Duarte Lima e os submarinos. Caso arquivado sem equipa de investigação

Os extractos das contas bancárias não deixaram margem para dúvidas: Duarte Lima recebeu numa conta da UBS nove transferências, num total superior a 800 mil euros, entre 2001 e 2002. O dinheiro veio de uma conta da Rebora Holdings, que tinha como um dos titulares Gil Figueira, representante da alemã Ferrostaal na negociação da aquisição…

No despacho de arquivamento, de 9 de Junho e a que o SOL teve acesso, a procuradora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) que encerrou o caso frisa que a complexidade e “tecnicidade” do processo impunha a intervenção de uma equipa multidisciplinar constituída pela Polícia Judiciária (PJ) e pela Autoridade Tributária (AT). Mas nenhuma foi oficialmente chamada a colaborar. Porquê? A procuradora diz apenas: “Por razões que não importa aqui escalpelizar”.

“Apesar das duas reuniões informais efectuadas entre o Ministério Público e o inspector tributário da AT – Direcção de Finanças de Braga, a 27 de Março de 2014 o mesmo inspector veio invocar o seguinte: 'Não tenho, contudo, nem conhecimento, nem legitimidade, para a elaboração do referido relatório que solicita'“.

Apesar dessa lacuna e embora os factos ainda não tenham prescrito, a procuradora concluiu: “Não se vislumbram outras diligências que surtam interesse útil à investigação”.

O DCIAP concluiu não ter sido recolhido qualquer indício de que a aquisição e negociação das contrapartidas dos submarinos teve a intervenção de Duarte Lima,  nem qualquer indício de que os restantes arguidos estavam envolvidos em esquemas de corrupção ou usavam a conta offshore para branquear capitais.

“As dúvidas adensam, e as certezas são nenhumas. Atendendo ao princípio de inocência e às regras de experiência comum e de normalidade da vida, cremos que, no caso concreto, os movimentos 'suspeitos' de capitais ocorridos em Portugal não estão minimamente alicerçados em meios de prova que nos permitam um juízo de valor racional diverso”, concluiu a magistrada.

Canals comprometeu Lima

Perante as transacções entre a Rebora Holdings e uma das contas bancárias na UBS, o DCIAP começou por interrogar Gil Figueira. O comandante disse não conhecer Lima, negou ter dado qualquer ordem de transferência e disse até nem saber que era procurador da conta da Rebora Holdings, juntamente com o seu filho e a sua nora. Cerca de 15 dias depois, o filho, António Figueira, foi chamado ao DCIAP e deu uma versão semelhante: não conhecia Duarte Lima, não tinha memória de qualquer transferência para uma conta associada ao antigo dirigente do PSD e só adquiriu a Rebora Holdings para “canalizar meios financeiros para o Brasil” e porque “era 'moda', em certos meios sociais, ter contas em offshore”. A mulher, Maria Alexandra Figueira, também foi ouvida nesse dia, mas nada tinha a acrescentar.

O único depoimento que viria a comprometer Duarte Lima seria o de Michel Canals, o gestor de fortunas apanhado na teia do caso  Monte Branco: ouvido como testemunha, o sócio da Akoya confirmou ser o seu gestor de conta à data em que foram recebidas as primeiras transferências suspeitas. E disse estar certo de que o antigo deputado teria obrigatoriamente de saber que todas aquelas transferências tinham origem na Rebora Holdings. “Teria necessário conhecimento do que seria essa entidade, uma vez que seria informado do recebimento das transferências e nunca colocou em causa a legitimidade das mesmas”.

O processo agora arquivado nasceu de uma certidão extraída de outro inquérito que ainda está sob investigação e que partiu de uma queixa de Olímpia Feteira. Nesse processo paralelo, os investigadores descobriram, por exemplo, que Duarte Lima tinha sete contas na UBS. E encontraram indícios de que terá sido, a partir de Dezembro de 2000, gestor de fortunas da Associação Nacional de Farmácias através de contas abertas na Suíça.

silvia.caneco@sol.pt