Os sinais já eram visíveis e o desfecho previsível. Para poder sobreviver, a Inapa pediu 12 milhões de euros para «necessidades de tesouraria imediatas na operação na Alemanha quando já tinha um pedido de 15 milhões de euros para reestruturação», mas viu esta pretensão negada pelo Ministério das Finanças. O grupo que tem como principal acionista a empresa pública Parpública (44,89% do capital) – conta ainda com acionistas como a Nova Expressão (10,85%) e o Novo Banco (6,55%), tendo o restante capital disperso – já enfrenta problemas há vários anos e a agravar esta situação está ainda o facto de a distribuidora portuguesa de papel de impressão, embalagens e comunicação visual enfrentar na última década uma situação conturbada, quer do ponto de vista operacional, quer do ponto de vista acionista, como admitem os analistas contactados pelo Nascer do SOL.
O economista do banco Carregosa Paulo Monteiro Rosa lembra que nos últimos 25 anos a Inapa perdeu quase 95% do seu valor em bolsa, dos 250 milhões de euros de valor de mercado em 2000 para os atuais 15 milhões de euros, «vítima sobretudo da gradual perda de importância do negócio do papel no mundo atual», agravado pela adoção do teletrabalho no pós pandemia e pela subida das taxas de juro nos últimos dois anos, comprometendo a viabilidade económica da empresa. E chama ainda a atenção para o facto de, nos últimos 15 anos, os prejuízos terem acompanhado a empresa na maior parte dos exercícios. «Em 2023, as receitas da Inapa caíram 20,1% e a empresa passou de lucros a prejuízos de 7,99 milhões, resultados penalizados sobretudo pelo aumento dos custos financeiros de financiamento, impulsionados pelo agravamento das condições de crédito. O BCE aumentou as taxas e juro em 450 pontos base nos últimos dois anos», salienta.
Também Vítor Madeira, analista da XTB, diz que, por ter desvalorizado perto de 99% desde os seus máximos, «a probabilidade de vir a falir era alta», situação agravada ainda pelo rácio dos ativos intangíveis que no seu total de ativos ultrapassa os 50%, «o que não é normal neste tipo de empresas» – e, se forem retirado os ativos intangíveis, o seu capital próprio ficaria negativo em cerca de 190 milhões, o que demonstra que a empresa «se encontrava em estado crítico» e a dívida total ultrapassava já os 222 milhões («uma dimensão bastante alta em função do capital próprio da empresa, que num contexto de taxas de juro altas podia tornar-se impagável».
Mas o responsável justifica esta queda. «A empresa vinha a passar dificuldades e o interesse dos acionistas foi-se desvanecendo. Numa ótica de mercado, quando uma empresa não consegue adaptar-se às circunstâncias o resultado é sair do mercado, que é ao que estamos a assistir neste momento. Quando olhamos para a prestação das ações da Inapa conseguimos entender facilmente que a procura pela empresa tinha vindo a cair desde 2006».
Já quanto aos principais prejudicados com o processo de insolvência, Paulo Monteiro Rosa não tem dúvidas de que os principais afetados serão os acionistas da empresa, nomeadamente o maior, o Estado português. E lembra que, «num processo de insolvência, os acionistas ordinários são os últimos a receber, estando no final da estrutura de capital de uma empresa. Em primeiro está o próprio Estado e os trabalhadores, seguindo-se os detentores de dívida sénior, subordinada, as ações preferenciais e, em último, as ações ordinárias», referindo ainda que «a existência de um comprador não é por si só uma salvaguarda do património dos investidores, sobretudo dos detentores de ações. Em boa verdade, uma eventual compra poderia ser efetuada por um valor simbólico». Apesar de ter sede em Portugal, os principais mercados da Inapa são a Alemanha — responsável por mais de metade das receitas — e a França, num total de 10 países, daí Miranda Sarmento ter considerado que não se tratava de uma empresa estratégica para o país. No final do ano passado, o grupo tinha quase 1.500 trabalhadores, dos quais menos de 200 estavam em Portugal.