Liderança no feminino: mulheres são cada vez mais em cargos de topo

No rescaldo do Dia Internacional da Mulher – e sabendo que há ainda um longo caminho a percorrer no que diz respeito à igualdade de género – relembramos 12 mulheres que dão cartas em várias áreas em Portugal e no Mundo e cuja liderança não passa despercebida.

Por Daniela Soares Ferreira e Sónia Peres Pinto

Paula Amorim 
CEO do Grupo Amorim

Aos 51 anos, Paula Amorim é dona de um grande império. Mas para chegar até aqui, a CEO do grupo Amorim – conhecido pela cortiça mas que passa por muitas outras áreas – começou a trabalhar bem cedo, aos 19 anos. Não concluiu os estudos em gestão imobiliária e começou logo a trabalhar no grupo Américo Amorim. Em 2005 surgiu o seu primeiro negócio, quando comprou a Fashion Clinic «sozinha e sem o respaldo financeiro do grupo familiar». Desde então, foi sempre a crescer, mas a reserva que lhe é conhecida não permite saber muito sobre a vida desta poderosa empresária. Entre os vários cargos que tem em empresas de diversas áreas, Paula Amorim é a presidente da Amorim Investimentos e Participações, SGPS, SA, que integra a Corticeira Amorim. A empresária é ainda presidente da Galp. Mas conta com cargos de destaque na Amorim Holding II, SGPS, SA e na Tom Ford International. Em conjunto com o CEO da Farfetch, José Neves, é um dos membros do conselho de administração da PLATFORME, a plataforma de costumização de luxo para as grandes marcas. Em 2017 e em parceria com Miguel Guedes de Sousa – o marido –, inaugurou o JNcQUOI Avenida e, um ano mais tarde, o Ásia. Além destes negócios, em consórcio com o francês Claude Berda, tornou-se a nova dona da Herdade da Comporta.

Cláudia Azevedo 
CEO do Grupo Sonae

A filha mais nova do clã Azevedo assumiu a liderança de um verdadeiro império e tem vindo a dar cartas durante o seu percurso. A explicação é simples: soube fazer a ponte entre o mundo novo e pouco convencional da tecnologia, numa organização conservadora, como é a Sonae.

Quem a conhece bem descreve-a como tendo um perfil duro, obstinado, semelhante ao do pai, sendo discreta nas aparições públicas. O pai chegou a admitir que era a que tinha «mais killer instinct». É certo que as aptidões começaram a ser conhecidas na adolescência. O ensino secundário foi feito no Reino Unido, num colégio interno. Voltou à cidade natal no início dos anos 90, para entrar na Licenciatura em Gestão na Universidade Católica do Porto. Mas a formação só ficaria completa quando concluiu um MBA no INSEAD, conhecida escola francesa de formação de executivos.
Na última apresentação de resultados do grupo foi perentória: «Todos os dias procuramos dar o nosso melhor, ir mais longe e impactar positivamente a vida das pessoas e o planeta. Perante novos desafios, colaboramos para chegar mais longe», garantindo que o futuro que a Sonae está a construir é «vibrante, sustentável e inclusivo».

Isabel Camarinha 
Líder da CGTP

Isabel Camarinha tinha o desafio de substituir Arménio Carlos à frente da central sindical  – onde permaneceu no cargo durante 12 anos – mas tem vindo a dar cartas na liderança da CGTP. Foi a primeira vez que uma mulher chegou ao mais alto cargo de uma central sindical.

Militante do PCP, chegou a integrar as listas de candidatos da CDU a várias eleições, sempre em lugares não elegíveis. Foi também presidente da CESP, altura em que ficou conhecida por batalhar em defesa de melhores condições salariais e de trabalho nas grandes superfícies. A criação de um contrato coletivo de trabalho e o encerramento do comércio aos domingos e feriados foram algumas das suas batalhas. E os desafios da nova liderança não têm sido poucos. Assumiu as rédeas da central sindical em pandemia. «Uma situação que nenhum de nós estava preparado para enfrentar. Nessa altura, foram aprovadas as grandes prioridades para a ação sindical, mas a pandemia e as medidas sanitárias que foram implementadas causaram enormes consequências do ponto vista económico e social, acentuaram-se muito as desigualdades e toda a caracterização que tínhamos feito», disse numa entrevista ao i.

Isabel Mota 
Presidente do conselho de administração da Fundação Calouste Gulbenkian

Está ao comando da Fundação Calouste Gulbenkian, a maior fundação filantrópica portuguesa e uma das maiores do mundo desde 2017, e é considerada uma das mulheres mais poderosas de Portugal. É a primeira mulher no cargo, ao qual subiu depois de ter sido membro do Conselho de Administração da Fundação entre 1999 e 2017. Mas, quando chegou à liderança, afirmou saber que estava a romper a «tradição coimbrã da Faculdade de Direito» naquele cargo: «Sou mulher, economista e de Lisboa – mas julgo que é mais uma prova da extraordinária capacidade de adaptação e evolução da Fundação», chegou a dizer.

E antes de chegar à Gulbenkian, Isabel Mota foi presença ativa na política, tendo integrado os dois governos de maioria absoluta de Aníbal Cavaco Silva como secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional, assumindo responsabilidades nas negociações com a União Europeia dos fundos estruturais e de coesão para Portugal, entre 1987 e 1995.

No ano passado foi condecorada pelo Estado francês com as insígnias de Cavaleiro da Ordem da Legião de Honra da República Francesa, pelo seu compromisso pessoal ao serviço do bem comum e do desenvolvimento da cultura em Portugal.

Margarida Matos Rosa 
Presidente da Autoridade da Concorrência

Margarida Matos Rosa vai ganhando cada vez mais terreno no mercado nacional. É o rosto responsável pelas multas aplicadas nos mais variados setores, desde os hipermercados, passando pela banca, a partir do momento em que assumiu a liderança da Autoridade da Concorrência, em 2016. Diz ser «exigente com a qualidade das investigações», que no seu entender, devem ser «objetivas e isentas, de forma a avançar com toda a segurança». Um dos seus lemas é «Para a frente é o caminho», uma frase roubada ao avô materno. 

Nasceu em Lisboa – cresceu em Benfica – e mudou-se para Bruxelas aos 14 anos. Estudou na Escola Europeia, depois na Universidade de Louvain, onde se formou em Ciências Económicas. Estagiou na Comissão Europeia e defendeu tese de mestrado na Princeton (MPA). Antes de chegar à AdC, Margarida Matos Rosa dirigiu o Departamento de Supervisão da Gestão do Investimento Coletivo na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários. Entre 2009 e 2011 tinha sido assessora do Conselho na mesma entidade para questões regulatórias e de supervisão nos mercados financeiros europeus e internacionais. 

Nazaré Costa Cabral
Presidente do Conselho de Finanças Públicas

A disciplina financeira é um «espelho» da robustez económica e da estabilidade social de um país e permite aos governos terem «a margem necessária de concretização das políticas públicas para as quais foram mandatados pelos cidadãos». Este é um dos lemas da presidente do Conselho das Finanças Públicas que tem como função ser ‘polícia’ do cumprimento das regras orçamentais em Portugal e da sustentabilidade das finanças públicas. 

Nazaré Costa concluiu em 1994 a licenciatura em Direito, terminou o mestrado em Ciências Jurídico-Comunitárias, na mesma instituição, onde também fez o doutoramento em Direito, na variante de Ciências Jurídico-Económicas, que terminou em 2007. Fez ainda a licenciatura em Economia, na Nova School of Business & Economics, que concluiu em 2015. Professora e autora de vários livros complementam o seu currículo.

Recentemente garantiu que o país deveria preocupar-se com a «solidez e estabilidade salarial» e em «garantir que os trabalhadores possam contar com um salário», vendo com maus olhos a «multiplicação de apoios sociais com caráter não contributivo». 

Ursula Von Der Leyen
Presidente da Comissão Europeia

É belga, formada em medicina e mãe de sete filhos. Poliglota e ainda pró-europeia, algo que deve muito ao pai, Ernst Albrecht, que entre 1976 e 1990 foi ministro-presidente da Baixa Saxónia e alto funcionário da Comunidade Económica Europeia. Além de tudo isto, Ursula Von der Leyen é a primeira mulher à frente da Comissão Europeia. Estudou economia em Londres e não gostou, tendo depois voltado os interesses para a medicina. Era aliada de Angela Merkel e esteve em três ministérios alemães: Família, Saúde e Defesa – cargo que também foi a primeira a chefiar –, tendo deixado este último para presidir à Comissão Europeia. Mas antes disso, morou (1992-1996) nos Estados Unidos numa altura em que o marido, Heiko von der Leyen, fazia parte do corpo docente da Universidade de Stanford. Após o regresso à Alemanha, foi membro do corpo docente no departamento de epidemiologia, medicina social e pesquisa de sistemas de saúde do MHH. Além disso, fez um mestrado em saúde pública. A sua escolha para os comandos da Comissão Europeia não foi consensual e a sua popularidade também não era elevada. Como mulher, prometeu uma Comissão paritária em género. Mas não só. Garantiu um sistema europeu de proteção contra o desemprego, um direito de asilo mais harmonioso e o reconhecimento do direito de iniciativa ao Parlamento para projetos legislativos.

Depois de estar cerca de um ano à frente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen vê-se a braços com uma pandemia mundial onde, apesar das dificuldades, pode utilizar os seus conhecimentos em saúde pública.

Christine Lagarde
Presidente do Banco Central Europeu

Foi a primeira mulher a presidir ao Banco Central Europeu mas, antes disso, já tinha sido a primeira pessoa do sexo feminino a ser ministra das Finanças em França. E também, em 2011, foi a escolhida para o cargo, se tornando a primeira mulher a ocupar a função. É defensora da igualdade de género e chegou mesmo a dizer que a dominância dos homens no setor financeiro tornou possível alguns colapsos como o do banco Lehman Brothers. Durante o mandato no FMI, a advogada de formação foi responsável em negociar o aporte financeiro para os países da zona do euro. O facto de não ter formação económica foi motivo de várias críticas e é incomum que uma pessoa sem esta formação seja escolhida para liderar o FMI ou o BCE mas a verdade é que a popularidade de Lagarde parece estar em altas. 

A carreira política de Lagarde – nascida em Paris em 1956 – só teve início em 2005. E, até chegar ao FMI em 2011, pilotou a economia francesa durante a crise financeira internacional de 2008 e a crise da Zona do Euro em 2010 e 2011, algo que lhe chegou a dar grande credibilidade. A nível pessoal, Christine foi casada duas vezes e tem dois filhos. Desde 2006, o seu companheiro é o empresário francês Xavier Giocanti.

Muito preocupada com a emancipação feminina, Lagarde ganhou várias distinções tendo, em 2020, sido escolhida como a segunda mulher mais poderosa do mundo pela revista norte-americana Forbes, atrás apenas da chanceler alemã Angela Merkel.

Kristalina Georgieva
Diretora Geral do Fundo Monetário Internacional

Entra em 2019 no Fundo Monetário Internacional para substituir Christine Lagarde e torna-se a primeira mulher de um país emergente a liderar o Fundo. Deixou então o cargo de diretora-executiva do Banco Mundial. Filha de um engenheiro civil, Kristalina Georgieva nasceu em Sófia, na Bulgária e estudou, no seu país, política económica e sociologia no Instituto de Economia Karl Marx. Seguiu depois para a London School of Economics, no Reino Unido. Nunca esquecendo de onde veio, Georgieva não esconde o orgulho do percurso. «Os meus avós tiveram muito pouca educação. Os meus pais terminaram o ensino médio. Eu fui a primeira na minha grande família a ter um doutoramento. De uma vila na Bulgária a CEO do Banco Mundial. Isso que é possibilidade!», chegou a dizer antes ainda de a sua vida passar pelo FMI. Fluente em búlgaro, inglês e russo, a diretora geral do FMI dá ainda uns toques no francês.

O sucesso não se fica por aqui: Em 2010, foi nomeada ‘Europeia do Ano’ e ‘Comissária do Ano’ pela European Voice, um reconhecimento pela sua liderança na resposta da União Europeia a crises humanitárias. Em outubro de 2020, recebeu o prémio Distinguished International Leadership Award do Atlantic Council em reconhecimento às contribuições excecionais e distintas durante a sua carreira no serviço público.

Roberta Metsola
Presidente do Parlamento Europeu

É mais uma cara nova aos comandos de um cargo de topo europeu. Foi já este ano que a maltesa Roberta Metsola foi eleita presidente do Parlamento Europeu. Apesar de ser já a terceira mulher à frente do Parlamento Europeu, é a mais nova de sempre no cargo, com 43 anos. É casada com o finlandês Ukko Metsola, com quem tem quatro filhos. É advogada com carreira feita em Bruxelas. Em 2013 foi eleita pela primeira vez – e à terceira tentativa –  eurodeputada pelo Partido Nacionalista do seu país, inscrito no PPE.

No seu primeiro discurso como presidente da instituição, Metsola prometeu que vai prestar tributo ao seu antecessor «ao defender sempre, sempre, a Europa». Roberta Metsola defende os direitos LGBT e dos migrantes, mas tem uma posição antiaborto. No entanto, promete defender a visão do parlamento. «A minha posição a partir de agora é a posição do Parlamento. E nesta matéria, de direitos sexuais e reprodutivos, este Parlamento sempre foi inequívoco, sempre defendeu um reforço desses direitos. Esta é a posição do Parlamento Europeu e posso comprometer-me perante todos vós que será também a minha posição, como já o fiz enquanto vice-presidente. Vou promover essas posições não só dentro desta casa como junto das outras instituições», garantiu. Vídeos de campanha divulgados pelo grupo PPE nas redes sociais antes das eleições mostravam bem a essência da nova presidente do Parlamento Europeu: uma pessoa que se inspira em mulheres fortes e quer inspirar outras. Uma mãe de quatro filhos que quer conciliar família e carreira.

Ana Botìn
Presidente do Banco Santander

Ana Botín é o rosto do gigante financeiro Santander, depois de ter assumido a liderança do grupo em setembro de 2014, após a morte do pai, Emilio Botin. A escolha para liderar a instituição financeira não foi surpresa, já que Isabel Botín – a mais velha de seis irmãos – trabalhava no banco desde 1989, onde entrou depois de ter completado 29 anos.

E recebeu boas indicações da comissão do Santander para assumir as rédeas do banco. A opinião, na altura, foi unânime: «É a pessoa mais idónea, dadas as suas qualidades pessoais e profissionais, a sua experiência, a sua trajetória no grupo e o seu unânime reconhecimento nacional e internacional». No momento em que assumiu funções deixou uma promessa: «Vamos continuar a trabalhar com toda a determinação para construir um Banco Santander melhor a cada dia para os nossos clientes, funcionários e acionistas». A verdade é que essa promessa tem vindo a ser cumprida. E os números falam por si: depois de ter apresentado prejuízos, em 2020, de 8.771 milhões provocado principalmente pelo aumento das dotações para enfrentar a pandemia de covid-19, conseguiu dar a volta e no ano passado apresentou lucros de 8.124 milhões de euros. O banco atribui estes resultados à «retoma da atividade». É certo que a sua nomeação veio quebrar com a longa tradição do grupo. Até essa altura, o Santander tinha tido sempre homens da família Botín a ocupar o cargo de topo. No entanto, a sua vasta experiência no setor facilmente contribuiu para quebrar a tendência.

Marta Ortega 
Presidente do grupo Inditex

«Sempre disse que ia dedicar a minha vida a expandir o legado dos meus pais, a olhar para o futuro, mas a aprender com o passado». Dito e feito. A partir de 1 de abril, Marta Ortega estará oficialmente aos comandos do grupo Inditex, continuando assim o legado do pai, Amancio Ortega. Aos 37 anos, Ortega nunca tinha ocupado nenhum cargo executivo no grupo mas não é por isso que o seu trabalho não é visível tendo, mais recentemente, ficado conhecida por se dedicar quase exclusivamente à introdução de coleções premium e à gestão de imagem da Zara. Mas para chegar onde chegou, Marta Ortega começou por baixo e bem cedo. Tinha apenas 14 anos quando teve o seu primeiro emprego na marca, como assistente de vendas numa das lojas em Londres. Não terá sido fácil para si. «Na primeira semana pensei que não iria sobreviver», chegou a dizer numa entrevista. Mas sobreviveu. E chegou ao topo. E chegou sem saber – durante muitos anos – que os pais eram donos da Inditex, ‘segredo’ que lhe foi revelado por uma amiga.

Agora que está aos comandos de uma das marcas mais conhecidas do mundo no setor da moda, Ortega vê-se a braços não com os lucros da empresa, mas com o facto de a tornar mais amiga do ambiente, uma vez que a indústria da moda é a segunda mais poluente do planeta, numa altura em que se fala tanto de ambiente. Casada e mãe de dois filhos, Marta Ortega sabe que, apesar de tudo, o legado do pai precisa de si. E deixou a promessa: «Estarei sempre onde a empresa mais precise de mim». E assim, chega agora ao lugar de topo.