Ainda que tenha entrado em vigor a 1 de janeiro de 2006, a lei de limitação de mandatos só começou a ter efeitos práticos nas eleições de 2013. Até então, muitos autarcas estiveram no poder durante anos a fio sem necessidade de sair. No fundo, bastava serem eleitos.
Depois, em 2013, muitos saíram. E nem todos concordaram mas a lei assim obrigou. Uns afastaram-se mais da política, outros regressaram anos mais tarde.
Entre os autarcas que estiveram mais tempo aos comandos dos respetivos municípios destaca-se Fernando Ruas, do PSD. Assumiu a liderança da Câmara Municipal de Viseu pela primeira vez em 1989 e só saiu em 2013. Durante 24 anos, Fernando Ruas foi sempre candidato pelo PSD à autarquia viseense e foi sempre eleito. E gostaria de ter continuado. “Quem está 24 anos numa câmara, quem foi dois anos Presidente da Associação de Municípios, só pode ser um homem de poder local”, disse em entrevista ao Público em 2021.
Quando em 2013 se viu impedido de se recandidatar à liderança da Câmara que geria há quase um quarto de século, Fernando Ruas mostrou-se contra a limitação de mandatos.
Não se poder recandidatar para um novo mandato, disse_Fernando Ruas ao semanário Sol, era como levar “um cartão vermelho” que lhe dava “quatro jogos de suspensão”.
Por essa altura, há onze anos, chegou a dizer: “No final, tenho que analisar se os adeptos e o treinador me querem”. E os ‘adeptos’ quiseram. Não quatro anos depois. António Almeida Henriques, também ele do PSD, seguiu-se a Fernando Ruas e manteve-se no lugar oito anos. Seria, dizia-se, o candidato natural ao terceiro mandato mas não resistiu a complicações derivadas da covid-19. Fernando Ruas volta então à autarquia viseense em 2021 e deixa agora para o próximo ano o anúncio de uma possível recandidatura.
Cinco vitórias nas urnas
Outro caso muito conhecido dos portugueses é o de Valentim Loureiro, que em 1993 assumiu os comandos da Câmara Municipal de Gondomar. Durante 20 anos, o major e dirigente desportivo do Boavista liderou o município do Norte do país e só não o fez em 2013 devido à lei de limitação de mandatos. Feitas as contas, neste período, ganhou cinco atos eleitorais: nas três primeiras eleições, foi o candidato do PSD e, nas duas autárquicas seguintes, apresentou-se como independente. Apesar das acusações de corrupção e dos vários casos judiciais em que esteve envolvido, o autarca conseguiu sempre a confiança dos munícipes.
Obrigatoriamente, Valentim Loureiro teve que estar quatro anos afastado da liderança do município mas voltou a apresentar a sua candidatura em 2017. Mas aqui já não teve a mesma sorte: apresentou-se novamente como independente, com a lista “Valentim Loureiro Coração de Ouro”, que ficou em terceiro lugar com 19,9% dos votos.
Nove mandatos
Seguimos para Oeiras com Isaltino Morais. A primeira vez que assumiu a autarquia foi em 1985, tendo conseguido conquistar a primeira vitória do PSD num concelho governado pelo PS desde as primeiras eleições autárquicas realizadas após o 25 de abril de 1974. E depois por lá continuou. Renovou o mandato por quatro vezes consecutivas, em listas do PSD, alcançando vitórias nas autárquicas de 1989, 1993, 1997 e 2001.
Após uma breve passagem pelo Governo (como ministro das Cidades, Ordenamento do teritório e Ambiente), em 2005 Isaltino Morais, suspende a militância no PSD e apresenta candidatura independente à Câmara Municipal de Oeiras. E vence, tornando-se novamente seu presidente. Em 2009 repete a vitória, enquanto candidato independente. Mas nesse mesmo ano de 2009 é condenado a sete anos de prisão e em 2013 é detido por fraude fiscal e branqueamento de capitais, estando preso por um ano. Sai em 2014 e acaba por voltar à Câmara em 2017. Quatro anos depois é reeleito com 50,85% dos votos, para cumprir o seu nono mandato.
Benavente, Amarante, Meda
Em Benavente, um nome que ninguém esquece é o de António José Ganhão que esteve aos comandos da autarquia desde 1979 até 2013. Esteve envolvido em casos de corrupção – dos quais foi absolvido – e não voltou à liderança da autarquia.
Outro nome muito conhecido é Avelino Ferreira Torres que, apesar de ter saído antes de 2013, é considerado um dinossauro político, tendo em conta que esteve na liderança da Câmara Municipal de Marco de Canaveses pelo CDS-PP desde 1982 até 2005, altura em que abandonou a autarquia para se candidatar à Câmara Municipal de Amarante. Mas perdeu para o PS.
Um caso de regresso é o do presidente da Câmara da Meda. Depois de ter presidido a autarquia de 1985 a 2009, o histórico social democrata João Mourato regressou à câmara que tão bem conhece em 2021.
Outros nomes Mas, fazendo uma ronda pelo país inteiro, há muitos autarcas que, antes de chegarmos a 2013, dedicaram décadas das suas vidas à mesma autarquia. Falamos, por exemplo, de Maria Emília Sousa (de 1987 a 2013), em Almada; Joaquim de Sousa Gomes (de 1989 a 2013), em Almeirim; Francisco Machado (1976 a 2013), em Braga; Fernando José da Costa (de 1985 a 2013), nas Caldas da Rainha; Atílio dos Santos Nunes (de 1989 a 2013), em Carregal do Sal; Sérgio Morais Carrinho (de 1979 a 2013), na Chamusca; António Magalhães Silva (de 1989 a 2013) em Guimarães; José Ministro dos Santos (de 1985 a 2013), em Mafra; Rui Solheiro (de 1982 a 2013), em Melgaço; Alfredo Oliveira Henriques (de 1985 a 2013), em Santa Maria da Feira; António Lopes Bogalho (de 1979 a 2013) em Sobral de Monte Agraço, ou até Jaime Marta Soares que de 1976 a 2013 foi presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Poiares.
Agora, uma coisa é certa: a lei da limitação de mandatos levou em 2013 à extinção os ‘dinossauros’ políticos, que passaram a ter de tentar a sua sorte novamente quatro anos depois.