Portugal derrotado por KO na CPLP

Marcelo Rebelo de Sousa tinha tomado posse como Presidente da República há dois dias quando o ministro dos Exteriores de Angola, Georges Chikoti, fez questão de recordar que, ao contrário do que aconteceu com Moçambique, o seu país não fora convidado para a tomada de posse do novo Presidente da República.

A mensagem subliminar era direta, numa altura em que as relações Portugal-Angola não atravessam o melhor dos momentos, e refletiu-se no veto a que Portugal assumisse este ano a presidência da CPLP. Ficou acordado que no próximo mandato, daqui a dois anos, depois de São Tomé, Portugal teria o direito de a assumir. Em discurso direto sobre a posse de Marcelo, Chikoti afirmou: «Os países vão a estes eventos na base de convites. Angola não foi convidada. Acho que os países hoje todos atravessam crises, Portugal anunciou que convidaria três países e acho que convidou Moçambique, Espanha e União Europeia». Mas Angola não se sentia «beliscada» com a falta de convite. «Portugal tem direito de tomar as decisões que lhe convier e acho que não temos problemas com isso», disse Chikoti, quando o clima de tensão sobre a CPLP ja estava ao rubro, com o veto de Angola.

Já Presidente da República, Marcelo visitou a sede da CPLP e repetiu a mensagem que Augusto Santos Silva, o ministro dos Negócios Estrangeiros, reiterara por sucessivas vezes – a de que cabia a Portugal apresentar o candidato e que nunca abdicaria da presidência. Santos Silva disse-o na sua primeira intervenção pública, que foi uma visita à CPLP, e depois no discurso ao corpo diplomático, quando já era conhecido o veto de Angola. «A Comunidade de Países de Língua Portuguesa está no topo das nossas prioridades. Neste ano de 2016, em que se celebrarão os 20 anos da sua fundação, em que se espera a aprovação da sua nova visão estratégica e em que cabe a Portugal apresentar a candidatura ao cargo de secretário executivo».

Se o argumento do veto a Portugal era um alegado acordo verbal – feito na altura da fundação – segundo o qual o facto de Lisboa ser a sede da CPLP obrigava Portugal a não indicar secretários executivos, a tese de Santos Silva saída da reunião que deu a Presidência a São Tomé foi outra. Afirmando-se «muito confortável» por entregar o cargo a São Tomé, com a promessa de que no próximo mandato, daqui a dois anos, a presidência será portuguesa, o ministro invocou uma alegada quota africana.

«Constatámos que, como a próxima presidência, que é por dois anos, é brasileira, entre 2016 e 2018, se o próximo secretário-executivo fosse português, pela primeira vez na história da CPLP nenhum país africano de língua portuguesa teria responsabilidades ou ao nível da presidência ou do secretariado-executivo», disse. «E entendemos que essa questão era facilmente ultrapassável trocando a ordem entre Portugal e São Tomé e Príncipe». Vítor Ramalho, nascido em Angola, que organizou em 1990 o congresso dos quadros angolanos, um evento precursor dos acordos de Bicesse, estava na calha para o cargo de secretário-executivo. Recorde-se que Ramalho tinha sido, em fevereiro, o representante do governo no funeral de Lúcio Lara, um dos fundadores do MPLA.

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