Elina Fraga foi condenada pela Ordem dos Advogados

Em 2013, Elina Fraga foi punida pela Ordem dos Advogados com uma sanção de censura por violação dos seus deveres, mas o Tribunal de Mirandela decretou uma providência cautelar que lhe permitiu candidatar-se e ganhar as eleições para bastonária. 

A nova vice-presidente do PSD, Elina Fraga, foi condenada em 2013 pelo conselho superior da Ordem dos Advogados com uma sanção de censura por violar os deveres consagrados pelo Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA).

Segundo o relatório final do processo disciplinar que lhe foi instaurado, e a que o SOL teve acesso, a advogada recebeu dinheiro e documentos de uns clientes para tratar de um processo de heranças e nada fez.

«No que concerne à culpa, a senhora advogada arguida podia e devia ter agido de outro modo, e só não o fez porque não quis», lê-se no documento, de 1 de julho de 2013, assinado pelo relator António Salazar. «Tudo ponderado, deve a senhora advogada arguida ser punida com a sanção disciplinar de censura», conclui o relatório.

«A sanção de censura consiste num juízo de reprovação pela falta cometida e é aplicável a condutas que violem os deveres profissionais dos advogados ainda que de forma leve mas para as quais, em razão da culpa do arguido, já não seja bastante a advertência», diz o EOA.

Elina Fraga, que está inscrita na Ordem dos Advogados desde 27 de janeiro de 1998 e tinha um escritório de advocacia em Mirandela, junto com Hernâni Moutinho, exercia na altura o cargo de vice-presidente do conselho geral da ordem, depois de ter entrado para vogal no triénio anterior pela mão de Marinho e Pinto. A sanção aplicada impedia-a de exercer quaisquer cargos na Ordem, incluindo candidatar-se a bastonária, como era sua intenção e posteriormente viria a concretizar-se. 

Apesar de o relatório final da sentença referir explicitamente «que a senhora Advogada arguida, notificada da acusação, não apresentou defesa», Elina Fraga haveria de entrar no Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela com um processo cautelar contra a Ordem dos Advogados, que, a 12 de novembro de 2013, haveria de ser-lhe favorável, determinando o juiz Marco Moreira «a suspensão da deliberação impugnada», a tempo de Elina Fraga poder liderar a Lista I às eleições de 29 de novembro e ganhar. Uma vitória esmagadora (6510) com 3000 votos de diferença para a Lista S de Guilherme Leite (3510), num total de mais de 21 mil votos. Curiosamente, o mesmo Guilherme Leite que haveria de a derrotar em dezembro de 2016, por menos de 700 votos.

Sentença curiosa

A sentença do Tribunal de Mirandela é curiosa, porque embora rebata quase todos os pontos apresentados por Elina Fraga na sua fundamentação para suspender a deliberação tomada pelo plenário do conselho superior da Ordem dos Advogados, acaba por dar razão ao pedido pelo facto de a Ordem não ter ouvido uma funcionária do escritório, «pois terá sido através desta, e não por contacto direto com a advogada, que a participante e os irmãos terão encetado as diligências infrutíferas para ver esclarecida a sua situação».

Isto é, o juiz Marco Moreira considerou que a sanção aplicada a Elina Fraga, que em nenhum momento do processo a advogada contestou, nem no pedido de suspensão cautelar, deveria ser suspensa porque não foi junto o testemunho de uma funcionária. 

«Por carta data de 23.07.2008, a senhora advogada arguida remeteu à participante os documentos solicitados, justificando o atraso com grande acumulação de serviço», lê-se na sentença do Tribunal de Mirandela. A advogada admitiu à cliente Fátima Pires Vaz – que participou do seu comportamento à Ordem – não ter tido tempo para tratar do seu caso, devolveu-lhe os 1000 euros pedidos como adiantamento. E não contestou os factos que estiveram na base da queixa – como escreve António A. Salazar, «a senhora Advogada arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua descrita conduta era, como é, proibida». 

Elina Fraga alega mesmo em sua defesa, como razão para a suspensão da pena de censura, que já teria outros três processos disciplinares anteriores e que estes deveriam ter sido incluídos no processo para serem julgados em simultâneo e não foram. Mais ainda, no seu raciocínio, a advogada relaciona esse facto com o anúncio da sua candidatura a bastonária. O relatório final da sentença refere explicitamente que «a senhora advogada está inscrita na Ordem dos Advogados desde 27.01.1998, sem qualquer registo disciplinar, o que constitui circunstância atenuante».
Para o juiz Marco Moreira, no entanto, «o invocado abuso (desvio) de poder falha o critério da evidência» pois «para que se verifique abuso de poder é necessário que se demonstre que o poder disciplinar foi utilizado de forma a impedir a requerente de concorrer a Bastonário da Ordem dos Advogados» e tal não foi demonstrado. A «não apensação dos processos disciplinares com o eventual intuito de aplicar duas penas disciplinares não se compadecem com um juízo sumário», escreve o juiz. Certo é que a advogada foi condenada num outro processo disciplinar, com uma advertência.

Mais um processo disciplinar

Já depois de condenada pela Ordem e eleita para bastonária para o triénio 2014-2016, Elina Fraga voltou a ser alvo de uma queixa de uma cliente que levou à abertura de um novo processo disciplinar. Segundo o Público, desta vez, a participação referia-se, entre outras coisas, a conflito de interesses. Cândida Loureiro, a queixosa, alegava que no processo em que foi representada por Elina Fraga a outra parte tinha como advogado o sócio, Hernâni Moutinho.

A vice-presidente do PSD não se defendeu nesse processo disciplinar, ao contrário do seu colega, que, em declarações ao Público, referiu que os dois já não eram sócios na altura, mas os documentos apresentados não o demonstram, segundo a queixosa. Aquilo que mostram é que cessaram a atividade em sede de IVA, continuando aberta a sociedade em sede de IRC.

Conflito de interesses à parte, o testemunho de Cândida Loureiro em relação ao comportamento de Elina Fraga como advogada é em tudo semelhante ao de Fátima Pires Vaz, que terminou com a sanção de censura em 2013: omissão na defesa dos seus interesses, falta de prestação de informações, indisponibilidade para receber ou ouvir a cliente.

Contactado pelo Sol, Luís Menezes Leitão, presidente do conselho superior da Ordem dos Advogados, a quem coube julgar o caso, mostrou-se indisponível para fazer qualquer comentário: «O Conselho Superior da Ordem funciona como um tribunal e não prestamos declarações sobre os processos. estamos sujeitos a um rigoroso dever de sigilo».

O SOL tentou contactar Elina Fraga, quer por contato telefónico  quer por mensagem, mas não conseguiu obter resposta.

Este artigo foi publicado na edição impressa do SOL de 25 de fevereiro de 2018