Bárbara Barroso. ‘As pessoas procuram unicórnios, querem lucros elevados e risco baixo’

A especialista em finanças pessoais e fundadora do MoneyLab admite que, muitas vezes, os investidores andam à procura de milagres e diz que se nas gerações mais velhas o foco está na poupança, nas mais novas está no ganho.

Como avalia o nível de poupança dos portugueses?
Quando olhamos para o nível de poupança dos portugueses – ainda na semana passada divulgámos no nosso site os dados da taxa de poupança das famílias em Portugal que está nos 9,8% no segundo trimestre de 2024 – e quando comparamos, por exemplo, com a média europeia verificámos que está mais baixa. Ainda assim, nos últimos tempos aumentou esta capacidade resultante de um conjunto de fatores: um que está relacionado com a descida das taxas de juro, o que provoca automaticamente um alívio nas famílias, nomeadamente que tem empréstimos; outro é o facto de termos um abrandamento da inflação, ou seja, os preços continuam a subir, mas num ritmo mais baixo; e depois temos assistido a um aumento dos rendimentos, nomeadamente o salário, com a introdução de algumas alterações em termos fiscais. Isto faz com que haja mais rendimento disponível e que em termos económicos faz com que as taxas de poupança aumentem, ainda que permaneçam baixas relativamente à média europeia. No entanto, sinto, sobretudo, que não é uma poupança deliberada, ou seja, é resultante de sobra, mas não é uma poupança ativa.


Mas os portugueses têm folga financeira para pouparem?
É um desafio, principalmente se formos pegar no salário mínimo e no salário médio. Temos de olhar para o que aconteceu, sobretudo nos últimos anos, em que tivemos um aumento das taxas de juro, o que levou a um encarecimento da habitação e a um aumento também do mercado de arrendamento e quando vamos ver os dados do INE existem três grandes rubricas com maior peso no orçamento das famílias: habitação, alimentação e transportes. E tudo isto sofreu aumentos e aumentos superiores à subida dos salários, em que automaticamente há uma perda de poder de compra. E havendo esta perda de poder de compra torna mais desafiante a capacidade de poupança das famílias. O que sentimos no MoneyLab, quando falamos com as pessoas, é que com planeamento, com organização financeira e com algum método, algumas conseguem poupar, uns mais, outros menos, mas conseguem pelo menos aforrar e fazer um pé de meia todos os meses, nomeadamente para situações de imprevisto, o tal célebre fundo de emergência que tanto defendemos e que tanto falamos que é, no fundo, a construção de uma almofada financeira que permita perante uma situação imprevista, a pessoa não entrar, nem em rotura financeira, nem ter a necessidade de estar a recorrer a créditos para pagamento de despesas.


Há estudos que indicam que mais de metade dos portugueses poupa menos de 10%, o que representa uma margem muito curta. Qual seria a meta desejável para poupar?
Há duas visões. As boas práticas, em termos de planeamento e finanças pessoais, falam no mínimo em 10%. Isto é, colocar 10% de parte para a constituição, em primeiro lugar do fundo de emergência para depois definir outro tipo de objetivos. Tenho uma corrente mais conservadora, nomeadamente em termos de criação de hábitos de poupança, acho que o importante é sobretudo poupar, independentemente do valor. Há pessoas que não vão conseguir poupar 10% numa fase inicial, mas se conseguirem poupar 2%, 1% ou o que seja, o importante é desenvolver este hábito. São etapas e são fases e não estamos todos no mesmo patamar. As finanças são exatamente isso, pessoais e cada pessoa deve olhar para o seu orçamento, procurar descobrir ineficiências financeiras e ir gradualmente, se não o faz, aumentando a sua capacidade financeira. É preferível ter um método e um hábito do que esporadicamente pôr num mês 5% de parte e depois no outro mês não poupar nada. E ter esta cadência de poupança, desenvolver este hábito vai também permitir-nos ter uma maior previsibilidade de organização e de gestão do nosso orçamento familiar.


Que métodos pode seguir? O que vemos, muitas vezes, é as pessoas porem esse dinheiro de parte e depois rapidamente irem buscar esse valor…
Mas mais vale a pessoa ir ao pé de meia buscar dinheiro do que fazer um crédito ou gastar o cartão de crédito, isso é sempre melhor. Um hábito que é extremamente importante e que acaba por ser diferenciador é o que se chama pagar-nos a nós próprios em primeiro lugar, ou seja, não esperar pelo final do mês para ver o que sobra para poupar. Somos muito criativos e parece que o dinheiro também é muito criativo em encontrar coisas que aparecem e nas quais temos de gastar o nosso dinheiro. O que temos de fazer é definirmo-nos à cabeça e se pensarmos bem é o que o próprio Estado faz na prática, ou seja, um trabalhador por conta de outrem quando o salário cai na sua conta já o Estado retirou os seus impostos, neste caso, o que devemos fazer é assim que recebemos o salário, retirarmos logo uma parte para uma outra conta. É importante haver uma transferência automática para uma outra conta para não se misturar este dinheiro e retirar logo uma percentagem ou um valor automaticamente todos os meses. Seja 20, 30, 50, 100 euros, o que for e depois distribuir o restante pelas várias despesas. Mesmo que não utilize uma ferramenta de orçamento, em que faça uma alocação de quanto é que tem de gastar em cada rubrica, pelo menos, já garantiu a poupança. É importante que, com essa automatização, pagar-se em primeiro lugar. Segundo, automatizar este processo, que é para não pensarmos muito. Se a gente pensa, a coisa não corre bem. Em terceiro lugar, ter como objetivo o primeiro patamar de poupança que é a criação de um fundo de emergência para ter até uma folga entre seis a 12 meses do seu custo de vida mensal. E se para algumas pessoas é muito dinheiro então vamos ter como primeiro objetivo um mês porque isso vai permitir que perante um imprevisto possa ir lá buscar o dinheiro. Depois tem de o repor. Mas não nos podemos esquecer de uma coisa, além da poupança ser consumo futuro, isto é, guardo hoje para consumir mais à frente, a única forma que temos para aumentar a nossa capacidade de poupança, porque estamos a falar de uma balança entre receitas e despesas, é fazer uma das três coisas: ou reduzo as despesas, ou aumento as minhas receitas ou faço as duas coisas. O que faz a maioria das pessoas? Mexe nas despesas porque é mais rápido e poucas pessoas vão procurar formas de conseguir aumentar o rendimento. Se conseguir fazer as duas coisas já estou a aumentar a minha capacidade de poupança, porque se não procurar ter uma maior eficiência financeira nas despesas e depois procurar aumentar o rendimento não há forma de aumentar a poupança. Há casos em que o orçamento já é muito enxuto e já não há mais nada para se cortar. A partir daí, só tenho uma hipótese é aumentar o meu rendimento e isso poderá implicar mudar de trabalho, fazer um part-time ou dedicar-me a algum outro talento que tenha. No entanto, sinto que é uma mentalidade que não existe muito em Portugal. Se formos olhar, por exemplo, para os Estados Unidos, os miúdos são estimulados desde pequenos a ter uma bancada da limonadas, se formos para o Brasil vemos pessoas a fazerem bolos para fora, etc. É preciso fazer qualquer coisa, desde as coisas mais simples a outras mais sofisticadas. Se tenho um talento dou umas explicações, faço alguma coisa extra que me permita aumentar a minha capacidade de poupança e se sentir que pelo meu salário e pelas minhas despesas já não consigo então poderei ter de fazer uma mudança de carreira. Haver um período em que possa investir no meu conhecimento para conseguir mudar o patamar. Não há milagres e o que sinto muitas vezes é que se está à espera de milagres. A pessoa tem que assumir as rédeas da sua vida. Se tem um determinado salário e não consegue cortar mais, também não adianta vir para a internet andar a dizer coisas sobre isto, sobre aquilo. A pessoa tem de fazer alguma coisa e para mim é fundamental que a pessoa ponha-se em primeiro lugar. Se não consegue fazê-lo sozinho deve procurar ajuda, deve procurar aumentar a sua literacia financeira porque acredito piamente que a transformação acontece quando as pessoas investem na sua literacia financeira. Vejo isso a acontecer com quem nos procura, até porque temos uma metodologia que trabalha várias vertentes e muitas pessoas depois de fazerem as nossas formações, curiosamente, mudam de área de emprego, lançam-se em negócios e conseguem perceber que elas próprias estavam limitadas porque a escola não lhes ensina a literacia financeira.


Continua a ser um calcanhar de Aquiles…
Completamente, a escola não nos ensina nada sobre empreendedorismo. Estamos todos ensinados desde o início para trabalhar da mesma forma que fazíamos há 40, 50, 60, 100 anos e não faz sentido nenhum. É necessário haver esta mudança, mas enquanto não muda – porque acredito que obviamente seja mais difícil mudar um programa de educação do que procurarmos perante as circunstâncias que temos o que é o melhor que eu consigo fazer – tenho de ir procurar pessoas e entidades, fontes credíveis que me vão ajudar a atingir esse caminho.


Em relação aos investimentos ainda há dificuldade em escolher os produtos que mais se adequam ao perfil de cada investidor?
Atrevo-me a dizer que, ao final destes anos todos, as pessoas continuam a ter mais dificuldade em aferir risco. Há uma grande dificuldade em aferir risco, em ter a noção de risco e é muito curioso quando vamos analisar dados – e gostamos muito de trabalhar com dados e não é com achismos que vamos tentar identificar padrões de comportamentos – o que verificarmos é que quando perguntamos a alguém se tem algum investimento em bolsa ou se investe em ações, a pessoa diz não porque é muito arriscado. Mas também há um perfil de pessoas com determinada faixa etária que nunca investiram em ações em bolsa porque consideram que é extremamente arriscado, mas depois o primeiro investimento que fazem é em criptomoedas. Uma pessoa não consegue investir para ser sócio de uma empresa que tem um produto ou um serviço que é amplamente conhecido, depois põe o dinheiro em criptoedas porque um amigo está a ganhar dinheiro ou vê na internet. Isto revela: um, iliteracia, dois, ganância, três uma incapacidade total resultante da primeira de aferir risco. Vejo muitas pessoas a entrarem em alguns investimentos, sem saberem o risco que estão a correr e entram porque tem uma baixa barreira de entrada em termos de valor investido. E depois falo com pessoas que dizem que por um fundo de investimento ou por um PPR estar a cair 5% vão levantar o dinheiro todo, mas se isso acontece é porque aquela pessoa tem um instrumento que está desadequado porque não tolera uma perda. Se não tolera uma perda, aliás uma perda potencial porque a perda só é efetiva quando há lugar a venda e perante a possibilidade de perder 5% quer vender, então claramente o instrumento está desajustado. O problema é que as pessoas continuam à procura de unicórnios. O que quero dizer com isto? Querem elevados lucros e baixíssimo risco, ou seja, querem quase capital garantido com retornos de dois dígitos. E isto não existe. Em Portugal isto não existe. E quando começamos a ver que a pessoa quer não quer correr riscos, mas quer elevados retornos e não investe na sua literacia financeira então esta pessoa é permeável a burlas, porque basta ouvir ‘isto é completamente seguro e tem bons retornos’ que vai buscar o lado da ganância e como não tem literacia, confia e fica à mercê. Uma pessoa com literacia financeira dificilmente cai numa esparrela de lhe venderem depósitos com 10% ou 12% porque sabe que os juros estão definidos pelo mercado. E é por isso que, para mim, o fundamental é que as pessoas invistam na sua literacia financeira, não para serem gurus financeiros, não para serem analistas, mas para conseguirem tomar melhores decisões relativamente à sua vida financeira e para quando forem confrontadas, quer com a proposta do banco, de uma seguradora, de uma corretora ou quando vier algum amigo com alguma proposta, a pessoa tenha a capacidade de aferir risco e saber dizer: ‘Ok, isto é para mim ou isto não faz sentido ou isto é fraude’.


O investimento em bolsa continua a ser visto como um bicho de sete cabeças?
Continua a ser e a prova é se formos comparar com certos mercados vemos que é perfeitamente normal as pessoas pouparem a sua reforma em instrumentos que têm uma alocação e uma exposição à bolsa de valores. Em Portugal só uma ínfima parte das pessoas é que investe e nessa ínfima parte, as que alocam capital em bolsa. Os portugueses quando pensam em poupar, em investir, pensam nos depósitos a prazo, põem o dinheiro nos Certificados de Aforro, em PPR [Plano Poupança Reforma] e alguns fundos que o gestor de banco falou e pouco mais.


A escolha continua então a recair nos depósitos tradicionais e nos Certificados de Aforro, mesmo que o retorno seja pequeno mas porque sabem que o capital está garantido….
Os resultados de vários estudos que têm sido levados a cabo pela CMVM [Comissão do Mercado de Valores Mobiliários] e por outras entidades colocam o perfil do investidor português como conservador. Se as pessoas tivessem literacia financeira iríamos ter uma calibragem um bocadinho melhor, não teríamos tanta gente com perfil conservador e se calhar haveria alguns mais moderados, mas sendo conservadores vão olhar para os produtos de capital garantido. Há uma aversão à perda muito grande. Isso pode ser justificado de várias formas. Temos de ir antes do 25 de Abril e não só. Temos de ver os períodos de bolsa de quem apanhou os anos 2000 e também temos tido vários escândalos financeiros que aconteceram em Portugal. Não havendo essa cultura de investimento em mercado de capitais, não tendo uma bolsa tão líquida e termos tido tantos escândalos financeiros leva a que as pessoas tenham obviamente uma relutância em alocar ali o seu capital. E daí que procurem, em vez de ganhar, garantir que pelo menos não perdem. É a mentalidade, sobretudo, desta época.


A história da falência de bancos ainda está na memória dos portugueses, como o BES…
É uma ideia que está completamente presente. Já para não falar no caso de pessoas com as quais falamos que perderam efetivamente o dinheiro, foram lesados. E mesmo aquelas pessoas que não tenham sido lesadas, o caso foi muito mediatizado e continua a estar na memória, sobretudo em algumas faixas etárias. Os mais novos não têm essa memória, mas todas as outras gerações têm essa memória e isso leva a que haja desconfiança de investir em instrumentos que não garantam o capital.


No caso dos Certificados de Aforro estamos constantemente a assistir a mudanças em relação à remuneração. Mas continua a ser visto como um produto de eleição…
É um produto de eleição, porque tem a garantia do Estado, tem capital garantido, tem o risco Estado, isto é, tem o risco de falência do Estado. É um instrumento que as pessoas conhecem e que tem muitos anos. Mesmo certos investidores, agora em idade adulta, tiveram pais ou avós que tinham certificados, em tempos em que efetivamente os certificados tinham boas rentabilidades. É um produto que as pessoas entendem, têm capital garantido e fácil de investir e de reinvestir. O que tem acontecido são duas coisas distintas. Uma tem sido a alteração das séries, não nos podemos esquecer que do outro lado está um Estado que se está a financiar e esta é uma dicotomia que a gente não se pode esquecer. Por um lado, nós, investidores, emprestamos dinheiro ao Estado e queremos obter o maior retorno possível, mas do outro lado está o Estado que se quer financiar o mais barato possível. Então como é que encontramos aqui o ponto de equilíbrio do Estado não estar a pagar caro, mas nós, investidores, querermos um bom retorno? E o que tem acontecido é que por ajuste também das taxas de juro tem havido uma revisão, sob pena do valor que o Estado está a pagar estar desadequado ao risco do momento do mercado.


O Governo deveria avançar com medidas para estimular ou incentivar o nível de poupança?
Acho que tem essa obrigação. Não faz sentido haver uma tributação nos Certificados de Aforro ou, pelo menos, deveria aplicar o que já existe em muitos países, em que até um determinado montante não há lugar a tributação. Desta maneira, não há qualquer estímulo. Houve agora algumas mexidas em termos de fiscalidade em alguns produtos, mas temos um país em que se vamos mexer nisto vira tudo um problema político, porque acham que estamos a ajudar os capitalistas a irem especular na bolsa. E enquanto não se mudar esta mentalidade, e não se tiver uma conversa séria do que é isto do estímulo à poupança, e ser depois a própria pessoa a decidir como e onde é que vai colocar o seu capital, não avançamos. Não pode haver este paternalismo do Estado em que é o Estado que tem de decidir. Uma medida que seria extremamente simples de avançar era isentar, por exemplo, os Certificados de Aforro e até poderia ser até um determinado montante, até um determinado teto, agora não há interesse. Claramente que não há interesse nisso.


A reforma é outro problema. Há sempre o risco de assistirmos ao colapso da Segurança Social e não haver dinheiro para as reformas ou os valores que estamos à espera não serem exatamente aqueles que as simulações nos têm dado ao longo do percurso profissional. Devia haver uma maior sensibilização para poupar essa tal almofada financeira?
A reforma e as pensões são uma bomba relógio em Portugal. Ninguém fala. Ninguém quer falar. Temos estudos europeus que mostram que pessoas que se vão reformar depois de 2050 possam ter menos de 40% do seu último salário. Costumo usar o exemplo de mil euros – espero que ninguém chegue a 2050 a ganhar isto, como é óbvio – mas só para as pessoas entenderem as contas. Vamos imaginar que a pessoa ganha mil euros, atinge a idade da reforma e tem a sua vida toda adaptada para aqueles 1000 euros e no dia seguinte recebe 35%, ou seja, recebe 350 euros. A minha questão é onde estão os restantes 650 euros? Onde é que vai buscar? Isto é um problema sério que politicamente ninguém tem interesse em tocar. Andamos como as avestruzes com a cabeça lá de baixo. E as pessoas como não têm literacia e como pensam que a reforma é algo muito lá longe não estão a pensar nisso. Ninguém as alerta e as pessoas ou começam já a poupar e a planear a sua reforma ou vão ter um grande problema no futuro, um problema enorme porque vão ser pobres nos anos dourados da sua vida. Não nos podemos esquecer que a Segurança social é como um esquema de pirâmide. Porquê? Porque tem que entrar cada vez mais contribuições para o sistema se manter sustentável e nós temos um problema de pirâmide demográfica invertida, não é preciso ser bom em matemática sequer para perceber isso. Ou seja, temos cada vez mais pessoas a entrarem na idade da reforma, nós vivemos cada vez mais anos e o sistema quando foi desenhado foi desenhado com base num tipo de esperança média de vida. Nós hoje em dia, ainda bem, vivemos mais anos, portanto há mais anos de reformas a pagar e nascem cada vez menos crianças. Se não conseguirmos equilibrar com o saldo migratório, o problema torna-se ainda mais gigante porque temos cada vez menos crianças. E são essas crianças, esses jovens – e depois os jovens, ainda por cima vão para fora – que vão pagar futuramente as reformas, porque estamos perante um sistema de distribuição de solidariedade social. Quem está agora no ativo paga as pensões e precisamos de ter, no mínimo, o sistema equiparado. Temos de ter tantas contribuições como aquelas que saem e neste momento a balança está desequilibrada. O meu conselho é que comecem a preparar a sua própria reforma, que não fiquem à espera do Estado.


O PPR, por exemplo, pode ser uma resposta?
É uma das, mas há mais. Efetivamente, o PRR é o instrumento financeiro até ao dia de hoje com a fiscalidade mais interessante. Muitas pessoas entram nos PPR pela tributação do IRS, depois temos ainda a tributação que é mais vantajosa em termos de mais-valias à saída. É uma das possibilidades, mas o importante, independentemente dos instrumentos, da alocação, dos ativos que escolham é importante escolher sobretudo e montar uma carteira que supere o valor da inflação, sob pena de não ter ganhos reais. Para superarmos o valor de inflação temos de assumir um pouco mais de risco. Não há outra forma, não há outra volta.


Em relação à necessidade de que é preciso poupar, esse sentimento é mais comum junto dos mais velhos ou os mais novos também já estão mais despertos para a poupança?
Sinto que cada vez mais os jovens estão interessados na bolsa, no mercado de capitais, e muito começou na pandemia. Os jovens vêm com o estímulo de ficarem ricos rapidamente. Alguns olham para a bolsa numa ótica do compro hoje, vendo amanhã com vista a uma realização rápida de ganhos, ainda não com uma mentalidade de longo prazo, mas já com maior alerta relativamente a investimentos. Ou seja, nota-se uma cabeça mais desperta. As universidades falam um bocadinho mais, as escolas também, mas o falar não chega. Ainda há um longo trabalho a fazer, mas nas gerações mais velhas, o foco é na poupança. Nas gerações mais novas o foco é no ganho. Também temos de compreender uma coisa, não há que diabolizar os jovens, o ser humano está programado para curto prazo, ninguém quer pensar a 20 ou 30 anos. Às vezes é difícil pensar a 20 dias, quanto mais a 20 ou 30 anos. Há uma visão sempre muito de curto prazo e isso é um viés comportamental que temos e, por isso, temos de arranjar formas de a combater. Há muitos apelos de consumo. Muitas pessoas falam connosco e dizem que querem poupar, mas também querem ir de férias. As pessoas olham para isto quase como um dilema. Mas independentemente da idade que se tenha não se deve atirar a toalha ao chão e deve-se começar a poupar. Não conseguimos começar antes, então começamos agora. Não vamos ter os mesmos montantes, os mesmos resultados, mas se ficarmos parados vai ser pior, porque não nos podemos esquecer deste efeito corrosivo que a inflação tem nas poupanças e que delapidam o património silenciosamente.


Lançou há uns anos o desafio das 52 semanas…
Mas isto é uma gamificação positiva, porque normalmente a poupança está quase sempre associada a sacrifício porque se mexe no lado das despesas. Como se corta, então para a maioria das pessoas a poupança é sacrifício. E quando começamos a gamificar, começamos a estimular outro lado nosso e as pessoas percebem que até pode ser divertido. E continuamos a ter imensos relatos de pessoas que com esse dinheiro vão de férias, mudam o sofá da sala, mudam o frigorífico e passaram a desenvolver um hábito de poupança a partir daí. Por isso é que defendo que para quem não tem, o fundamental é desenvolver o hábito, porque depois a pessoa vai ajustar ao seu orçamento. Mas enquanto não tem o chip, e isto é um bocadinho mal comparado com as dietas, não muda a cabeça, o resultado não sai diferente. E desenvolver este hábito de poupança é fundamental.