São mais de 700 empresas russas e iranianas que entraram em Portugal ao abrigo de um programa do Ministério da Economia de concessão de vistos e autorização de residência a investidores fora da União Europeia . Ou seja, russos e iranianos são cerca de metade dos empreendedores de 55 países que se candidataram a este programa. Só da Federação Russa, instalaram-se em território nacional 430 startup e do Irão 275. Na lista consta ainda a Bielorrússia de onde chegaram 18 candidaturas aprovadas. Segundo O Nascer do SOL apurou, a embaixada da Ucrânia está a acompanhar esta situação apesar de ainda não ter iniciado contactos ou pedidos de informação a qualquer entidade governamental.
Sanções europeias
Em consequência da invasão da Federação Russa do território ucraniano, a União Europeia (UE)_impôs inúmeras sanções à Rússia em várias áreas. Foram definidas listas de bens que não podem ser importados ou exportados e de serviços europeus que não podem ser usufruídos na Rússia. Além de uma lista de indivíduos e entidades sancionadas. Também em setembro de 2022 o Conselho da UE suspendeu o acordo que existia com a Rússia de 2017 sobre facilitação da emissão de vistos, o qual consagrava «o desejo de facilitar os contactos interpessoais como condição essencial para um desenvolvimento progressivo dos laços económicos, humanitários, culturais, científicos e outros».
No entanto, a guerra colocou um ponto final nessa facilitação. Segundo a decisão do Conselho de 2022 «tendo em conta a deterioração da situação desencadeada pela agressão militar da Rússia contra a Ucrânia, o Conselho considera que se impõe suspender na sua totalidade a aplicação das disposições do Acordo que prevejam medidas de facilitação da emissão de vistos aos cidadãos da Federação da Rússia requerentes de vistos de curta duração a partir de Setembro de 2022».
Passando, assim, a ser aplicável aos cidadãos russos as regras gerais da emissão e de vistos. Desde então decretou -se «necessário apresentar provas documentais adicionais, os prazos de tratamento dos vistos serão mais longos e as regras para a emissão de vistos de entradas múltiplas serão mais restritivas». Entretanto, o programa do IAPMEI, denominado StartUp Visa, continuou o ser desenvolvido indiferente ao conflito ou às sanções.
StartUp Visa à vista
O StartUp Visa é um programa criado em 2018 que tem como finalidade «o acolhimento de imigrantes que pretendam empreender e inovar em Portugal, com vista à concessão dos respetivos visto de residência ou autorização de residência, ainda que não tenham constituído empresa em território nacional ou que, já tendo empresa criada no país de origem, queiram implantar -se no nosso país», conforme define o despacho 4/2018 de 2 de fevereiro. É destinado a empreendedores fora da UE. Existem 94 incubadoras em todo o país, municipais ou apenas empresariais, que estão certificadas para celebrarem contrato de incubação com estas startups. Os requisitos exigidos aos empreendedores são meramente de cariz económico e regras meramente administrativas: não ter residência permanente no Espaço Schengen; apresentar a situação contributiva regularizada; não possuir antecedentes criminais; terem meios financeiros próprios e de subsistência. Além disso é preciso que se declare o interesse efetivo em desenvolver em Portugal um projeto empreendedor, nomeadamente através da criação de empresas de base inovadora; atividades de produção de bens e serviços internacionalizáveis; projetos ou empresas que se focam em tecnologia e conhecimento e demonstrarem que pertencem a empresa em fase de arranque criada há menos de quatro anos, no país de origem.
Passando por estas exigências comuns a qualquer projeto de incubação internacional, é passada a declaração da Agência para a Competitividade e Inovação (IAPMEI), e é concedido o respetivo o visto. Cumprindo-se assim a prerrogativa especial que o Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE)_estabelece para a concessão de visto aos empreendedores deste programa.
Violações não intencionais
Este procedimento foi confirmado pelo MNE ao Nascer do SOL: «O MNE tem competência para processar pedidos de visto de residência para exercício de atividade profissional independente ou para imigrantes empreendedores, o que abrange projetos que tenham merecido certificação prévia do IAPMEI». Adianta ainda o comunicado enviado ao nosso jornal que «estes pedidos de vistos são objeto da análise e consultas de segurança previstas na lei e apenas podem ser solicitados após processo de validação das empresas por parte do IAPMEI, sendo a declaração emitida por aquela entidade condição sine qua non para a apresentação do pedido de visto junto do Posto Consular competente». No entanto o MNE garante que «uma candidatura aceite pelo IAPMEI não corresponde necessariamente a um visto concedido».
Fica a dúvida se é verificada a conformidade destas empresas e empreendedores com as sanções impostas pela UE à Rússia, Bielorrússia e Irão. Segundo fontes da Comissão Europeia, «a implementação das sanções cabe aos Estados Membros. A Comissão Europeia verifica se os Estados Membros implementam os regulamentos relacionados com as sanções de forma correta e de forma oportuna». Cada país deve «assegurar que a violação das sanções da UE seja punível com sanções penais eficazes e proporcionadas, que variam em função da infração. No entanto, a violação intencional de sanções deve dar origem a uma pena de prisão como pena máxima». Adiantando ainda que as violações detetadas são genericamente não intencionais.
Certo é que a procura por parte de empreendedores e empresas russas e iranianas não abrandou desde o início do conflito. Sobre a dimensão desproporcionada de empresas destes países no programa e que através dele obtiveram vistos, o MNE remete a resposta para o IAPMEI, enquanto a entidade que valida as candidaturas explicou ao Nascer do SOL que «as candidaturas ao Programa StartUP Visa são avaliadas de acordo com os critérios estabelecidos pelo despacho que criou o programa».
Sendo uma das prerrogativas do programa StartUp Visa a inovação e o desenvolvimento tecnológico, as startups têm todas essa natureza e dedicam-se a áreas diversas como criptmoeda, soluções digitais nas áreas dos transportes e saúde ou gamers, como é o caso da SartUp Sintra, que o Nascer do SOL noticiou há três semanas, que tem no seu programa de incubação também um número desproporcional de empreendedores russos e iranianos.