Quem são os juízes do Face Oculta?

Os três juízes que julgaram o caso Face Oculta, aplicando sexta-feira penas de prisão efectiva aos principais arguidos, têm em comum “serem bastante competentes, discretos e tecnicamente inatacáveis”, segundo os testemunhos unânimes recolhidas pelo SOL em Aveiro.

Quem são os juízes do Face Oculta?

O juiz-presidente, Raul Cordeiro, conhecido por ser “um homem poupado”, costuma ter a preocupação de apagar as luzes que já não são necessárias, nos tribunais por onde tem passado, mas como sempre no seu longo percurso, foge das luzes da ribalta e nunca deu uma única entrevista. Para acomodar as centenas de volumes e de apensos do caso Face Oculta, mandou vir estantes que já não faziam falta noutros tribunais da Comarca do Baixo Vouga. Quando precisou de guardar cópias de segurança do megaprocesso, teve de comprar material informático do seu próprio bolso. Este transmontano, que cedo se apaixonou por Coimbra, é atentamente ouvido pelo presidente da Comarca de Aveiro, o juiz-desembargador Paulo Brandão.

Por outro lado, Raul José Cordeiro, Liliana Nogueira Carvalho e Raquel Ferreira Neves, os três juízes que constituíram o Tribunal Colectivo do principal processo do caso Face Oculta, nunca quiseram protecção policial. Nem mesmo quando, no caso de Raul Cordeiro, teve que andar de comboio de comarca em comarca quando os serviços centrais, em Lisboa, retiraram o já antigo automóvel de serviço aos magistrados do Baixo Vouga.

O juiz não mudou os seus hábitos diários desde que ficou em exclusivo na presidência do julgamento Face Oculta, porque, além do mais, costuma afirmar em círculos mais reservados, “ser sempre muito relativa a complexidade dos processos”. Ao receber pelo sorteio a presidência do Face Oculta só diria: “os processos não têm rosto”.

Juiz Raul Cordeiro

Raul Cordeiro não só está habituado a julgar políticos (como um antigo deputado do PSD, Cruz Silva, no Tribunal de Águeda, que foi absolvido) como a ter processos com muitos arguidos, tal como o Face Oculta. Não raras vezes tem aplicado penas superiores às que são solicitadas pelo Ministério Público.

Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, há cerca de 25 anos, este transmontano, curiosamente seguiu em parte as pisadas de outro ilustre cidadão de Mogadouro, o escritor Trindade Coelho. É que tal como o autor realista de “À Lareira”, também Raul Cordeiro licenciou-se em Coimbra e é juiz. Com origens humildes, desde cedo se habituou a trabalhar no campo.

Contra os  'juízes caixeiros-viajantes'

Raul Cordeiro, sendo membro do Conselho Geral da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, está ainda ligado ao Fórum Permanente Justiça Independente, tendo vindo a preconizar uma configuração diferente do mapa judiciário, visando optimizar todos os recursos da máquina judicial em benefício dos cidadãos, mas também a especialização da justiça, desde há muito anos a esta parte, uma medida que entretanto está no terreno.

Numa intervenção, 'A Reorganização Judiciária', proferida há cerca de quatro anos, no Algarve, em iniciativa do Fórum, Raul Cordeiro, a partir da sua experiência na comarca-piloto do Baixo Vouga, sedeada em Aveiro e entretanto extinta com o novo mapa judiciário que entrou em vigor no dia 1, criticou o facto de alguns juízes na região aveirense serem “autênticos caixeiros-viajantes”.

Raul Cordeiro referia-se então aos seis juízes da Comarca do Baixo Vouga que faziam “regularmente deslocações entre as sedes dos municípios onde estão sedeados os juízos agregados”, lamentando “a inerente perda de tempo que deveria ser usado para trabalhar nos processos”.

Raul Cordeiro defendeu sempre a especialização na justiça, mas só ao nível dos grandes centros urbanos, como Aveiro, nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e capitais de distrito, onde novas estradas aproximaram municípios até aí distantes. Mas sempre sem descurar a outra realidade que é o interior de Portugal, que aliás o juiz tão bem conhece.

Defende também que nas zonas mais afastadas dos grandes centros, os postos da GNR sirvam para fazer vídeo-conferências, aproveitando-se tais recursos. Na comarca do Baixo Vouga, aliás, algumas sentenças foram proferidas pelo juiz em vídeo-conferência para a Cadeia Regional de Aveiro e outros estabelecimentos prisionais, a fim de evitar deslocações e poupando recursos estatais.

Juiz com nota máxima

Juiz há 20 anos e com nota de Muito Bom, a classificação máxima, Raul Cordeiro é o presidente do tribunal colectivo que na sexta-feira leu o longo acórdão, ladeado pelas duas juízas, Liliana Nogueira Carvalho e Raquel Ferreira Neves.

Raul José Cordeiro nasceu no dia 21 de Fevereiro de 1962 na localidade de Granja, concelho de Mogadouro e distrito de Bragança. Tem 52 anos.

Licenciou-se em Direito na Universidade de Coimbra e ingressou no Centro de Estudos Judiciários (CEJ) no ano de 1993/94. Foi sucessivamente colocado nas comarcas de Tábua (1996/97), de Condeixa-a-Nova (1997/98) e de Águeda (1998/99 a 2003/04). Na comarcade Águeda, foi juiz formador do CEJ durante três anos, tendo ajudado a formar alguns dos juízes da região e com os quais tem julgado casos importantes. Um deles foi o da corrupção na Brigada de Trânsito da GNR, que decorreu no Tribunal de Estarreja. Outro caso foi o da operação “Reis da Mata”, uma rede de proxenetas desmantelada pela PJ do Porto.

O magistrado esteve depois no Círculo de Anadia (2004/2005), no Círculo de Aveiro (2005/2006 até Abril de 2009) e encontra-se desde Abril de 2009 em Aveiro.

Juíza Liliana Nogueira Carvalho

As duas juízas que integram o Tribunal Colectivo presidido por Raul José Cordeiro são Liliana Nogueira Carvalho e Raquel Ferreira Neves.

Liliana Carvalho, de 42 anos, natural de Vila Real, estava colocada anteriormente em Mirandela. Graças a ela o processo não foi anulado, já que contra opinião dos médicos interrompeu um internamento a seguir a uma delicada intervenção cirúrgica, em Vila Real. Chegou a já ser conduzida então ao Palácio da Justiça de Aveiro num carro para-médico, de forma discreta. Juíza há 15 anos, estagiou em Braga e passou pelas comarcas de Vila Real, Mondim de Basto e Penafiel. Já está colocada na Bolsa de Juízes do Porto.

Juíza Raquel Ferreira Neves

A outra juíza, que era a titular do processo, é Raquel Ferreira Neves, magistrada há 15 anos, enquanto colocada no Juízo 2 de Ovar, foi a titular do Face Oculta, tendo sido quem despachou até meados de Abril de 2014 todas as questões relacionadas com este processo, encontrando-se agora no Juízo de Família e de Menores de Aveiro, depois de ter sido colocada em Oliveira do Bairro. Natural de Portalegre, tem 42 anos e é ainda juíza formadora do Centro de Estudos Judiciários.