O candidato presidencial Gouveia e Melo foi o primeiro a criticar a presença de Luís Montenegro na Festa do Pontal, estando ausente na fase crítica dos incêndios, ao afirmar que «um verdadeiro líder, mesmo sem poder fazer nada, está na frente com o seu povo». Mas também deu cartão vermelho aos restantes responsáveis políticos por porem a «cabeça na areia», «alheios ao terror vivido pelas populações», enquanto «o interior chora e luta contra as chamas».
Críticas que conduziram a uma reação imediata não apenas do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa e do primeiro-ministro (marcaram logo visitas ao centro de comando da Proteção Civil) mas também, por exemplo, do potencial candidato presidencial e líder da Oposição, André Ventura. O líder do Chega publicou logo um vídeo nas redes sociais a tentar apagar chamas junto a uma árvore em Castelo Branco, acompanhado pela frase «um líder tem de estar ao lado do seu povo. A terra está a arder». E também a pedir, juntamente com o PCP, a realização de um debate extraordinário na comissão permanente, que acabou por ser aprovado por unanimidade.
Aliás, o presidente da Assembleia da República considerou normal que este debate ocorresse no Parlamento, por entender que «é por excelência onde estas matéria podem ser tratadas de forma serena, democrática» e onde o Governo é escrutinado pelos «representantes do povo português».
Também o candidato presidencial apoiado pelo PSD veio a terreiro fazer um apelo que soou a apoio à estratégia do Governo. Para Marques Mendes, mais do que o debate político, o importante é a união de todos nos momentos mais críticos como o do combate aos incêndios florestais. Uma posição que, para a maioria dos comentadores televisivos, foi de demasiada ‘colagem’ ao Governo de Montenegro.
Já António José Seguro optou por uma posição mais institucional de defender um debate sobre as políticas de reflorestação e avançou com a proposta de reforço das penas (com recurso a pulseira eletrónica) para os condenados por fogo posto.
As explicações de Montenegro
Quem aproveitou o debate parlamentar de urgência pedido pelo Chega e pelo PCP para se reposicionar foi o primeiro-ministro, Luís Montenegro. Depois de ouvir o presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco – que deu as condolências às vítimas dos incêndios e respetivas famílias -, o PM tomou a palavra para assegurar que tanto ele como a sua ministra da Administração Interna estiveram sempre «ao leme».
Sobre a prevenção dos incêndios, Montenegro falou do reforço do programa de sapadores florestais; do aumento adicional para as brigadas nas comunidades intermunicipais; de mais 50 operações integradas de gestão da paisagem; do alargamento do prazo da limpeza de terrenos; reforço das faixas de gestão de combustível; controlo do fogo e autorização de queimadas em 3562 hectares, e intervenção na rede florestal. «São alguns dos exemplos de intervenções ao nível preventivo», apontou, garantindo que a ideia de que não houve prevenção é «falsa». Relativamente ao dispositivo de combate, o primeiro-ministro assegurou que foi o maior de sempre: com mais 238 veículos de combate e mais operacionais. «Mas a força do inimigo foi enorme», lamentou, referindo-se à «severidade meteorológica». «Apesar das taxas de intervenção inicial ser superior a 93%, não conseguimos evitar grandes incêndios», admitiu, prometendo trabalhar «para que a gravidade da situação não volte nos próximos meses de setembro e outubro».
Falando sobre o apoio às populações, Luís Montenegro lembrou medidas como a lei-quadro que tem como objetivo ajudar à recuperação dos afetados e lembrou também que até 24 de agosto foram detidas 103 pessoas por fogo posto. «Obviamente contamos com o esforço de todos para convergirmos na solução deste grave flagelo», acrescentou.
Partidos criticam Governo
Paulo Raimundo foi o primeiro a responder, afirmando que «mais uma vez faltou a coordenação» no combate aos incêndios: «Não é possível erradicar os incêndios, mas tem de ser possível minimizar o drama que causam». O líder comunista destacou que «faltaram meios aéreos, mas não faltou o negócio em torno dos meios aéreos». Para o PCP, o Governo reagiu tarde, empurrou a situação com a barriga, fugindo às suas responsabilidades. Paulo Raimundo defendeu ainda que a dimensão dos incêndios resultou de «políticas desastrosas», como o corte do investimento público nas florestas.
Para o Chega, a palavra que define a forma como o Governo lidou, até hoje, com a situação é «incompetência». «Não vale a pena ir ao Pontal falar de Fórmula 1, quando perdemos o mais útil, que é a vida das pessoas», criticou o líder do partido, André Ventura, atirando à ministra da Administração Interna: «Isto não é só desatenção, olhar para o lado. Isto tem um nome: chama-se incompetência».
Filipe Sousa, deputado único do Juntos pelo Povo (JPP), disse que o Estado «relaxou» e «chegou tarde demais».
Também a deputada única pelo PAN, Inês Sousa Real, lembrou que se bateu o recorde de floresta ardida, sublinhando que é necessário garantir que o mesmo não acontecerá em 2026.
Mariana Mortágua questionou o porquê de os bombeiros terem ficado excluídos nas 45 medidas anunciadas pelo Governo após os incêndios. «O problema é muito anterior aos incêndios, o facto é que o Governo não preparou os incêndios e a ministra ainda nos veio dizem que tinha mais meios do que era necessário», disse.
Já João Almeida (CDS) frisou que houve um Conselho de Ministros que tomou medidas excecionais, acabando por desafiar o PS a dizer que outro líder de Governo esteve no Parlamento em agosto para discutir os incêndios. «António Costa, José Sócrates, António Guterres,… Digam um», atirou.
Mariana Leitão, líder da Iniciativa Liberal (IL), afirmou que hoje se vivem três consequências: «A de nada fazer, a de apenas reagir e do calculismo político». «Vai precisar de mais relatório para perceber o óbvio? Que a legislação da floresta está um caos? Se está à espera, o problema não é da floresta, é da sua capacidade de indecisão», provocou, referindo-se às palavras de Montenegro, que pediu apoio dos partidos, mas que chumbou a proposta da IL.
Pelo Livre, Rui Tavares defendeu que a questão não é discutir partidariamente quem é mais ou menos incompetente. «Foi preciso chegar à situação em que estamos para que diga que quer um plano a 25 anos. Vamos perceber essa vontade de diálogo percebendo onde ela pára», lamentou, recordando que o partido não foi incluído em nenhum diálogo com o Governo.
José Luís Carneiro, classificou a ação do Governo como «insensível» e com «falta de humildade». O secretário-geral do PS acredita que o primeiro-ministro devia ter adiado a festa do PSD no Algarve, «quando a população estava a sofrer e a viver momentos dramáticos».
E o líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, falou das alterações climáticas: «O que temos de saber é se estamos a fazer tudo a montante, durante o combate, e a jusante para minorar os efeitos».
O debate promete continuar, até porque a época dos incêndios, apesar das tréguas, ainda não acabou.