Reforma mais tarde e mais cara

Portugal encontra-se entre os Estados-membros com idade de reforma futura mais elevada, despesa mais pesada com pensões e maiores pressões demográficas sobre o sistema de Segurança Social, diz a OCDE.

Portugal volta a destacar-se no panorama internacional das pensões e não pelos melhores motivos. De acordo com o relatório Pensions at a Glance 2025, divulgado pela OCDE, o país encontra-se entre os Estados membros com idade de reforma futura mais elevada, despesa mais pesada com pensões, e maiores pressões demográficas sobre o sistema de segurança social.

A organização projeta que quem entra hoje no mercado de trabalho terá de trabalhar até aos 68 anos para aceder à pensão completa. Este valor coloca Portugal num grupo restrito de apenas oito países com as idades de reforma mais altas, lado a lado com Dinamarca, Itália, Estónia ou Holanda. A média da OCDE situa-se entre os 66 e os 67 anos, com vários países – como é o caso de Luxemburgo ou Grécia – a manterem idades de saída mais baixas.

A comentar estes dados ao Nascer do SOL, Paulo Monteiro Rosa, economista do Banco Carregosa, defende que o aumento da idade da reforma «é inevitável e está em linha com o que acontece na maioria dos países desenvolvidos», explicando que «a esperança de vida aos 65 anos tem vindo a aumentar consistentemente e o sistema tem um mecanismo automático que ajusta gradualmente a idade legal para garantir a sustentabilidade financeira».

O economista diz ainda que o nosso país «não é caso isolado no ajustamento da idade de reforma, mas as projeções da OCDE indicam que, devido ao mecanismo automático associado à esperança de vida, a idade legal futura poderá situar-se entre as mais elevadas da organização».

Paulo Monteiro Rosa recorda que, segundo a estimativa do INE para o triénio 2023–2025, a idade da reforma será de 66 anos e 11 meses em 2027. «Este aumento é numa tendência comum na OCDE, em que vários países estão a alinhar a idade legal de acesso à pensão com a evolução demográfica, de forma a garantir a sustentabilidade dos sistemas de pensões».

Na generalidade dos países da OCDE, a idade legal tem vindo a aproximar-se dos 67 anos, lembra, acrescentando que «a idade efetiva de saída do mercado continua, porém, a variar bastante consoante o setor e o tipo de carreira contributiva, o que significa que o impacto do aumento não é homogéneo entre trabalhadores».

Já o economista Eugénio Rosa não poupa críticas à atuação de Portugal: «Embora o Eurostat não tenha ainda disponibilizado dados para anos mais recentes, é de prever que a situação de saúde dos portugueses não tenha melhorado devido à crise grave que enfrenta o SNS e as dificuldades crescentes no acesso a cuidados de saúde»,atira, ao nosso jornal. «Os portugueses estão a ser obrigados a trabalhar sem saúde cada vez mais anos para obterem a pensão completa, e os que se reformam ou aposentam antecipadamente sofrem enormes cortes na pensão que que contribuem para o aumento da pobreza no país».

Mas o verdadeiro peso do sistema português revela-se nas contas públicas. As pensões representam cerca de 13% do PIB, muito acima da média da OCDE (8%). Apenas Itália, Grécia e França apresentam valores superiores. Em termos de impacto orçamental, Portugal dedica mais de um quarto da despesa pública (27%) ao pagamento de pensões, um dos valores mais elevados de toda a organização.

Apesar desta pressão financeira, o relatório sublinha que as pensões portuguesas continuam relativamente generosas face aos salários, quando comparadas com outros países desenvolvidos. Sistemas como o dos EUA, Japão ou Reino Unido apresentam níveis médios de pensão significativamente mais baixos, enquanto outros, como Holanda ou Dinamarca, combinam pensões públicas com fortes sistemas complementares privados, aliviando o peso sobre o Estado.

Ao Nascer do SOL, Paulo Monteiro Rosa afasta o aumento da idade da reforma como truque para resolver eventuais problemas de sustentabilidade da Segurança Social e recorda que a idade normal de acesso à pensão é ajustada à evolução da expectativa de vida aos 65 anos. «À medida que os portugueses vivem mais tempo após essa idade, o sistema atualiza a idade legal para manter o equilíbrio entre a duração da carreira contributiva e o período médio de recebimento da pensão, tendo em conta a relação entre a população ativa e o número crescente de pensionistas, num contexto marcado pela inversão da pirâmide demográfica», salienta.

No entanto, reconhece que este mecanismo enfrenta tendências demográficas estruturais como a baixa natalidade, o envelhecimento acelerado e a inversão gradual da pirâmide demográfica, fatores que reduzem o peso relativo da população ativa face ao número de pensionistas. «A atualização automática da idade da reforma é, portanto, uma forma de garantir a sustentabilidade financeira do sistema num contexto em que a estrutura demográfica se altera de forma persistente. É um processo técnico e previsível», acrescenta.

Também Eugénio Rosa afasta um cenário de ‘falência’ da Segurança Social e chama a atenção para os saldos positivos da Segurança Social no período 2011/2024 depois de terem atingido os 30 mil milhões de euros, enquanto o Fundo de Estabilização Financeiro da Segurança Social acumulou, até ao fim de 2024, 35 mil milhões de euros. Verba que, no entender do economista, é «mais do que o suficiente para pagar um ano de pensões no caso de dificuldades transitórias da Segurança Social».

Ainda assim, deixa um alerta: «A sustentabilidade da Segurança Social seria fortemente assegurada se existisse um combate eficaz e firme à fraude e à evasão contributiva». E dá como exemplo os cálculos feitos com base nos valores divulgados pelo INE de ordenados e salários pagos em Portugal de 2010 a 2023: ficaram por entregar à Segurança Social, devido a evasão e fraude, 59.787 milhões, o que dá uma média anual de 4.270 milhões de euros de receita perdida pela Segurança Social. Os alertas não ficam por aqui. «Mais de 12 mil milhões de euros de quotizações e contribuições declaradas à Segurança Social ficaram por cobrar, pois a Segurança Social não os conseguiu cobrar por falta de meios e o Governo a seguir anulou-as».

De acordo com o economista, um dos desafios que se colocam nesta matéria diz respeito à base de cálculo das contribuições das empresas e à mudança que tem sido levada a cabo pelas empresas. «Quando o sistema atual foi criado as empresas que geravam mais riqueza eram as de trabalho intensivo, as que tinham maior número de trabalhadores. Hoje a realidade é outra. As que criam mais riqueza são as de capital, inovação e conhecimento intensivo. E a situação vai se agravar muito mais e mais rapidamente com a generalização inevitável da utilização da IA pelas empresas, pois vão precisar de menos trabalhadores com mais competências, portanto a massa salarial representará uma percentagem cada vez menor da riqueza criada pela empresa», acrescenta.

Daí, defender que a base de cálculos das contribuições das médias e grandes empresas passe a ser feita com base na riqueza líquida. Por outro lado lamenta que a aposta do Governo para a sustentabilidade da Segurança Social assente na contratação do economista Jorge Bravo para liderar um grupo de trabalho que tem como objetivo preparar mudanças no sistema de pensões, assim como a estratégia da comissária Maria Luís Albuquerque em criar fundos de pensões privados europeus, «de inscrição automática para onde seriam desviadas as poupanças dos trabalhadores e pensionistas».

Quebra de rendimento?

Questionado sobre o facto de vários estudos apontarem para uma quebra de rendimento na ordem dos 50%, Paulo Monteiro Rosa defende que essas estimativas «refletiam cenários de stress elaborados em estudos anteriores, que partiam de pressupostos muito exigentes quanto à evolução demográfica, à duração das carreiras contributivas e à idade efetiva de saída do mercado de trabalho». E diz que esses números «não representam a realidade atual».

Hoje, explica o economista, «as projeções são mais moderadas e dependem sobretudo das características individuais de cada carreira, nomeadamente do número de anos de descontos, do perfil salarial e da idade a que a pessoa se reforma». E diz que a tendência «é para ajustamentos graduais e não para ruturas abruptas, embora a evolução demográfica continue a ser determinante para a sustentabilidade futura do sistema».