Malditas listas

As listas de livros obrigatórios… Deve haver centenas delas, talvez milhares, todas diferentes entre si. Obviamente o ‘obrigatório’ varia de país para país, de época para época, de profissão para profissão. Varia, até, de pessoa para pessoa.

Para um português é obrigatório conhecer pelo menos algumas passagens d’Os Lusíadas – para um americano já não (talvez o equivalente americano do nosso poema épico seja Folhas de Erva de Walt Whitman). Um clássico como Cem Anos de Solidão é obrigatório nos dias de hoje, mas há cem anos ainda nem sequer tinha sido escrito. A Origem das Espécies será obrigatório para um cientista, mas não para um político, que por sua vez considerará obrigatório o Da Democracia na América, de Tocqueville, ou a República de Platão. Isso do ‘obrigatório’ tem, portanto, muito que se lhe diga.

Ainda assim, essas listas espicaçam-me sempre a curiosidade – e, a avaliar pelas reacções entusiásticas que suscitam, sei que não estou sozinho. Acontece que normalmente, ao ver um a um os títulos, acabo por ficar deprimido, pois a percentagem dos livros considerados ‘obrigatórios’ que li da primeira à última página costuma revelar-se bastante reduzida.

Espreitemos a última lista deste género publicada pela Time – ‘Os 35 livros que toda a gente devia ler pelo menos uma vez na vida’. Neste caso, a minha performance nem foi particularmente má: das 35 obras citadas, já li nove, ou seja, cerca de um quarto; outro quarto é constituído por títulos que não li, mas tenciono ler; outro quarto ainda diz respeito a livros que não li nem me interessam. E por fim há a parte mais embaraçosa, aqueles de que nunca ouvi sequer falar.

Mas é sobre um dos livros que conheço que irei debruçar-me: Kafka à Beira-Mar, do japonês Haruki Murakami. Há coisa de cinco anos o título chamou-me a atenção, ouvi dizer maravilhas e li-o em poucos dias durante umas férias de Verão. Se gostei? Sem dúvida. Lê-se bem? Tão bem que não damos pelo passar das páginas. É uma obra-prima? Nem por sombras. E muito menos um livro ‘obrigatório’.

Como se explica que um livro estimável – mas a meu ver inócuo – passe à frente de verdadeiros colossos da literatura? Talvez não se explique. Mas isso não nos impede de retirar daí uma conclusão valiosa. Só há uma lista possível de livros obrigatórios – e essa não vem nos jornais nem na internet. É pessoal. Que cada um faça a sua e não se preocupe demasiado com o que dizem os outros.

jose.c.saraiva@ionline.pt