Inês Coutinho (Violet): Carta de Deneuve é “muito fraca”

Desde a publicação da já chamada carta de Deneuve no “Le Monde” que o consenso inicial em torno do tema do assédio parece desfeito. Partindo desta ideia, o i  fez duas perguntas a (Pôr o nome e o cargo da pessoas):

Inês Coutinho (Violet), Produtora musical DJ e ativista

1. Estamos numa sociedade em que vivemos o sexo como uma espécie de tabu, em que a interação não é direta e se baseia por isso em jogos, que estão largamente desenhados segundo o paradigma patriarcal e capitalista em que vivemos. Essa fronteira deixará de existir quando conseguirmos chegar a um patamar de entendimento que tem o consenso e respeito mútuo na sua base, em que os homens não dominam a narrativa e em que podemos tratar as coisas pelos nomes e ser uma sociedade mais sex-positive e ainda assim mais segura.

2. É uma carta muito fraca, redigida de forma pouco informada e baseada em preocupações neoliberalistas, que acabam por apenas proteger o privilégio da classe média-alta, branca, e no fundo reforçam o status quo patriarcal. A própria Deneuve acabou por pedir desculpa às vítimas, porque o backlash que a sua carta gerou deixou claro o quão despropositado é transformar este movimento numa “witch hunt” aos homens e à liberdade sexual. Irónico como a própria expressão “caça às bruxas” denota a opressão histórica da mulher: é auto-explicativo que não haja uma palavra que denote que há homens perseguidos apenas por serem homens – isso é um desprivilégio reservado às mulheres. Enquanto houver estas tentativas de trazer uma perspetiva de neutralidade a movimentos urgentes como este, o progresso ficará adiado por mais um tempo. Neutralidade política é uma ilusão preguiçosa que nunca adicionou conquistas à história dos direitos humanos.