A economia portuguesa deverá crescer ligeiramente abaixo das estimativas do Governo. Bruxelas aponta para um crescimento de 1,7% este ano e 1,9% em 2025, enquanto o Governo de Luís Montenegro acena com 1,8 e 2,1%, respetivamente. Um comportamento que divide os economistas ouvidos pelo Nascer do SOL. «Estar abaixo não é positivo», diz João César das Neves, que no entanto admite que «as diferenças das estimativas são mínimas, caindo dentro do intervalo de erro, pelo que se deve dizer que existe acordo na previsão». Já Paulo Monteiro Rosa, do Banco Carregosa, considera que as projeções são positivas, sobretudo quando comparadas com a média da Zona Euro, que registará um crescimento de apenas 0,8% em 2024 e 1,3% em 2025.
Metas de crescimento que levam os economistas a dar cartão vermelho ao comportamento da economia portuguesa. «Trata-se de um crescimento medíocre, na linha do que tem acontecido nas últimas duas décadas. A economia portuguesa não está a cair, está a crescer, mas pouco, parecendo empatada, presa numa dinâmica medíocre», considera César das Neves. O facto de crescermos ligeiramente acima da média europeia «é fraco consolo». Ainda assim, não hesita: «Claro que devíamos fazê-lo todos os anos, para nos aproximarmos dos níveis dos parceiros mais ricos. Infelizmente fazemo-lo raramente e por pouco».
Também Paulo Monteiro Rosa reconhece que essas metas podem parecer pouco ambiciosas, mas lembra que «é importante lembrar que Portugal ainda se posiciona à frente de muitos países em termos de crescimento económico» e acrescenta que «as projeções indicam que o país deve continuar a crescer acima da média da Zona Euro até 2026, reforçando, assim, a tendência positiva no cenário europeu».
Incertezas na base do crescimento
É certo que, de acordo com a Comissão Europeia, este crescimento assenta no consumo privado e na aceleração da implementação do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que deverá impulsionar os investimentos. E prevê que as recentes baixas nas taxas de juro deverão «apoiar o consumo privado e os investimentos». Também de acordo com o Banco de Portugal, o consumo privado deverá crescer 2,5% em 2024, 2,3% em 2025 e 1,9% em 2026, impulsionado pelas expectativas de aumento do poder de compra das famílias. Já o turismo «deverá permanecer um importante fator de crescimento, embora menos do que nos últimos anos. No entanto, considerando a recuperação esperada nos bens de investimento, as importações deverão aumentar mais rápido do que as exportações». Consequentemente, o «superávit em conta corrente deverá diminuir em 2025-2026 após um pico em 2024».
No entanto, para Paulo Rosa, essas estimativas estão rodeadas de incertezas. «O sucesso do PRR dependerá de uma implementação eficiente, já que atrasos ou obstáculos podem comprometer o impacto esperado nos investimentos. Adicionalmente, fatores externos, como alterações no cenário económico global e eventuais choques económicos, podem reduzir o dinamismo do consumo privado português e enfraquecer os níveis de investimento previstos».
Já para César das Neves, «um crescimento tão fraco nunca poderá ser ‘demasiado otimista’», referindo que «considerando os enormes montantes de fundos europeus que estão a entrar em Portugal, o crescimento obtido é muito fraco. A última vez que tivemos entradas destas tivemos crescimentos de mais do dobro».
Alemanha treme
Os mesmos dados também apontam para uma recessão na Alemanha face aos graves problemas estruturais que a economia enfrenta, o que no entender, de César das Neves vai «exigir fortes reformas, as quais são difíceis de realizar com a atual indefinição política, o que significa que a zona euro não pode contar com a sua maior economia como motor de crescimento». E acrescenta: «Não é provável que a pequena recessão alemã contagie os vizinhos, mas vai certamente reduzir o crescimento do bloco».
Também Paulo Rosa recorda que há pelo menos três principais fatores que debilitam a economia alemã: a dependência energética, dado que historicamente a Alemanha é dependente do gás russo barato, tendo enfrentado aumentos significativos nos custos energéticos devido à guerra na Ucrânia e às sanções subsequentes. A desaceleração das exportações devido à redução da procura global por bens industriais afetou negativamente as exportações alemãs, especialmente para mercados-chave como a China, além dos bens industriais alemães terem sofrido com os custos mais elevados da energia. E por fim, há também desafios estruturais, ou seja, a falta de investimento em digitalização na Alemanha é uma realidade, corroborada por uma infraestrutura envelhecida e uma burocracia pesada têm limitado a capacidade de adaptação da economia alemã às novas realidades económicas.
«A recessão na Alemanha deve-se a uma combinação de fatores energéticos, comerciais e estruturais, e pode ter repercussões significativas na economia europeia, especialmente em países com fortes relações económicas com a Alemanha, como é o caso de Portugal», salienta ao nosso jornal.
Mas vamos a outros números. No que diz respeito à inflação, Bruxelas corrige em alta esta previsão. Quer isto dizer que a taxa de inflação em Portugal deverá chegar aos 2,6% este ano e baixar para 2,1% no próximo. A instituição liderada por Ursula von der Leyen espera que «a inflação continue a diminuir durante o horizonte de previsão, em linha com as projeções para a área do euro».
Também esta semana, o Instituto Nacional de Estatística (INE) indicou que o PIB em volume registou uma variação homóloga de 0,9% no 3.º trimestre de 2024 (0,6% no 2.º trimestre) e uma variação em cadeia de 0,4% (0,2% no 2.º trimestre) na Área Euro. Já em Portugal, o PIB em volume registou uma variação homóloga de 1,9% no 3.º trimestre de 2024 (1,6% no trimestre anterior). Comparando com o 2.º trimestre de 2024, o PIB aumentou 0,2% em volume, taxa idêntica à verificada no trimestre. anterior.
Paulo Monteiro Rosa lembra que, tendo em conta os recentes desenvolvimentos na Europa, particularmente na maior economia do velho continente, esses números são, no geral, positivos. «A aceleração no crescimento homólogo para 1,9% destaca uma recuperação mais robusta em relação ao mesmo período do ano anterior, reforçando uma tendência de estabilidade e resiliência económica num cenário europeu marcado por incertezas, incluindo a recessão na Alemanha. Ainda assim, o crescimento trimestral de apenas 0,2% reflete os desafios que a economia portuguesa enfrenta para alcançar um maior dinamismo no curto prazo, indicando que há espaço para medidas que impulsionem a atividade económica de forma mais significativa», conclui.