47 homens arriscam década na prisão por homossexualidade

Na Nigéria, um país onde 90% da população concorda com a ilegalização da homossexualidade, a lei é utilizada para extorsão e abusos pelas autoridades.

Não culpados, declararam-se esta quarta-feira 47 homens, detidos numa rusga a um hotel na Nigéria, em 2018. O crime de que são acusados? Demonstração pública de afeto com pessoas do mesmo sexo: algo punível com até dez anos de prisão na Nigéria. Num país conservador, onde muitos vêm a homossexualidade como uma exportação ocidental, as autoridades acusaram os 47 homens de estarem a ser “iniciados” num clube gay – era uma festa de aniversário, garantiram os arguidos.

“A polícia simplesmente irrompeu pelo hotel e começou a prender pessoas”, contou na altura aos jornalistas Wealth Olasunkanmi, um dos 57 homens detidos na rusga – dez não compareceram em tribunal. Os que o fizeram esconderam o rosto das câmaras e ficaram sob uma fiança de 500 mil nairas (cerca de 1250 euros), avançou a Reuters. Defendem que a sua detenção foi uma tentativa de extorsão, com recurso às leis anti-homossexualidade promulgadas em 2014 pelo então Presidente Goodluck Jonathan.

“A lei é tão vaga que provavelmente levará à prisão arbitrária de pessoas gay, enquanto facilita extorsão de grupos vulneráveis por membros das forças de segurança da Nigéria, notoriamente corruptas”, avisou nesse ano Graeme Reid, diretor para assuntos LGBT+ da Human Rights Watch. “Agentes da polícia param-te e prendem-te, depois extorquem-te dinheiro, chamam-te nomes”, contou à Reuters um dos arguidos, pouco antes da audiência.

“Se tens inclinações homossexuais, a Nigéria não é um sítio para ti”, escreveu este ano no Instagram a chefe da polícia de Lagos, Dolapo Badmos, acrescentando: “Sai do país ou enfrenta a perseguição”. A homossexualidade “é ilegal e profana”, concordava um dos muitos comentários de apoio à polícia.

Afinal, 90% da população da Nigéria defende a criminalização da homossexualidade, de acordo com uma sondagem da ONG nigeriana The Iniciative for Equal Rights (TIER). Um ódio alimentado por políticos conservadores – e criticado por ativistas e celebridades. “Ouvimos estes líderes africanos, vestidos de fato, com o seu iPhone, a falar inglês, e não a sua língua nativa, e a dizer: ‘Não é africano ser homossexual’. Não é verdade”, criticou recentemente o rapper nigeriano Jidenna, em entrevista à Sways’s Universe.

 

Linchados e queimados vivos Caso sejam condenados, os 47 arguidos serão os primeiros a ser presos devido às leis anti-homossexualidade. Mas o sistema judicial é apenas parte da violenta perseguição aos homossexuais na Nigéria, explicou num artigo de opinião para a CNN Richard Akuson, um nigeriano refugiado nos Estados Unidos por ser homossexual, fundador da revista A Nasty Boy.

Acusado de “espalhar a agenda gay”, Akuson foi emboscado por quatro homens na sua terra natal, Akwanga, no centro do país. “Forçaram-me a desbloquear o meu telemóvel para encontrarem provas da minha homossexualidade. Espetaram paus no meu ânus”, escreveu. “Mesmo este ataque terrível empalidece em comparação com a brutalidade fatal que muitos homens gay nigerianos enfrentam”, sendo “linchados ou enrolados em pneus e queimados vivos”, continua.