Luís Montenegro (LM) achou que conseguia um simulacro de maioria de direita estalando o chicote para enfiar à força André Ventura (AV) e os seus 50 deputados conservadores no redil social-democrata. Acomodaria, assim, uma dupla realidade: por um lado, para inglês e esquerda verem, a direita tinha maioria absoluta no Parlamento; mas, por outro lado e para o que para ele importava, que era governar à esquerda com os votos da direita, os 50 deputados do Chega já não contavam. Mas enganou-se. As 50 ‘ovelhas negras’ recusaram-se a ser tosquiadas no redil da filial caseira do PPE da Sra. von der Leyen. Alexandra Leitão, há dias, denunciou a tentativa de logro. Luís Montenegro imagina-se um génio da política caseira. A arrogância é má conselheira. E a duplicidade paga enquanto dura, ou seja, enquanto não é descoberta. Quando a poeira levantada nestes últimos dias assentar, Luís Montenegro irá perceber isso.
Mas vamos à poeira destes dias conturbados. De forma sucinta e clara, o que se passou foi isto:
Primeira nota, essencial: André Ventura nunca aceitou, como razoáveis, as linhas vermelhas postas ao Chega por Luís Montenegro. Principalmente após 10 de março, quando o povo de direita deu, aos partidos que considerava de direita, Chega e PSD, uma larga maioria. AV sustentou, sempre, que a ausência de um acordo de fundo, para uma legislatura, entre PSD e Chega constituía uma traição ao eleitorado de direita. Recusou sempre acordos meramente pontuais, ainda que devidamente adornados com lugares num futuro governo.
Nas reuniões ditas secretas com LM, aos acordos pontuais propostos por este, AV respondeu, sempre, da mesma forma: não aceitamos acordos pontuais, apenas um acordo estrutural para uma legislatura. E, de uma ou de outra forma, foi sempre isto que AV declarou e afirmou. Alguns de nós, na Direção do partido, seguimos isto a par e passo e sabemos bem como tudo se passou. Quanto aos famosos ziguezagues de que AV é acusado derivam não das palavras deste, mas da interpretação delas feita pelos jornalistas e comentadores do costume. Já agora e por falar neles: estes (na sua maioria, pois há honrosas exceções) diligentes serviçais da casta decretaram que AV não era «credível». Seja lá o que eles querem dizer com isso. Mas quem passou alvará de ‘creditadores de credibilidade’ a estes zelosos fazedores de ‘credíveis’? Quem lhes passou licença de carimbo carimbo? Seguramente que lhes não foi passado por Jeová, como as tábuas da Lei a Moisés no monte Sinai, neste caso, numa versão mais caseira, no alto da serra de Arga, ou dos Candeeiros. Haja paciência. Voltando ao nosso caso e em conclusão: AV, na passada terça-feira, no respeito pelo voto dos seus eleitores, declarou que, uma vez que as condições do Chega (um acordo para uma legislatura e quatro orçamentos) não haviam sido aceites pelo Governo da AD, e dado o perfil claramente socialista deste Orçamento, o Chega iria votar contra. No colo do PS, que com o PSD negociou este Orçamento, fica o ónus de o aprovar ou reprovar. Simples. E o fim da teoria dos ziguezagues.
Com Rui Rocha, esquecendo a piada fácil do ‘queixinhas’ dos anos 60, de lacinho às bolas e de boné de pergamoide, bombo da festa da turma, o erro de deixar patente a irrelevância política do seu partido. E a sua, num triste episódio da política portuguesa.