Tribunal de Contas alerta para riscos na utilização de recursos públicos

O Tribunal de Contas considera necessário que todas as entidades que gerem dinheiros públicos estejam atentas aos riscos identificados.

A pandemia global de covid-19 foi “inesperada e sem precedentes na generalidade dos países, requerendo a adoção de medidas urgentes e excecionais para fazer face à situação epidemiológica e suas consequências”. O alerta foi dado pelo Tribunal de Contas (TdC) e diz que “além das ações necessárias à prevenção, contenção, mitigação e tratamento da pandemia, a gestão desta doença e das suas consequências tem impactos enormes em todas as áreas, em especial nos sistemas de saúde, no emprego, na economia e na proteção social, colocando grande pressão na ação dos governos e das entidades públicas”.

De acordo com a entidade liderada por Vítor Caldeira, “as estimativas desses impactos revestem-se ainda de grande incerteza”, mas alerta que “é certo que as medidas de política pública, dirigidas a cidadãos, serviços públicos, empresas e quaisquer entidades públicas e privadas, terão consequências significativas no plano das finanças públicas e respetiva sustentabilidade”. E dá como exemplo, o crédito colocado à disposição das empresas, em que a percentagem de pequenas e médias empresas (PMEs) abrangidas foi muito pequena (apenas 7%) – o crédito foi maioritariamente utilizado para fundo de maneio (87%), tendo o crédito disponibilizado para fins específicos tido um nível de execução residual e que as taxas de incumprimento contratual foram baixas, quando comparadas com empréstimos “normais” às empresas (apenas foram executadas 4,6% das contragarantias emitidas).

Face a esse cenário, o TdC alerta para um conjunto de riscos relevantes na gestão financeira de emergências, que devem ser considerados. “A preocupação predominante na reação a situações de emergência é a rápida resposta à crise e às necessidades das populações”, mas acrescenta, “a celeridade dessa resposta implica frequentemente a debilitação dos mecanismos de controlo e prestação de contas, implicando riscos acrescidos de desperdício, má gestão, irregularidades e corrupção, que pressionam os recursos públicos e prejudicam a eficácia da ação. Importa, assim, assegurar o equilíbrio entre a necessidade de responder de forma célere à crise e a salvaguarda dos princípios da transparência, integridade e responsabilidade inerentes à utilização dos recursos públicos”.

O relatório identifica riscos relacionados com: gestão da crise e das medidas de emergência; ajuda de emergência; concessão de auxílios públicos; enfraquecimento dos controlos, da integridade e responsabilidade, abrangendo a contratação pública; sistemas de informação; e transparência, no que respeita à mensuração dos custos e à prestação de contas. E, como tal, o TdC considera necessário que todas as entidades que gerem dinheiros públicos estejam atentas aos riscos identificados e que ponderem a aplicação de medidas que os previnam e mitiguem, designadamente no que respeita à clareza e coerência da legislação e regulamentação, à emissão de orientações para a implementação harmonizada das medidas, ao estabelecimento de mecanismos de monitorização, à definição e coordenação de responsabilidades e à prevenção da duplicação de apoios.

“Salienta-se também a importância de parametrizar adequadamente os sistemas de informação para implementação dos apoios, de reforçar os sistemas de segurança informática, de valorizar e salvaguardar a integridade dos agentes que intervêm nas ações de resposta a emergência e de garantir a transparência e publicidade dos processos e ações, designadamente quando estejam em causa apoios e contratos públicos ou doações”, refere o mesmo relatório.

O tribunal destaca ainda a necessidade de documentar e fundamentar os processos isentos de visto, mas com obrigatoriedade da sua remissão ao tribunal, substituindo os controlos prévios por verificações posteriores, acautelando que a seu tempo seja assegurado o escrutínio público e salvaguardadas responsabilidades. “Há que sublinhar ainda que só o registo desagregado das ações de implementação das medidas covid-19 possibilita o reporte, a responsabilidade e a prestação de contas pelos recursos utilizados e a avaliação do seu impacto em sede de finanças públicas e da respetiva sustentabilidade”, conclui.