António Costa, o espectador que é árbitro

Então o homem que foi ministro da Justiça e que é primeiro-ministro há mais de quatro anos diz não compreender a morosidade dos tribunais? Mas o que fez ele para mudar essa lentidão? Deu mais meios à Procuradoria-Geral da República? Fez alterações à lei para agilizar os processos, acabando com as milhares de testemunhas, por…

Portugal é um país sui generis e o que está a acontecer este fim de semana é bem o espelho da nação. De uma situação de seca extrema passámos a uma de excesso de água nas barragens. Tudo muda de um dia para o outro em Portugal, mas há exceções. Na entrevista que deu ao Público, António Costa disse coisas extraordinárias e com uma candura sem vergonha.

Sem grande esforço de memória todos nos recordamos de um antigo Presidente que disse que «havia vida para além do défice». Também sem grande esforço nos lembramos do que disseram PS, PCP e BE sobre o mesmo assunto, mas agora o primeiro-ministro, na sua quinquagésima entrevista ao diário fundado por Vicente Jorge Silva, veio desmistificar toda essa teoria: «Não creio que seja de esquerda promover défices e aumento de dívida». Passos Coelho, se não fosse o drama pessoal por que passa, daria sonoras gargalhadas com esta afirmação de António Costa. O Governo de Passos foi achincalhado por tentar diminuir o défice para pagar a dívida do Estado e agora a esquerda tem as mesmas preocupações? 

Mas a que mais gostei diz respeito à Justiça: «Como é possível ainda ninguém ter sido julgado no caso BES e o senhor Madoff ter sido condenado em pouco tempo?». Porreiro, pá! Então o homem que foi ministro da Justiça e que é primeiro-ministro há mais de quatro anos diz não compreender a morosidade dos tribunais? Mas o que fez ele para mudar essa lentidão? Deu mais meios à Procuradoria-Geral da República? Fez alterações à lei para agilizar os processos, acabando com as milhares de testemunhas, por exemplo? Só mesmo António Costa para não ter vergonha de dizer o que lhe apetece.

Maria Flor Pedroso colocou o lugar de diretora de informação da RTP à disposição do Conselho de Administração e este não teve outra hipótese que não fosse aceitar a demissão. Mas até neste gesto de Flor Pedroso os seus amigos viram uma nobreza assinalável. A líder parlamentar do PS chegou mesmo a escrever: «Conheço a jornalista profissional e íntegra que nos habituou ao jornalismo independente e de rigor. Colocar o seu lugar à disposição, perante a campanha difamatória que a põe em causa como boa profissional, é bem o espelho da integridade de Maria Flor Pedroso!». 
Extraordinário!Uma pessoa que é acusada de boicotar uma reportagem, de adiar outra e de esconder uma terceira mostra «integridade» ao demitir-se? Não seria de Flor Pedroso desfazer, uma a uma, as acusações que recaem sobre a sua direção e sobre a sua pessoa? Isso sim, demonstraria caráter e profissionalismo. Até porque a antiga diretora da RTP sabe bem que conta com muitos amigos na comunicação social que se atravessaram pela sua honra sem terem tido a preocupação de saberem de que lado estava a razão.

Quando até um dos fundadores do PS e antigo vice-presidente da ERC, Arons de Carvalho, assume que programas como o Sexta às 9 não deviam existir no serviço público, percebemos o incómodo de tais investigações.
 
Já se percebeu que André Ventura tem muita facilidade em despistar-se quando os ventos lhe sopram de feição. Depois de ter sido advertido por Ferro Rodrigues, na famosa «vergonha», e de muitos o terem defendido, o líder do Chega coloca um enorme cartaz em frente à AR com a palavra VERGONHA para apanhar a boleia da vitimização. Não havia necessidade de jogar ao mesmo nível do presidente da AR.

vitor.rainho@sol.pt