Nascida do segundo casamento de Rómulo de Carvalho (com a arquivista e também escritora Natália Nunes), Cristina Carvalho tem perto de vinte livros publicados, entre os quais uma biografia do pai, Rómulo de Carvalho/ António Gedeão_– Príncipe Perfeito (ed. Estampa).
À conversa na sala de estar de sua casa, ajuda-nos a desvendar a personalidade complexa daquele que considera «um homem insólito». Conta-nos que o pai cultivava o silêncio, nunca foi à praia, só se sentava para comer e escreveu toda a sua obra, em pé, virado para uma parede.
Normalmente associamos a poesia à juventude, no entanto o seu pai publicou o primeiro livro muito tarde.
O primeiro livro [Movimento Perpétuo, 1956] saiu quando ele tinha cinquenta anos.
Foi um poeta tardio?
Ele escrevia poesia desde os seis anos. Em 2012 publiquei um pequeno livro sobre ele, uma espécie de biografia, que começa precisamente com esse poema que ele escreveu quando tinha seis anos. [Começa a ler:] Era uma vez um menino/que não era nada feio. /O que tinha de extraordinário/ era um feitiço no meio.
Logo em pequeno ele era dotado?
Com nove, dez anos, escreveu um canto inteiro dos Lusíadas. Como todas as pessoas que têm veia artística para seja o que for, em pequeno nota-se logo. Essas tendências – seja a música, seja a escrita, seja a pintura – revelam-se logo na primeira infância. E depois ou se aprofunda e se desenvolve ou não.
Tem ali um livro chamado As Origens de Portugal, que o seu pai escreveu para ensinar a História de Portugal ao seu irmão, não é verdade?
Sim, ao Frederico.
Ele empenhava-se na educação dos filhos?
Sempre muito discretamente. Há um exemplo que costumo dar. Eu nasci cá, em 1949, e quando eu tinha três meses, em fevereiro de 50, fomos para Coimbra porque o meu pai foi colocado no liceu D. João III. Em 57 voltámos para Lisboa porque ele foi para o Pedro Nunes. Nesses anos 50 e 60, na cultura era tudo em francês. Mas com sete anos os meus pais puseram-me uma professora de inglês. Ninguém, ninguém aprendia inglês, era uma coisa que não existia. E eles contrataram uma senhora – primeiro uma polaca e depois uma americana – que ia lá a casa dar-me a aula.
Sendo ele professor, não a ajudava nos estudos?
Nunca, nunca, nunca. Jamais! [risos] À distância a gente ri-se, mas eu tive explicadoras de matemática e de física. Ele era incapaz. Devia ser um bloqueio qualquer, pois se ele foi professor de miúdos durante 40 anos, não podia dar aulas a mim? Mas nunca deu. Perguntou-me se eles orientavam a educação. Em janeiro faziam-me uma lista dos livros que eu devia ler naquele ano. De cada livro tinha de fazer um resumo e não podia fazer perguntas nenhumas. Se tinha uma dúvida, ia ao dicionário.
Isso não era demasiado rigoroso?
Parece que era, mas não, era muito giro. A verdade é que sempre fiz o que quis. Vivíamos em Campo de Ourique e havia um espaço muito protegido, com uns quintais. Eu tinha um grupo de amigos e brincávamos imenso na rua. Depois havia aquelas horas que tinha de cumprir – e cumpria alegremente, não me chateava nada. Fazia um resumo do que lia, escrevia tudo num caderno. Depois escolhia as melhores frases e os melhores pensamentos, escrevia-os numa cartolina branca, recortava e prendia com uma mola numa corda, de uma ponta à outra da quarto.
Que tipo de livros lhe davam?
Todos os clássicos que havia na altura eu tinha-os, e ainda tenho. Desde o Moby Dick até às Mulherzinhas, muitos em francês, muitos em inglês, que eu comecei a ler em francês e inglês muito cedo. A Cabana do Pai Tomás, A Ilha do Tesouro… Eu adorava A Ilha do Tesouro. E o Moby Dick, achava aquilo o máximo.
Mas o Moby Dick tem partes aborrecidas para uma criança.
Tem, mas eu gostava. E também gostava muito de livros de terror – tipo o Drácula. Li o Fausto com dez anos. E outro livro de que eu gostava imenso era um de Anatomia Humana, com figuras de homens e mulheres por dentro.
Os seus pais tinham uma boa biblioteca?
Tinham.
O que aconteceu?
A minha mãe morreu vai fazer agora um ano em fevereiro. A profissão dela era bibliotecária arquivista – trabalhou na Torre do Tombo muitos anos e depois foi para as Belas Artes. Mas escreveu mais de vinte romances. Foi uma grande escritora, ensaísta, tradutora, traduziu todo o Tólstoi e Dostoievski, que não havia cá, para uma editorial brasileira. Foi uma figura pouco destacada – talvez porque a figura do meu pai a abafasse – mas era uma intelectual à séria, como se diz agora. Aqueles dois seres humanos, com 15 anos de diferença, lá viveram juntos 57 anos. Eu nasci daquele casamento, fui a filha única da minha mãe, do meu pai fui a segunda. O Frederico foi filho de um casamento que durou muito pouco tempo, por razões que desconheço, mas posso imaginar… Não interessa. Divorciaram-se e quando os meus pais começaram a namorar a minha mãe tinha 24 anos. Casaram-se quatro anos depois, o meu pai, um homem já quase com 40 anos e com um filho. Hoje é tudo claríssimo e facílimo, na altura não era. Mas os meus avós eram pessoas abertíssimas e aceitaram perfeitamente.
O seu pai era uma pessoa fácil?
Não, não era uma pessoa nada fácil. Era uma pessoa introvertida, bastante silenciosa. Uma coisa que nunca vi o meu fazer – mas nunca – foi rir-se, dar uma gargalhada. Sorria, mas um sorriso sem dentes, só com os lábios. Era uma pessoa pesada, amargurada, sentia-se ali o peso da humanidade.
E com os filhos não assumia uma postura mais leve?
Com o meu irmão não sei dizer, mas comigo não.
Não fazia brincadeiras, piadas, coisas desse género?
Hmmmm… Não. Mas quando eu tinha dois anos e meio, três anos, a minha mãe foi fazer um doutoramento e esteve três meses em Paris. E o meu pai ficou a tratar de mim. Mais tarde, já eu era adolescente, com 13, 14, 15, 16 anos, ia com ele para a Curia, porque ele tinha pedra no rim e tinha de ir fazer os tratamentos – e a minha mãe odiava a Curia, achava aquilo uma chatice. Passámos dois meses inteiros só os dois, e tenho as melhores recordações.
Aí ele era diferente de quando estava em casa?
Era mais solto. Falávamos imenso, passeávamos, caminhávamos, fazíamos concursos de histórias. Mas era tudo nesta base das literaturas, não saíamos muito daí. E depois no verão, uma vez por ano, iam viajar quinze dias.
Em Portugal ou no estrangeiro?
No estrangeiro. Em Portugal também correram tudo, de Norte a Sul, mas guardavam sempre uns dias para o estrangeiro – Europa. Havia uma coisa: praias nem pensar! O meu pai nunca pôs um pé na areia. Gostava era de florestas. Eles não eram ricos nem coisa que se parecesse, eram pessoas que viviam dos seus ordenados. Depois o meu pai começou a ganhar bastante mais dinheiro com aquela história dos livros únicos. Mas com os livros escolares, científicos, nada da poesia. Aliás muitas editoras lhe ficaram a dever edições completas – e isso era uma amargura enorme que ele tinha. Não pelo dinheiro, mas pela desonestidade. Penso muitas vezes no que ele sentiria hoje com o que se passa, intelectualmente falando. Se já vivia amargurado naquela altura, hoje devia viver muitíssimo amargurado.
Mas a poesia dele não me parece transmitir essa amargura.
Não?
Pelo contrário, parece-me muito luminosa.
Mas tinha. Essa amargura era o traço mais evidente da sua personalidade. Era um peso enorme. Não andava acabrunhado nem marreco, mas via-se.
E isso não criava um ambiente pesado em casa?
Não, não não. Era uma casa com três pessoas – uma miúda e duas criaturas que viviam para a escrita. Quando chegou a altura de eu ter um gira-discos e ouvir discos foi uma coisa horrível para eles.
Por causa do barulho?
Claro. Se eu fazia anos e reunia um grupo de amigos em casa o meu pai desaparecia e só voltava no dia seguinte. Não suportava aquilo. A casa era grande, um andar em Campo de Ourique, ele podia-se recolher, mas não, saía. Aquelas reuniões de jovens, com 16, 17 anos, para ele eram uma tortura.
Ele não gostava de música?
Trabalhava com música. Ligava a telefonia, muito baixinho, muito baixinho, na Antena 2. Uma música miserável. Tenho aquilo gravado na minha cabeça – aquela música pingava, o dia inteiro. Ele nem devia ouvir. E era assim. Tudo o que fosse mais fora, ele não aguentava. Nesse aspeto eu saio mais à minha mãe, que era uma pessoa muito alegre e extrovertida. Ele não era ríspido, nem rígido, nem austero. Não. Era uma figura… aquilo era sempre tudo igual. Às onze horas da noite em ponto carregava no botão do candeeirinho e ia para o quarto. No dia seguinte, às oito da manhã em ponto levantava-se, ia para a casa de banho e estava lá um quarto de hora em ponto.
Era tudo cronometrado?
Mas ele fazia isso de uma forma natural. E era incapaz de sair da casa de banho sem a limpar ele próprio, embora tivéssemos uma criada. Servia-se da casa de banho e deixava-a impecável. Até cosia as suas roupas, se caía um botão ele cosia, fazia bainhas. Vou dar outro exemplo:_comprava um sobretudo, mas não tinha bolsos interiores. Ele comprava um bocado de tecido, recortava e cosia aquilo tudo. Coisas deste género, insólitas. Era uma pessoa insólita.
Em termos de afeto, também era muito contido?
Demonstrações de afeto – beijos à minha mãe ou assim – nunca vi.
E a si?
A mim sim, fazia-me festas. Sobre isso deixe-me contar-lhe uma coisa do tremor de terra de 1969. Foi no dia 19 de fevereiro, por volta das duas da manhã. Um tremor de terra é uma coisa de que a pessoa nunca mais se esquece – um susto horrível, uma sensação de impotência, de mortalidade imediata. Os nossos quartos eram ao lado um do outro e eu, em pânico, fui-me meter na cama deles, e fiquei entre os dois. Aquilo ainda durou um bocado. Caiu tudo, caíram os livros das estantes, e ouvia-se muita gritaria pelo prédio, mas lá em casa estava um silêncio total. Os meus pais tinham um sofá ao fundo do quarto, ao pé da janela. Ao fim de aquilo tudo parar de tremer, ele levantou-se, sentou-se no sofá, e só disse isto: ‘Chiça!’. A exclamação de pânico ficou por aqui. [risos] Só para lhe demonstrar o tipo de pessoa que era. Não havia exaltação visível. Mas tenho aqui muita coisa. Mas era afetuoso, pelo menos comigo, e adorava os netos. Os meus filhos passavam lá muitos fins de semana e ele fazia coisas muito giras. Nós temos uma casa ao pé da Ericeira, onde passamos entre maio e outubro. Ele gostava imenso de ir para lá e havia um ritual, porque ele era uma pessoa de rituais. Jantávamos, íamos para uma sala e reuníamo-nos todos a uma mesa. Ele trazia uns objetos embrulhados em papel de jornal com uns cordéis, podiam ser um, dois, três ou quatro – dependia. Trazia aquilo, ainda embrulhado – isto dava um filme – punha em cima da mesa, tirava o cordelinho e lá de dentro aparecia aquilo que você possa imaginar. Uma bacia de barbeiro, por exemplo. Um missal. Uma caneta. Um leque. Uma fita de filme. São inúmeros os objetos que eu tenho lá guardados num armário.
Eram coisas que ele comprava?
Eram coisas da vida dele que ele queria oferecer-nos, e contava uma história enorme a propósito daquele objeto – o que era aquilo, de onde veio. Um dia, um dos objetos que ele trazia embrulhadinho caiu-lhe ao chão. Dentro do papel estava um ovo oco, pelo qual ele tinha uma estimação enorme. Um ovo já com a idade dele, que na altura tinha oitenta e tal anos. O ovo caiu e partiu-se, e ele ficou impressionadíssimo. E disse: ‘Eu já não duro muito’. E contou a história do ovo: tinha sido oferecido à mãe dele no dia em que ele nasceu. Ficou muito impressionado. E de facto não durou. Esta cena dos objetos dentro do jornal e com o cordelinho era uma coisa insólita. Ela era insólito, inesperado.
E supersticioso?
Nem pensar, era um homem de ciência.
Como disse isso do ovo achei que…
Tinha uma superstiçãozinha com algumas coisas. Essa do ovo foi um sinal. E houve outra vez, em que ele fez anos – ele fazia anos a 24 de novembro –, fizemos um almoço e éramos 13. Tivemos de desencantar um miúdo da aldeia.
Para não serem 13 à mesa?
Havia coisinhas escondidas. A gente sabe histórias de cientistas cheios de superstições, não era o único. Outra pequeniiina superstição dele era que no aniversário dele tínhamos todos de beber por um copinho que ele estimava imenso. Ele gostava de beber vinho às refeições. Depois teve o cálculo no rim e deixou de beber.
Sendo o seu pai um homem da ciência, como aprendeu a escrever tão bem?
Ele lia imenso. Era uma pessoa interessada em tudo o que o rodeava, era uma pessoa culta que hoje há pouco. E realmente escrevia muito, muito bem. Não só a poesia, mas a prosa é magnífica. Tem contos extraordinários. A parte literária para mim é fundamental porque revela muito do espírito das pessoas. Agora, conheço alguns poetas atuais, com quem falo e de quem sou amiga, que me dizem que ele é considerado no meio como um poeta menor.
Porque era um outsider?
Era um outsider e não dava confiança a ninguém. Não se dava, era impossível.
Acha que a obra poética do seu pai hoje não é devidamente valorizada?
Já vi coisas inacreditáveis em relação ao meu pai.
De que género?
Não sei como está agora, mas aqui há uns três ou quatro anos estive no edifício da DGLAB [Direção Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas]. Havia uma parede enorme num corredor com fotografias a preto e branco de todos os escritores – poetas incluídos. Dezenas! Do meu pai, nada. E disse: ‘Não está aqui António Gedeão por alguma razão?’. É um bocado delicado estar a dizer isto, mas a pessoa não gosta. De António Gedeão o que se conhece? Conhece-se a Calçada de Carriche, a Aurora Boreal, A Pedra Filosofal, a Fala do Homem Nascido…
A Lágrima de Preta…
A Lágrima de Preta – e não se conhece mais nada, mas há centenas de poemas. No ano passado, pelo Natal, o José Mário Silva lança um livro com os cem melhores poemas [Os Cem Melhores Poemas Portugueses dos Últimos Cem Anos]. Está no direito dele mencionar os poetas que quiser, e pode não gostar de nenhum do meu pai. Mas realmente a Pedra Filosofal, goste-se muito ou goste-se pouco, é um grande poema. E é um poema marcante do século XX por variadíssimas razões. Vou-lhe dizer uma coisa engraçada. Há muitos anúncios no jornal – por exemplo, de casas de putas ou de colchões – que dizem ‘O sonho comanda a vida’. Isto é verdade, tenho recortes do Correio da Manhã, onde fazem esses anúncios, com as fotografias das mulheres nuas, com os rabos para o ar, e ‘O Sonho comanda a vida’. É cómico mas é assim. Já tenho visto ‘o sonho comanda a vida’ nas situações mais caricatas do mundo. Isto só prova que é um poema popular e de que toda a gente gosta.
Ao mesmo tempo essa popularidade pode tê-lo feito cair em desgraça junto das pessoas mais intelectuais?
[Torce o nariz] Não sei… Isso das intelectualidades é uma coisa que não me diz nada. Poemas de poetas portugueses não há assim tantos muito conhecidos como alguns do meu pai. E as pessoas não devem achar muita graça a isso. Devem achar que é popularucho.
E o seu pai, como encarava essa popularidade?
Achava natural. Desde que o poema foi apresentado no Zip-Zip em 1969, foi um êxito muito grande em Portugal e o meu pai passou a ficar conhecido. Ele lidava perfeitamente com isso. Era muito, muito discreto, uma pessoa bastante silenciosa, não comentava muito. E, quando comentava, comentava ironicamente. A ironia, mas uma ironia muito inteligente – e oportuna – estava presente no dia-a-dia dele em tudo. Ele atacava as pessoas todas de uma maneira espantosa. Como é que ele lidava com a popularidade? ‘Tenho de pedir desculpas por ter escrito a Pedra Filosofal’. Não lidava mal com isso, nem mal nem bem. Achava natural.
O seu pai escrevia à vossa frente ou tinha de estar recatado?
À nossa frente. O meu pai escrevia num armário, que é um objeto que eu tenho ali noutra divisão. Estava no chamado escritório, uma sala grande ao fundo da casa, todo recoberto a estantes com livros. Ele era muito jeitoso de mãos, ele próprio fazia os bolsos, como disse, e também fazia estantes e gavetas. Era muito habilidoso, consertava tudo e mais alguma coisa.
E esse armário, como era?
Ele nunca se sentava, só se sentava para comer. De resto andava sempre em pé. Então mandou construir um armário, há muitos, muitos anos, que nós designávamos por ‘o armário’, que estava encostado à parede. E ele escrevia tudo e mais alguma coisa, e fazia as correções dos testes, no armário. Virado para uma parede. Por cima do armário existia uma moldura grande com aquela fotografia do Einstein com a língua de fora.
Sempre virado para a parede?
Virado para a parede, trabalhava ali sem qualquer horizonte. Ele que foi criado na janela e na varanda da casa onde nasceu, num quarto andar. Toda a infância dele foi ali, o que ele mais adorava era aquele quarto andar e a vista para o Tejo. Não passava sem a vista para os telhados e para o rio. Faz um bocado de confusão como é que trabalhou a vida toda virado para uma parede.
Nesse escritório também tinha instrumentos de química?
Em casa não. O que fazia também era desenhar. Lembra-se daquela coleção – hoje só nos alfarrabistas – que era Ciência para o Povo? Lembro-me de ele desenhar aquelas capinhas todas, foi tudo feito por ele. Depois assinava uma revista, que era a Life. Ele não sabia inglês, mas a revista aparecia lá.
Era para quê, para ver as fotografias?
Também não sei para que era. Dos jornais, o que ele comprava todos os dias era o Diário de Notícias. Havia uma banda desenhada com três quadradinhos a preto e branco que era o Reizinho, e ele recortava aquilo religiosamente. Outra coisa que ele fazia era palavras cruzadas. Tinha centenas de recortes de palavras cruzadas, fez até morrer, e dizia que as pessoas deviam fazer palavras cruzadas. E ensinou-me a fazer, era eu muito pequena, tinha eu oito, nove, dez anos.
De resto, imagino que nas aulas fosse mais comunicativo do que em casa… Alguma vez conversou com alunos dele?
Sou amiga do Nuno Crato, e não sou amiga mas conheço e já falei algumas vezes com o Marcelo Rebelo de Sousa, que ele considerava o melhor aluno. E dizia isso em conversas imensas vezes: ‘Foi o melhor aluno que tive em 40 anos. Uma cabeça absolutamente brilhante’.
Mas o que dizem os antigos alunos do seu pai?
Eles adoram o meu pai. Acham que é uma pessoa extraterrestre. E que era absolutamente rigoroso, não podia falhar nada. Não havia cá distúrbios, nem graças nem nada. Ele preparava as aulas todas ao milímetro e batia tudo certo.