O comboio da festa…

Há cerca de dois anos, o PS vivia «uma situação financeira complexa», admitida pelos seus próprios dirigentes, enquanto o JN publicava, em título de primeira página, que o partido encerrara as contas de 2015 «com um passivo de 21,7 milhões de euros», constando, sem desmentido, que «as despesas correntes de certas federações e concelhias estão…

Há cerca de dois anos, o PS vivia «uma situação financeira complexa», admitida pelos seus próprios dirigentes, enquanto o JN publicava, em título de primeira página, que o partido encerrara as contas de 2015 «com um passivo de 21,7 milhões de euros», constando, sem desmentido, que «as despesas correntes de certas federações e concelhias estão a ser pagas pelos dirigentes locais».

Bastaram dois anos ao PS, após a reinstalação no poder com a ajuda da ‘geringonça’, para se libertar de tamanha penúria e respirar o suficiente desafogo para fretar um comboio especial – destinado ao transporte de umas centenas de fiéis para servirem de figurantes na Festa de Verão em Caminha.

Em contrapartida, o sufoco transferiu-se para o PSD, a ponto de a tradicional Festa do Pontal ter sido reduzida aos mínimos, por opção de Rui Rio – que tem dado de si, aliás, uma imagem de aplicada ‘poupança’ na palavra… Sumiu-se em agosto, apesar de tudo que aconteceu, desde os incêndios de Monchique à rutura na CP ou ao caos no Aeroporto da Portela. As férias são sagradas, como tem ensinado António Costa…

 

Pela folgança exibida pelo PS em pré-campanha, percebe-se que se perdeu na ‘bruma do tempo’ o apelo aflito de «solidariedade» aos militantes, para abrirem os cordões à bolsa. O poder compensa.

Por contraste, o PSD corre o risco de afundar-se numa completa irrelevância. A menos que seja ainda capaz de desembaraçar-se da inexistência de Rio, que se ‘especializou’ em não incomodar o Governo. Uma originalidade na oposição.

Ao contrário de Assunção Cristas, que interrompeu as férias para não ficar a ver os comboios passar, Rio nem sequer reagiu à extraordinária ‘carta impressa’ da Infraestruturas de Portugal, na qual se anunciava textualmente que «o operador CP aceita os atrasos resultantes a outros comboios», para a caravana socialista, a caminho da festa, não ter estorvos e cumprir o horário previsto. 

E cumpriu ao minuto, quando os atrasos e os cancelamentos de comboios são ‘o pão posso de cada dia’. 

 

É verdade que o recurso a comboios fretados não foi inédito. É um «serviço comercial normal», como pressurosamente adiantou António Costa, escamoteando, no entanto, que outros clientes não costumam ser beneficiários da prioridade de circulação. Ou seja, tratou-se literalmente de um ‘frete’ prestado ao PS.

Sucede que esta jornada ferroviária de propaganda coincidiu com delicados problemas financeiros da CP, apesar dos sucessivos aumentos de capital (cerca de 500 milhões de euros no ano passado, mais 54,9 milhões anunciados para este ano). Um poço sem fundo.

O desinvestimento na ferrovia não começou, porém, com o atual Governo. Tem-se assistido ao progressivo abandono do transporte de comboio, favorecendo a expansão rodoviária, com o fecho de numerosas estações, enquanto a eletrificação e a modernização dos traçados avançam a passo de caracol. 

Mas cabe aos governos socialistas uma particular responsabilidade nesse divórcio, agravada pelos delírios de José Sócrates, ao lançar o projeto do TGV, cuja fatura será suportada pelos contribuintes, quando houver um desfecho para o atual imbróglio jurídico.   

Note-se a propósito que, em abril deste ano, o consórcio vencedor do troço de alta velocidade Poceirão-Caia avançou com uma ação de execução do Estado no valor de 192 milhões de euros, depois de esperar em vão pelo pagamento da indemnização fixada pelo Tribunal Arbitral. Como é hábito, ‘empurra-se com a barriga’.

Os utentes regulares da CP, que sofrem tratos de polé com a degradação das composições e o mau serviço prestado, têm direito a sentir-se ofendidos com este ‘comboio especial socialista’, tão rodeado de atenções.

 

Se a CP está a precisar de ‘cuidados intensivos’, o caos instalado no Aeroporto da Portela é o outro retrato da falta de planificação de infraestruturas, mesmo quando está em causa o turismo, um dos motores da nossa economia. 

Temos mesmo um ministro da tutela que sugeriu, sem se rir, o ‘elefante branco’ de Beja como alternativa à saturação da Portela. Patético.

Graças a essa incapacidade de programar com um módico de rasgo, o Aeroporto de Lisboa está classificado nos últimos lugares do ranking internacional (entre 1.200 analisados por uma consultora especializada) como um dos piores do mundo em pontualidade e cancelamento de voos (pontuado com uma estrela em cinco), alinhando com os congéneres que são os ‘lanternas vermelhas’ da lista, como Bombaim, Tunis ou Islamabad. É obra!

Para não destoar, a (revertida) TAP e a (pública) SATA figuram entre as piores companhias do mundo em pontualidade – e são as únicas transportadoras aéreas europeias nessa lista. O ‘país das maravilhas’, como glosaria Assunção Cristas, está neste estado.