Margarida Balseiro Lopes. ‘Não receio momentos de tensão com Rui Rio’

Não quer uma JSD ‘refém’ do partido. É a primeira mulher candidata à liderança da ‘jota’, mas não faz disso bandeira. Admiradora confessa de Passos, é progressista nos costumes.

O seu presidente na JSD, Simão Ribeiro, descreve-se como um homem de «centro-esquerda». Subscreve essa definição como sua? 

Não. Se tivesse de me enquadrar, eu dir-me-ia de centro-direita. Mas são divisões que estão ultrapassadas. Acho que na JSD como no PSD temos pessoas que são tanto do centro-esquerda como do centro-direita. E todos são militantes do mesmo partido. Às vezes perdemos muito tempo a discutir se estamos mais aqui ou ali e a discussão acaba a perder sentido. É evidente que pretendo ter uma liderança inclusiva perante as mais diversas sensibilidades. Se olhar, por exemplo, para as questões fraturantes, eu tenho uma opinião: votei a favor da Procriação Medicamente Assistida, da adoção por casais homossexuais. E sou a favor da legalização da prostituição e da legalização da canábis.

Porquê?

Sobretudo numa lógica de saúde pública e de mitigação dos riscos que neste momento existem para as gerações mais novas. 

No que toca aos costumes, não é exatamente uma conservadora. 

Não, não sou. Sobretudo, sou pela liberdade. 

E na economia também?

Também. Sendo certo que não é legítimo que o Estado deixe ninguém para trás. O Estado tem de ser uma rede que protege cada um de nós da eventualidade – e pode acontecer a todos – de tropeçarmos na vida. A obrigação do Estado é estar lá para nos amparar, assim como as instituições da sociedade.

Durante o governo PSD nunca sentiu que o Estado deixou pessoas para trás?

Houve a preocupação de não deixar que ficassem para trás. Houve mesmo. Naturalmente que há sempre erros e naturalmente que isso faz parte de governar. A vantagem de não decidir é que não se comete nenhum erro. Naturalmente que se cometeram erros, sobretudo naquele período mais crítico que o país atravessou – mas sempre com a preocupação de não deixar ninguém para trás. Isso, mais do que um chavão, foi notório: no reforço da ação social, no Ensino Superior, com o aumento do número de bolseiros, por exemplo. 

Continua, então, admiradora da liderança de Pedro Passos Coelho.

Com muito orgulho. E acho que a esmagadora maioria dos militantes do PSD também. Viu-se bem no último congresso.

Recentemente, numa aparição em Sintra, ele manifestou a sua «admiração» por si. É a sua referência como líder da JSD? 

É verdade. Foi um líder que marcou muito. Olhando para trás, temos o também o Pedro Pinto, na questão da autonomia, e ainda hoje é o exemplo de que a idade não significa a perda dessa autonomia. O Carlos Coelho, pela marca na credibilização da ‘jota’ e na formação política que ainda hoje é muito clara. E, claro, Passos. As lutas que teve com Cavaco e a autonomia que quis sempre vincar relativamente ao partido é uma inspiração para quem quer fazer da ‘jota’ uma estrutura autónoma. 

Será, nesse sentido, autónoma da estrutura do partido de Rui Rio.

Como é evidente. Sendo leal, não serei refém. A JSD só faz sentido se for autónoma. 

E terá com Rio momentos de conflito similares àqueles que, por exemplo, Passos Coelho teve com Cavaco Silva? 

Não sei, mas não também não temo ter esses momentos. Creio que da parte do presidente do partido, que é uma pessoa que eu respeito muito, haverá a sensibilidade de saber que a JSD é verdadeiramente autónoma. Rui Rio foi dirigente da JSD e irá compreender isso. Mas, independentemente de compreender ou não, o meu papel como presidente da Juventude Social Democrata é garantir que nós somos autónomos. Nos discursos que fazemos, nas propostas que apresentamos, nas ações que desenvolvemos e na postura que assumimos. É um ponto de honra.

A prestação do PSD na oposição foi largamente criticada nos últimos dois anos. Como deputada, o que acha que correu mal?

Talvez tenhamos ficado demasiado tempo – e ficamos todos – atónitos com a solução de Governo, inédita. Houve a expectativa de ser tão contra-natura que não fosse duradoura. Mas o que aconteceu foi que estávamos enganados. Com o PCP e o BE verdadeiramente coerentes com o que sempre disseram, não teria corrido como correu. Hoje, são partidos mais pragmáticos do que ideológicos. Ninguém esperava isso. 

E o PSD não foi também excessivamente ideológico nessa batalha?

Não. Na questão dos contratos de associação, nós criticámos a decisão do Governo, na altura altamente suportada pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda, e foi uma posição de natureza ideológica. Mas isso tem a ver com a forma como vemos o setor privado na educação, de uma maneira não demonizada. Qual é o problema? É bom haver diferenças que nos separem dos partidos mais à esquerda. 

Há pouco dizia-se uma mulher de centro-direita. Mas tem um discurso de natureza progressista. Esse progressismo não entrou nunca em choque com aquilo que o PSD foi nos últimos anos?

O partido tem de reinventar-se. Mas isso não passa apenas pela liderança nacional, mas também pelas estruturas locais e distritais. É um erro achar que as autárquicas foram perdidas na São Caetano. Houve más opções tomadas pelas estruturas locais e distritais. Conhecendo a realidade, olhando para cada caso, a culpa não foi da liderança nacional. 

Mas a liderança nacional quis saber? Não se deu demasiada autonomia para o fracasso?

Se a liderança se tivesse metido, não respeitava a autonomia das estruturas e era ingerência da sede nacional na escolha dos candidatos. Como não se meteu, dizem que a culpa é dele porque não travou os erros. Não é uma discussão que faça sentido agora. 

A sua neutralidade na sucessão a Passos derivou da sua admiração por ele?

(pausa) Eu tomei a minha opção. Não votei em branco nas eleições diretas de 13 de janeiro. 

Votou em Pedro Santana Lopes.

Votei. 

Porque era o mais respeitador do legado de Passos?

Talvez. Mas nenhuma das duas campanhas me motivou a participar ativamente. 

E a liderança atual continua a não motivá-la?

A liderança atual começou agora. 

A Margarida falou na necessidade de reinventar o partido. Atualmente, os ministros-sombra de Rui Rio têm uma média de 65 anos e nenhuma mulher foi até agora convidada. 

Os nomes ainda não estão todos confirmados. Eu acredito que haverá da parte da liderança de Rui Rio a noção de que tem de haver um rejuvenescimento do partido. Hoje temos dois secretários-gerais adjuntos bastante jovens, um deles saiu até há bem pouco tempo da JSD (Bruno Coimbra). Na direção parlamentar, a Rubina [Berardo] é jovem, o António [Leitão Amaro] é jovem… 

É próxima do homem que era secretário-geral da JSD há dez anos [Leitão Amaro], do homem que foi presidente da JSD depois dessa liderança [Duarte Marques] e também dos dois que vieram a seguir [Hugo Soares e Simão Ribeiro]. Até que ponto é que a sua liderança não será uma liderança herdada? 

Eu provei diariamente em todo o meu percurso na JSD que a única lógica que conheço é a lógica do trabalho e da competência. Esse trabalho faz-me crer que farei um trabalho melhor. É por isso que me candidato. Não tem a ver com amizades ou políticas. Tem a ver com convicções. Não tem a ver com passado. Tem a ver com a visão que tenho para o futuro da Juventude Social Democrata.

A última vez que falámos foi em Pedrógão Grande, no seu distrito. Em outubro, a tragédia foi no seu concelho. Os incêndios mudaram-na como pessoa e como política?

Naquele momento, quando começou, o facto de eu ser de lá e ter feito grande parte da minha vida em Leiria fez com que muitos amigos fossem diretamente afetados pelos incêndios. Misturou-se a noção de deputada com a noção da ‘Margarida’. As pessoas conheciam-me. Quando, acho que foi no dia em que falámos, alguém perguntou se havia um carro para ir buscar mantimentos para os bombeiros, quem foi não era a deputada, era a Margarida. Foi por isso que foi tão difícil. 

Quando a acusaram de aproveitamento político o que sentiu?

Revolta.

Porquê?

Porque eu estava a dizer o que as pessoas que sentiram aquilo na pele me diziam. Pessoas que perderam a casa, a família. Eu não vi o que aconteceu em Pedrógão na televisão. Eu estava lá. Sei o que aquelas pessoas sentiram e a minha obrigação era levar isso para o Parlamento. Ser a voz dessas pessoas.