Com a reabertura das negociações entre Governo e partidos da Oposição em torno do Orçamento marcada já para a próxima semana, os atores políticos preparam-se para todos os cenários. Nas últimas semanas, foram muitos os avanços e recúos, particularmente dos dois partidos que têm na mão a chave da aprovação ou chumbo da proposta governamental. À beira de começar a negociar, as posições do PS e Chega parecem irredutíveis.
André Ventura diz que é «irrevogável» a decisão de ficar fora das negociações, decisão que reafirmou esta quinta-feira, anunciando que não vai estar presente na reunião da próxima terça-feira. O líder do Chega acusa Montengero de «traição», alegando que o Governo já está a negociar com o PS. «O Chega retira-se das negociações porque o Governo decidiu começar a negociar com o PS», afirmou Ventura.
Já o Partido Socialista, pela voz de Pedro Nuno Santos, anunciou condições intransponíveis para admitir deixar passar o Orçamento. À menção de que IRS jovem e IRC são matérias que os socialistas não aceitam tal como foram apresentadas na Assembleia da República, nos últimos dias vários responsáveis socialistas acrescentaram que «não há caminhos intermédios, ou o Governo desiste das duas propostas, ou não há entendimento possível».
Governo prepara-se para duodécimos
Num cenário de posições extremadas, o Governo parte para mais uma ronda de negociações com a consciência de que «as coisas podem mesmo correr mal». Se a posição do PS se mantiver inflexível, «não há alternativa, não podemos abdicar das nossas bandeiras», diz-nos um deputado social-democrata e, sendo assim, o Orçamento chumba. «Este é o cenário mais provável neste momento», diz a mesma fonte ao Nascer do SOL.
Montenegro tem todos os cenários em cima da mesa, traçou um plano e vai segui-lo até ao fim. O primeiro-ministro não tenciona deixar que as ameaças de verão perturbem o processo negocial e vai sentar-se à mesa com os líderes políticos como se nada tivesse sido dito anteriormente. Consciente de que pisa gelo fino, Montenegro aposta na discrição e na imagem de decisor imperturbável, para atravessar o momento mais crítico da sua governação. Aconteça o que acontecer, o primeiro-ministro quer chegar ao pós-Orçamento com a imagem de que fez tudo para que as contas para 2025 fossem aprovadas.
Ao contrário do que muitos defendem no interior do PSD, Montenegro não tenciona demitir-se na sequência de um eventual chumbo do Orçamento. Tal como tem dito e repetido, «o Governo tem um mandato para governar até 2028 e esse mandato só pode ser interrompido através de uma moção de censura». Estas afirmações, garantem fontes governamentais, «mantêm-se inalteradas», pelo que se conclui que, em caso de chumbo do Orçamento, Montenegro vai continuar a governar com o Orçamento de Fernando Medina e ganha um trunfo político: «Tudo o que correr mal a partir daí é responsabilidade da oposição que bloqueou o governo», analisa um social-democrata ao nosso jornal.
Os planos de Montenegro só podem correr mal se Marcelo Rebelo de Sousa decidir em coerência com o que aconteceu em 2022, quando dissolveu o Parlamento depois de PCP e BE terem chumbado o Orçamento socialista. Os sinais, ou a ausência deles, vão, no entanto, em sentido contrário. Em 2022, o Presidente começou a avisar desde muito cedo que o chumbo do Orçamento conduziria irremediavelmente à dissolução da Assembleia da República e convocação de eleições antecipadas. Agora, Marcelo prefere manter um rigoroso silêncio sobre a matéria, o que no caso deste Presidente tem um significado: Marcelo não quer ficar para a história como o Presidente campeão das dissoluções (seria a terceira vez que o faria, algo que não aconteceu com nenhum dos seus antecessores) e, além disso, os sinais do eleitorado indicam que novas eleições muito dificilmente iriam resolver o atual impasse. Assim sendo, e apoiando-se em muitas opiniões divulgadas nos últimos meses, incluindo do seu antecessor, Cavaco Silva, também a opção presidencial deverá ser a de deixar Montenegro a governar em duodécimos.
Fantasma de Seguro assombra Pedro Nuno
Tem sido o tema mais discutido entre os socialistas praticamente desde o dia seguinte às eleições de março. O que deve fazer o PS no debate orçamental, sabendo que o Governo depende dos socialistas ou do Chega para conseguir a aprovação do documento. Pedro Nuno Santos foi dando sinais contraditórios ao longo do tempo – desde o «praticamente impossível» ao «vamos negociar» -, e as suas declarações foram gerando reação no interior do partido, que está praticamente dividido ao meio entre os que defendem a viabilização pela abstenção e os que defendem o chumbo.
De todos os argumentos, o que mais estará a determinar a decisão do líder socialista é o fantasma de António José Seguro. O então líder dos socialistas deixou passar o Orçamento de Passos Coelho no tempo da tróika e a maioria dos socialistas associa esse momento aoprenúncio do fim da sua liderança. Agora, nos corredores do Largo do Rato, há muita gente a prever o mesmo desfecho para Pedro Nuno Santos caso a decisão dos socialistas venha a ser a de deixar passar o Orçamento de Montenegro. Ao que nos foi referido, o secretário-geral será sensível a esse argumento e nos últimos dias decidiu endurecer a posição. Os próximos dias são decisivos para perceber se a decisão está tomada ou se Pedro Nuno ainda hesita.