PS, PSD e CDS devem um milhão à Assembleia

PSD, PS e CDS ainda não devolveram as verbas da subvenção estatal recebidas em excesso para as eleições autárquicas de 2009, cuja reposição foi ordenada já em 2013 pelo Tribunal Constitucional (TC). Coube à Assembleia da República (AR) fazer as contas e notificar os partidos, o que só aconteceu em Março passado: PSD, PS, CDS…

O ponto 7.3 do acórdão 231/2013 do TC não deixava margem para dúvidas sobre as irregularidades: "Subvenção estatal recebida em excesso ou indevidamente recebida (BE, CDS-PP, PPD/PSD, PS, PPD/PSD-CDS-PP, GCE-CIPA, GCE-NMMS)". O que não indicava era os montantes. 

Segundo o SOL apurou, os cálculos feitos pelos serviços da AR  concluem que o CDS recebeu 537 mil euros a mais, o PS 337 mil e o PSD 35 mil. A coligação PSD-CDS também tem contas a acertar: mais de 91 mil euros para devolver.

Prazo para pagamento era de 30 dias

A AR emitiu as notificações já no final de Março para os três partidos e para dois movimentos: o Cidadãos Independentes pela Amadora, que terá recebido 29 mil euros em excesso, e o Narciso Miranda Matosinhos Sempre, que terá de repor 23 mil.

Num esclarecimento enviado ao SOL, o secretário-geral da AR, Albino Soares, afirma que os cálculos foram efectuados pelos serviços e admite que houve forças políticas que não aceitaram os valores, ainda que em alguns casos a defesa tenha sido apresentada após o prazo estipulado: "Quanto à alegada apresentação de defesa fora do prazo por algumas forças políticas, refira-se que há situações em que o prazo de 10 dias se interrompeu por força da apresentação do pedido de esclarecimentos adicionais".

Ainda que a maioria das guias de reposição tenha sido emitida a meados de Abril, tendo um prazo-limite de pagamento de 30 dias, o secretário-geral da AR garante que "o prazo ainda não terminou para todas as forças políticas notificadas".

Sem nunca falar dos valores apurados pelos serviços, o gabinete de Albino Soares assegura que a AR "nunca deixará caducar o prazo para instauração das acções de execução fiscal que, no seguimento deste processo, devam ter lugar".

Ao que o SOL apurou, os partidos que exerceram o direito de audiência prévia – na sequência da notificação – receberam da AR um novo documento em que se referia que o pedido de reposição decorria do acórdão do TC. Ou seja, após a audiência prévia, a AR manteve o entendimento de que "em alguns municípios a subvenção estatal atribuída ultrapassava o limite das despesas orçamentadas e efectivamente realizadas". Juntamente com a resposta negativa aos recursos, foram enviadas guias de pagamento.

Risco de prescrição

Ao SOL, apenas o PS e o CDS responderam. O PS disse que, após a recepção da guia, "contestou judicialmente a reposição determinada pela AR não apenas por o montante em causa não coincidir com o que foi apurado pelo Tribunal Constitucional mas também por o respectivo cálculo não estar adequadamente fundamentado".

Já o CDS assegura ter recorrido dos cálculos feitos pelo Parlamento dentro do prazo estipulado por lei, quer em sede de audiência prévia, quer no recurso hierárquico. O secretário-geral do partido, António Costa Monteiro, defende que, por isso, "não é, neste momento, devido qualquer pagamento pelo CDS" e que "as guias (de reposição) caducaram". E adianta que o partido recorreu, por considerar que houve "um erro na aferição das contas". 

Segundo o decreto-lei 155/92, de 28 de Julho (que estabelece as regras de administração financeira do Estado), «a obrigatoriedade de reposição das quantias recebidas prescreve decorridos cinco anos após o seu recebimento», mas a AR diz estar atenta. Mesmo sem saber ao certo qual o momento a partir do qual começou a contar o prazo de prescrição, o gabinete do secretário-geral Albino Soares afasta qualquer a possibilidade prescrição: "Se a prescrição for contada a partir da data da prolação do acórdão do Tribunal Constitucional, o dever de reposição só prescreve em 2018. Mas mesmo que se opte por contar tal prazo, não a partir daquela data mas a partir da data do primeiro pagamento da subvenção (feito em Abril de 2010), a AR interrompeu esse prazo, ao notificar as candidaturas para audiência prévia".

Tribunal acolheu explicação do BE

O BE foi a única força política que o TC poupou neste dossiê. O acórdão deste Tribunal explica que a "imputação não procedeu", uma vez que o partido apresentou uma resposta considerada satisfatória. Antes das justificações apresentadas, os juízes consideravam que o BE teria recebido cerca de 346 mil euros a mais.

Os serviços da AR, em respeito pelo acórdão, não terão por isso posto em causa o valor da subvenção estatal paga nas autárquicas de 2009.  

Diferentes cálculos

A Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP), que coadjuva o TC na fiscalização das contas, referia no seu parecer que o valor a devolver pelo CDS à AR, por exemplo, era de 590 mil euros. Também o PSD teria de devolver mais se os cálculos dos serviços da AR estivessem de acordo com os que foram feitos pela ECFP: segundo as contas da entidade, o valor a repor seria de 191 mil euros e não 35 mil. 

O PS não ficou a ganhar, ainda que a diferença seja mínima: em vez dos 334 mil euros a que chegou a Entidade das Contas, na guia de reposição da AR consta que deve repor 337 mil euros. Também a coligação PSD/CDS saiu 'prejudicada' com os novos cálculos: em vez dos 58 mil apurados pela ECFP, a AR considera que recebeu 91 mil euros a mais.

Quanto ao grupo de cidadãos Narciso Miranda Matosinhos Sempre, que tem de repor 23 mil euros, o parecer da Entidade apontava para um valor recebido em excesso de 15 mil euros.

carlos.santos@sol.pt