que é importante também para a nossa economia. Para ilustrar melhor a importância que os estrangeiros dão aos festivais no nosso país, Daniel Sá dá como exemplo o festival que tem início já esta semana, o NOS Alive. “Nos últimos anos tem aparecido recorrentemente numa lista de top10, top20 dos melhores festivais de verão da Europa. Não apenas pelo cartaz que costuma apresentar mas também pelo pacote. Isto não é só o que consumimos dentro do recinto mas também fora. E o fora, temos no fundo esta experiência sempre portuguesa de boa comida, segurança, boa qualidade, simpatia, este conceito de affordable service que temos em Portugal e muitas vezes mais competitivo e mais barato que em termos europeus”.
O especialista diz que “por estranho que pareça, para um inglês fica mais barato ir ao NOS Alive do que ia a Glastonbury [segundo maior festival de música a céu aberto do mundo] e está à porta de casa. Continuamos a ser uma boa solução”, defende.
Aposta das marcas
Há cada vez mais marcas a estarem presentes nestes festivais e que fazem várias publicidades nas suas tendas, dando-se a conhecer. Têm todas lucro? Certamente que sim. “São compensados. As marcas quando investem um euro nestes festivais têm estudos que lhes provam o retorno que conseguem ter. Portanto, se as marcas cada vez investem mais, é porque têm o retorno que esperam”, garante o diretor executivo do IPAM, defendendo que a música oferece duas coisas muito importantes. Uma delas é a visibilidade. “O mediatismo que estes festivais de música têm, a capacidade que é possível, que os festivais geram quer antes quer durante os eventos de mostrar as marcas”, diz. Por outro lado, “tão importante como a visibilidade, é a associação de conceitos. É a possibilidade de as marcas estarem envolvidas com este mundo da música que tipicamente tem bom clima, tem bom espírito e as marcas ficam associadas à parte boa que a música também consegue gerar”, finaliza.
Um cenário que é destacado pela Associação Portuguesa de Festivais de Música (Aporfest ) ao referir que uma das formas mais visíveis pelas quais as marcas apoiam os festivais de música em Portugal é através “de patrocínios ou naming sponsor (um fenómeno com maior incidência em Portugal se compararmos com outros países europeus resultante da nossa situação económica: para conseguirmos ter cartazes semelhantes à restante Europa e bilhetes dentro do poder de compra dos portugueses é preciso um apoio financeiro maior), fornecendo muitas vezes apoio financeiro em troca de visibilidade para a marca”.
E lembra que, “ao criar experiências únicas e imersivas, as marcas podem criar conexões mais profundas com os frequentadores do festival, promovendo a fidelidade à marca e criando associações positivas para a mesma”, acrescentando que “se o público tiver uma boa experiência num festival com naming sponsor, irá automaticamente associar esse sentimento positivo à marca pois ela está no nome do festival”.
Um desses casos é a Super Bock que dá nome a um festival com a marca a referir que “a música é um território muito importante” e que a sua associação aos festivais de música “surgiu de forma muito natural, há quase 30 anos, e faz hoje parte do ADN da marca Super Bock”, diz ao i Bruno Albuquerque, diretor de Marketing cervejas e patrocínios Super Bock Group. “Esta associação começou em 1995, quando nos tornámos naming sponsor do Super Bock Super Rock – desde então que esta tem sido uma aposta contínua e muito consistente, até porque os festivais de música nos dão a possibilidade de criar um conjunto de ativações que permitem reforçar a relação positiva que temos construído neste campo com os nossos consumidores”.
Além disso, a marca está presente na maioria dos festivais, concertos e salas de espetáculo com o responsável a referir que “espelha a estratégia de marketing e branding” da empresa.
Bruno Albuquerque diz ainda que essa aposta é para se manter. “A nossa maior motivação é a possibilidade de estarmos em constante contacto com os nossos consumidores. Nos festivais de música temos a oportunidade de estabelecer uma ligação emocional e uma relação de maior proximidade com eles – seja nos recintos dos festivais ou até mesmo nas redes sociais, onde temos uma excelente interação com quem nos segue”. E por estarem presentes em festivais reconhece que é uma forma de estarem próximos junto dos consumidores “em momentos que são muito valorizados pelo convívio, pela partilha com os amigos e pelas memórias que são criadas”.
O mesmo exemplo é seguida pela MEO através do apoio e presença em vários festivais de norte a sul do país, e ilhas, bem como em eventos de música nacionais. “Enquanto território muito disputado pelas marcas, o MEO tem hoje uma presença singular na música, dando naming a quatro festivais de verão – MEO Marés Vivas, MEO Kalorama, MEO Monte Verde e MEO Sons do Mar –, à maior sala de espetáculos do país, e através do apoio a diversos artistas, nos quais se destacam Carolina Deslandes ou Barbara Tinoco”, refere ao i Luiza Galindo, diretora de Marca e Comunicação da MEO. E destaca: “Os festivais são uma oportunidade para as marcas chegarem a diferentes públicos e criarem relações. São também eventos nos quais as pessoas estão mais disponíveis a viver momentos reais e que despertam sensações positivas e que guardam na memória. E é tendo isto em mente que o MEO irá continuar a apostar na música e nos festivais de verão como forma de aproximar-se dos seus clientes e potenciais clientes. O nosso objetivo passa por continuar a oferecer novas e inesquecíveis experiências ao público e a todos os que visitam os nossos festivais”.
Quanto à aposta, a responsável destaca que “enquanto marca, o MEO pretende ser o elo entre as pessoas e a música, estar presente nos seus momentos de entretenimento e diversão. Seja através das ativações existentes nos recintos de cada festival, da app MEO gestivais ou das redes sociais oficiais dos festivais, pretendemos aproximar-nos dos nossos clientes, estabelecendo uma relação positiva e duradoura, e enfatizando os valores e os atributos pelos quais o MEO se rege, como a proximidade, a responsabilidade, a intervenção e a empatia que, para além de convicções, são também drivers para a gestão do seu negócio. E lembra que mais que o retorno no investimento destaca retorno humano, “nas ligações que se criam através das experiências proporcionadas. É nesse sentido que no dia-a-dia procuramos dar as melhores experiências aos nossos clientes”.
Também a NOS “assume, desde sempre, um papel importante nos mais variados quadrantes da sociedade, em especial no da cultura, no qual tem um contributo direto”, refere ao i Daniel Beato, administrador da NOS, acrescentando que “o impacto para a marca de um evento desta dimensão é muito significativo e a nossa presença é amplamente reconhecida por quem vai ao festival, mas também por quem não vai. Isso é o melhor indicador que temos e que nos mostra, ano após ano, o quão importante é estarmos associados a este grande evento e participarmos ativamente no seu crescimento”.
O responsável diz ainda que o NOS Alive “é um dos melhores festivais de música do mundo, no qual temos uma presença estrutural que queremos que seja cada vez mais completa e especial e que passa por garantir a entrega de uma rede de excelência que suporta todas as operações do festival; demonstrar o poder da tecnologia, principalmente do 5G, através de iniciativas transformadoras; e, ainda, proporcionar aos festivaleiros – clientes e não clientes – a melhor experiência, dentro e fora do recinto”. Quanto ao impacto Daniel Beato refere que “mas mais do que métricas quantitativas é a componente qualitativa da relação e da imagem, muitas vezes não mensurável no imediato, que nos move para o território da música e para uma aposta continuada no tempo”. E não hesita: “A NOS lidera habitualmente o espaço mediático associado aos festivais, o que é um ótimo indicador e o reflexo do sucesso das iniciativas que desenvolvemos, associadas ao NOS Alive”.
Também Filipa Lopes Ribeiro, Global Head of Brand Strategy da Galp diz que a presença da marca em festivais de música, mais concretamente no Rock in Rio Lisboa, acaba por materializar o seu posicionamento junto dos portugueses. “É uma forma de transmitirmos a mensagem de que estamos, de facto, sempre com eles. Estamos há décadas junto das pessoas, todos os dias, através da relação tradicional de fornecedor de energia, mas também nos momentos de celebração, como é exemplo o Rock in Rio”, afirma ao nosso jornal, referindo ainda que se trata de “um palco privilegiado para desenvolvermos ativações de marca em torno da jornada de transformação que a Galp tem em curso, dos nossos valores e, não menos importante, para celebrarmos a energia das nossas pessoas – colaboradores e clientes –, que acabam por estar no centro da matriz do propósito Galp”.
A empresa lembra ainda que a sua presença nestes eventos acaba por fortalecer a marca. “O Rock in Rio, pela sua enorme capacidade mobilizadora – ao todo, estiveram na recente edição 300 mil pessoas –, dá-nos a oportunidade de comunicar para milhões de pessoas. Não só com as que estão dentro do festival, mas também com todas aquelas que acompanham o que se vive no recinto pela televisão ou por outro canal”. E acrescenta: “É um palco de excelência para transmitirmos as nossas mensagens e fortalecer a nossa relação com clientes atuais e potenciais. Mais do que falar em métricas e números, estamos neste território para estar cada vez mais próximos das pessoas. A adesão que tivemos nos nossos espaços do festival – Palco Galp, stand Energy Land e loja – e o feedback que temos recebido ajuda-nos a perceber que as coisas estão a ser bem feitas”. Já em relação aos custos, a Galp diz que não comenta publicamente os investimentos associados à sua estratégia de patrocínios.
Interação é a palavra de ordem
A possibilidade de estar próximo dos cidadãos é um das vantagens apontadas ao i por Ricardo Sacoto Lagoa, coordenador de Marketing e Comunicação da Sociedade Ponto Verde. “A SPV leva a reciclagem de embalagens aos festivais de verão porque estes eventos são uma oportunidade para darmos continuidade àquela que é a nossa missão: a valorização e reciclagem dos resíduos gerados, nomeadamente resíduos de embalagem, e sensibilizar o público presente, para que reciclem sempre as suas embalagens, onde quer que estejam. No fundo, estamos a contribuir para que o país alcance as novas metas da reciclagem de embalagens já em 2025”.
E se, por um lado, há um contacto direto com o público, por outro lado, também dão apoio aos promotores destes eventos para que haja boas condições no recinto para assegurar a reciclagem de embalagens, o que significa que é feito um investimento na colocação de estruturas de ecopontos nos locais com mais afluência de pessoas e em equipas de mochileiros com ecopontos móveis. “A SPV investe nas infraestruturas de ecopontos e na sinalética dedicada à reciclagem de embalagens, que são distribuídas pelo recinto; no desenvolvimento das ativações/experiências que queremos proporcionar aos festivaleiros, e nas quais procuramos, sempre, introduzir uma componente didática, mas também divertida, com o intuito de gerar mais impacto; e nos recursos humanos que são necessários para implementarmos as nossas ações”, acrescentando que o “retorno, por sua vez, traduz-se no envolvimento direto com os milhares de festivaleiros, que interagem, se divertem e aprendem mais connosco sobre reciclagem de embalagens, e na quantidade de resíduos de embalagens que são recolhidos nos festivais e encaminhados para reciclagem”.
De acordo com o responsável esta presença é para continuar. “Temos de ser capazes de levar este tema aos cidadãos, através de uma experiência de marca positiva, relevante e divertida. Ao conseguirmos gerar proximidade e atratividade, estimulamos que os bons resultados ambientais sejam gerados logo no próprio evento, somando, por sua vez, aos resultados globais, a níveis nacional”.
Já para a Hyundai “a música faz parte” do seu ADN, recordando que é o terceiro ano consecutivo que participa no NOS Alive e acabou de participar no Rock in Rio pela segunda vez. “Enquanto viatura oficial todos os artistas e carros de apoio são da Hyundai, este ponto é especialmente importante pois conseguimos garantir um apoio total da logística do evento”, assim como aproveita para ter uma série de viaturas nos recintos. O retorno é a visibilidade que garantimos e a ligação que estabelecemos com o mundo da música”, diz fonte oficial da marca.
Em relação ao futuro diz que a ligação à música é para continuar, nomeadamente a ação Hyundai Rock the Progress, cujo objetivo é fazer crescer nos próximos anos. “A Hyundai é pelo progresso pela humanidade e tudo o que fazemos inspira-nos a conceber, criar e inovar. Para nós, faz todo o sentido esta vertente de investir em pessoas e bandas emergentes apoiando quem mais se dedica e eleva o seu talento”, salienta.
Uma estratégia que também sido seguida pelo Continente. “O território da música está associado a alegria e mobilização pela positiva, valores que a marca Continente defende e promove e, por isso, a associação a festivais de música, como o Rock in Rio, surge de forma natural. Através deste tipo de parceria, queremos reforçar os laços de proximidade com os consumidores, contribuindo para lhes proporcionar momentos de descontração e lazer. Por outro lado, estas parcerias permitem-nos democratizar o acesso das famílias e jovens a novas experiências gastronómicas, a preços acessíveis, fazendo com que o nosso relacionamento com os clientes vá para além das nossas lojas e serviços”, diz o porta-voz da marca, lembrando que nesta última edição do apostou num novo espaço, o Continente Chef’s Garden, “que este ano apresentou um novo restaurante pop up da Cozinha Continente, onde serviu pratos tradicionais portugueses, com a curadoria do chef André Matos, Chef Executivo da Cozinha Continente”.
De acordo com porta-voz do Continente, os festivais de música permitem “proporcionar experiências para todos os interesses e faixas etárias, reforçando a nossa proposta de valor enquanto marca”, lembrando que “o reconhecimento dos nossos clientes é o melhor retorno que podemos medir nestas ativações de marca”.
E acrescenta: “A presença em momentos de celebração e diversão das famílias é muito relevante para as marcas, pois conseguem aproximar-se dos seus clientes em contextos mais diferenciados e mostrar-lhes que os acompanham nos mais atípicos cenários. O Continente aposta há muitos anos neste tipo de parcerias e tem conseguido marcar a diferença e inovar na forma como ativa a sua marca ao mesmo tempo que mantém a sua identidade e valores, e a garantia de qualidade da sua oferta”.
Além do Rock in Rio dá outro exemplo que aposta ‘dentro de casa’. Trata-se do Festival da Comida Continente, “que é já um marco na agenda dos festivais em Portugal, produzido de A a Z pelas equipas multidisciplinares do Continente, com o apoio de vários parceiros, reflete bem o posicionamento da marca e a sua maneira de encarar o negócio, que vai muito além dos números: centra-se, acima de tudo, nas pessoas e no seu bem-estar”.
A ideia destas iniciativas, de acordo com a marca, é provar “que um supermercado não é só um supermercado, é um companheiro, um apoio que está disponível para servir todas as pessoas à medida dos seus gostos, onde quer que estejam”.