Governo e PSD. Acordo em 90 dias para descentralizar

Eduardo Cabrita ouviu as críticas do Bloco e do PCP à proposta do governo, mas defendeu que não é possível “adiar mais” este processo

Governo e PSD querem chegar a um consenso sobre a descentralização de novas competências para as autarquias em 90 dias. O objetivo é concluir o processo a tempo das autárquicas mas, desta vez, os socialistas só podem contar com o PSD, perante as muitas reservas do Bloco de Esquerda e do PCP.

“A nossa perspetiva é que é preciso trabalhar com muita celeridade para que este pacote legislativo possa ficar completo antes das próximas autárquicas, ou seja, devemos ter este pacote legislativo completo dentro de 90 dias. Antes das férias parlamentares”, disse ao i a deputada social-democrata Berta Cabral. Foi com esse objetivo que o PSD apresentou um projeto de resolução que será hoje votado em conjunto com as propostas sobre descentralização, para que seja criada uma comissão parlamentar eventual com a missão de, em 90 dias, tratar “o processo de descentralização de competências nos municípios, nas freguesias e nas entidades intermunicipais”.

O diploma foi apresentado durante o debate parlamentar sobre a descentralização para as autarquias, mas não mereceu o apoio do PS, que não vê “necessidade de recorrer à criação de uma comissão eventual”.

A discussão arrancou com um apelo do ministro para um consenso. “As autarquias merecem este contrato de confiança. Não podemos dizer que é necessário adiar mais. O tempo da descentralização, ao fim de 40 anos, é este, é agora, é hoje mesmo.”

O apelo não convenceu a esquerda e, se quiser avançar com esta reforma, que prevê descentralização e competências em áreas como a educação, saúde, combate à pobreza ou gestão do património devoluto, o governo vai ter de virar-se para o PSD.

Os sociais-democratas, pela voz de Berta Cabral, consideram que “há margem de convergência. É preciso haver trabalho, disponibilidade e vontade para conseguir essa convergência”.

Berta Cabral garante que o PSD não está preocupado “se vai fazer um acordo com o governo ou vai fazer um acordo com o partido A ou o partido B, está preocupado com os autarcas e a capacidade de desenvolver o país”. A deputada social-democrata sublinha ainda que o PSD “não é um partido centralista e acredita nas virtudes da descentralização. Já sabíamos que o PCP e o Bloco de Esquerda são partidos muito centralistas e, portanto, que não acreditam no poder local”.

Esquerda quer regiões

As maiores críticas às propostas do governo e do PSD foram feitas pelos deputados do BE e do PCP. Pedro Soares, do Bloco de Esquerda, lamentou que o governo esteja a seguir “o caminho do PSD, que já vinha do ex-ministro Miguel Relvas, de eliminar a criação das regiões administrativas do processo de descentralização”.

Pedro Soares assumiu que o BE tem “divergências de fundo com o governo” e alertou para que a mudança em curso irá “asfixiar a democracia local”.

Bloco de Esquerda e PCP entendem que o futuro passa pela regionalização. Paula Santos, deputada comunista, defendeu: “Falar de descentralização exige que tenhamos em conta a necessidade da concretização da regionalização.” Os comunistas discordam do processo de descentralização que o governo quer concretizar e consideram que “não é admissível que passem a existir 308 políticas de educação ou 308 políticas de saúde”.

Não pode haver pressas

O deputado do PEV José Luís Ferreira também disse ter “muitas e sérias reservas” sobre as propostas do governo e alertou para que “não pode haver pressas” neste processo. Já o CDS, pela voz de Hélder Amaral, disse ter “muitas dúvidas” sobre as intenções do governo e avisou que não alinhará com “qualquer tentativa de regionalização encapotada”.

O PS aposta tudo na discussão em sede de especialidade. O líder parlamentar dos socialistas, Carlos César, fez um apelo “no sentido de que os projetos de lei que estão presentes e a proposta de lei do governo possam ser aprovados e merecerem depois uma discussão cuidada no âmbito das comissões parlamentares”. César admitiu que “há sensibilidades diferentes sobre as virtualidades e modelos de descentralização política”, mas apelou para que se faça um debate “sem acordos prévios ou preconceitos ideológicos”. Este é “o momento adequado para alcançarmos os consensos que nos permitam progredir em matérias de proximidade, eficiência e democraticidade do Estado”, concluiu.