O ‘caos’ está lançado no que diz respeito ao transporte de mão permitido pelas companhias áreas, levando as transportadoras a cobrarem o que entenderem. A garantia é dada ao Nascer do SOL por especialistas da área que pedem que haja uma harmonização nas bagagens de cabine que podem ser usadas pelos passageiros, pondo fim ao «negócio» que está a ser levado a cabo pelas empresas.
Neste momento, há dois dossiês a serem discutidos nas instituições europeias que abordam a questão da bagagem de mão, mas nenhuma das posições que foram tornadas públicas foi ainda aprovada, o que exigirá sempre acordo entre o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia. No início de junho o Conselho adotou a sua posição sobre a revisão do Regulamento dos Direitos dos Passageiros no transporte aéreo que «parece legitimar a cobrança da bagagem de mão de tamanho tradicional (normalmente um trolley), e considerar apenas obrigatório o transporte sem custos adicionais de um objeto pessoal com dimensões reduzidas (40x30x15), a que corresponderá normalmente uma pequena mochila», alerta Paulo Fonseca, assessor estratégico e de relações internacionais da Deco.
Já o Parlamento Europeu, no âmbito de uma outra iniciativa quer também alterar um conjunto de Regulamentos sobre direitos dos passageiros em diferentes modos de transporte, «assumindo uma posição, bastante mais equilibrada, e que acompanhamos, defendendo que os passageiros devem poder transportar uma bagagem de mão gratuita (mala/trolley) além de um objeto pessoal, promovendo também a harmonização de dimensões de bagagem», recorda o responsável.
Uma situação que ganha maiores contornos, depois de a Airlines for Europe – que representa 70% do tráfego aéreo europeu e conta com companhias com a Lufthansa, Ryanair, EasyJet, entre outras – ter anunciado que as suas companhias vão implementar as medidas de um objeto pessoal, em linha com a posição definida pelo Conselho da UE, «posição essa que não foi ainda aprovada, parecendo esquecer que a mesma precisa de apoio do Parlamento Europeu para o efeito, instituição que tem uma posição a este respeito claramente divergente».
Para Paulo Fonseca, mais do esperar por uma decisão dos organismos internacionais seria desejável ter uma solução por parte da Autoridade Nacional da Aviação Civil que já recebeu queixas por parte da Deco em relação a estas incongruências em temos de pagamentos. «É preciso que haja uma decisão definitiva das autoridades nacionais de aviação civil e que, sobretudo em Portugal, proíba as transportadoras de cobrar efetivamente valores pelo transporte, em relação aquilo que são os bens essenciais. E isso estamos a falar que na bagagem de cabine adequado e um item pessoal também. Enquanto as autoridades não funcionarem devidamente, como aconteceu em Espanha, não vamos ter uma solução à vista», salienta.
Já Miguel Quintas, presidente da Associação Nacional de Agências de Viagens (ANAV), acusa as propostas do Conselho Europeu de serem «um retrocesso muito grande naquilo que são os direitos dos passageiros, particularmente no que toca à questão das bagagens», acusando também a redução das indemnizações a pagar aos clientes finais. «Estamos a assistir àquilo que me parece que é claramente um lobby das companhias aéreas, sendo que, honra seja feita, no caso Portugal, e também Espanha, votaram contra», diz ao Nascer do SOL.
E alerta para as consequências. No que diz respeito às indemnizações, Miguel Quintas diz que os clientes finais, agora, terão «mais dificuldade em ser ressarcidos face ao mau serviço das companhias aéreas, cujo setor está cada vez mais concentrado e ao ser naturalmente mais concentrado tem um poder de lobista muito maior».
No que diz respeito às bagagens, o responsável não concorda com o facto de o Conselho Europeu recomendar apenas uma única bagagem, com as dimensões de 40, 15 x 30, «que no fundo é aquilo que conhecemos por mochila». «Portanto, temos o Conselho Europeu de um lado a dizer, ‘só queremos mochilas até com dimensões de 40, 30 x 15’, e retirando as bagagens de lugares que chamamos trolleys, e temos, por outro lado, o Parlamento Europeu a dizer, ‘não, não, meus senhores, não só têm que ter uma bagagem para as tais mochilas, mas como também uma outra bagagem adicional, os tais trolleys, com pelo menos um metro de perímetro, entre altura, largura e comprimento».
Assim, defende que a ideia do Parlamento beneficia o consumidor mas, do outro lado, o que acontece é «uma menor transparência do preço, porque, no fundo, o que pretende é cobrar mais uma mala, e nós não sabemos quanto é que se cobra pela mala, e as dimensões das malas não estão definidas, e cada companhia aérea decide o que é que quer da sua mala».
O responsável não tem dúvidas que, a ser aprovado, as viagens podem diminuir. «O passo seguinte de haver a possibilidade de cobrar malas adicionais é, naturalmente, o aumento da tarifa média dos bilhetes. Ora, sabemos que as companhias aéreas, particularmente agora pós-covid, têm tido lucros recordes. Se olharmos, há companhias aéreas, que só com estes chamados ancillary services [serviços adicionais além da passagem], têm como fontes de receita 40% das suas receitas».