Russos vão perder o luxo do Ocidente devido ao bloqueio ao SWIFT

Itália e França são alguns dos países penalizados por este embargo ao sistema de pagamentos. Mas não há dúvidas: “Será mais expectável que bens de luxo sejam mais penalizados que bens de necessidade básica”.

O mercado de luxo também já está a sentir os efeitos do bloqueio da Rússia ao sistema de pagamentos internacional SWIFT – serviço que permite que as instituições financeiras troquem de forma rápida e eficiente as mensagens eletrónicas necessárias para levar a cabo transferências bancárias ou ordens de pagamento. Um cenário que, de acordo com Mário Martins, membro do conselho de administração da corretora ActivTrades, levou a que Itália, numa primeira fase, a estar contra este bloqueio, prevendo “algum abrandamento das compras enquanto a situação se mantiver”. 

Recorde-se que Mario Draghi, primeiro-ministro italiano, terá feito pressão para os bens de luxo italianos ficarem de fora do pacote de controlo de exportações. A Bélgica terá feito o mesmo com os diamantes. No passado, as retaliações de Moscovo contra as sanções tiveram um impacto limitado na União Europeia, ou seja, afetaram mais os consumidores russos do que os exportadores europeus. 

Uma opinião partilhada pelo gestor do Banco BiG, Steven Santos ao lembrar que este segmento “é tipicamente sempre muito ativo, quer pelos russos que se deslocam às capitais europeias, quer por via de importação de bens de luxo”, chamando a atenção que face a isso, as ações de empresas, como as de Louis Vuitton terem estado a negociar em baixa no mercado bolsista. “Sem dúvida que alguns grandes grupos de luxo franceses estão a ser bastante pressionados com estas notícias”, diz ao nosso jornal. 

Ligeiramente mais otimista está Henrique Tomé, analista da XTB, ao afirmar que os clientes russos não são os que consomem mais artigos de luxos em que esse foco está essencialmente concentrados nos americanos, japoneses e chineses que representam grande parte do consumo mundial de artigos de luxo, ainda assim, reconhece que “as atuais limitações no mercado russo naturalmente prejudicam este nicho”, refere ao nosso jornal.

Já Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa chama a atenção para aquilo que já tinha sido defendido ao i pelos economistas João Duque e Luís Mira Amaral ao referir que o bloqueio não foi generalizado a todos os bancos russos e, como tal, entende, que não havendo bancos russos que não foram banidos do SWIFT poderão ser utilizados como plataforma para pagamentos e recebimentos internacionais. “O objetivo de quem impõe as sanções é penalizar a economia russa particularmente nos bens menos essenciais, e preservar o acesso aos bens de primeira necessidade. Sendo assim, será mais expectável que bens de luxo sejam mais penalizados que bens de necessidade básica”, salienta.

Saída de empresas A par das petrolíferas que já anunciaram, nos últimos dias a saída, da Rússia – é o caso da britânica BP que anunciou sair do capital da russa Rosneft, onde detinha uma participação de 19,75%, depois foi a norueguesa Equinor e da Shell que seguiu os mesmos passos – agora foi a vez da General Motors garantir que vai interromper todas as exportações para a Rússia, apesar de vender apenas cerca de três mil carros por ano, assim como a Harley-Davidson. Curiosamente uma das imagens icónicas de Vladimir Putin é em cima de uma mota desta marca. 

Mas as saídas não ficam por aqui. Também A Daimler Truck, maior fabricante de camiões do mundo, revelou que decidiu “deixar cair todas as atividades empresariais na Rússia”, apesar de o seu contrato com a fabricante russa Kamaz – que fabrica veículos para as forças armadas – limitar a cooperação à produção de veículos civis. 
Já a Volvo Vehicles, por seu turno, referiu que não irá expedir qualquer veículo para a Rússia. A decisão deveu-se aos “perigos potenciais relacionados com a compra e venda de material com a Rússia, bem como com as sanções impostas pela UE e pelos EUA”.

Também a Boeing fechou os seu escritórios em territórios russos e o grupo McDonald’s ainda está a avaliar a operação nos dois países, cujas receitas pesaram em cerca de 9%, no ano passado. 

E a China? As dúvidas continuam a recair em relação a qual será a posição da China e, até que ponto, esta aliança entre Xi e Putin poderá manter-se. Para já, a resposta de Pequim tem sido de cautela e neste campo os analistas contactados pelo i levantam algumas reservas. De acordo com Mário Martins “a China tem-se mantido à parte do conflito, pedindo inclusive à Rússia que suspenda a incursão militar, até porque a China sempre se mostrou defensora da integridade territorial dos países, para além de que mantém uma relação positiva com a Ucrânia, país que está dentro do projeto chinês Belt and Road”.

Já o economista sénior do Banco Carregosa, lembra que “se as dificuldades da Rússia em vender ou comprar ao ocidente são crescentes, devido às sanções económicas, é plausível que o país dos czares procure outros mercados”. 
Também Henrique Tomé admite que as pressões sobre a Rússia continuam e o cerco está cada vez mais apertado, “depois de várias multinacionais terem demonstrado estarem dispostas a assumirem prejuízos avultados a fim de terminarem com as suas relações económicas com várias empresas russas”. No entanto, lembra que a Rússia continua a fechar acordos com a China com o objetivo de conseguir mitigar parte das consequências que resultaram das recentes sanções severas por parte dos líderes ocidentais.

Mais reticente está o gestor do Banco BiG ao garantir que é sempre muito difícil definir qual vai ser a posição da China. “Havia a expectativa de se poder aliar e ser um tubo de escape, uma espécie de alternativa para a economia russa não parar”, ainda assim, reconhece que “as declarações públicas da China vão no sentido de censura ou de excluir a Rússia”, defendendo que estão a querer ser cautelosos porque sabem que têm um papel muito mais relevante internacionalmente do que tinham há uns anos. “Não querem assumir um eixo com a Rússia contra o resto do Ocidente. A China está a levar o tema com bastante calma, com foco a longo prazo, mas acho que não exclui nenhum cenário e não descarta ser uma via respiratória para a economia russa”. E vai mais longe: “É uma oportunidade espetacular para comprar matérias-primas a custos baixos, caso haja mais dificuldades na compra de gás e de petróleo ou cereais russos e acredito que os chineses irão ver isso com muito bons olhos, já que são o principal importador de commodities a nível mundial”.