“A seca tem de passar a ser um risco coberto pelos seguros”

Mini-entrevista a Rui Garrido, Presidente da ACOS- Agricultores do Sul e da Comissão Organizadora da 38.ª Ovibeja, que arranca esta quinta-feira.

Já admitiu melhorias com as chuvas do último mês, mas também danos irreparáveis. Que situação se vive na agricultura em Beja? É verdade que agora teremos alguma coisa até para pasto, mas os prejuízos que houve já ninguém nos tira de cima. E não podemos alhear a situação de seca que se tem vivido do aumento brutal das despesas de produção. Dou um exemplo bem visível: estamos agora a iniciar as sementeiras de milho e um dos adubos que se utiliza no milho é solução azotada. Na campanha do ano passado custava cerca de 300 euros a tonelada e este ano já vai quase em 1100 euros, três vezes mais. Só um adubo.

Está a tornar-se impraticável semear?

Ou temos garantia de que os solos dão uma boa produção ou vale mais não fazer, que é o que se está a passar em alguns sítios, porque não sabemos se vamos conseguir vender os produtos a preços que compensem os aumentos dos custos. Este é o grande drama neste momento da nossa agricultura.

Começa hoje a Ovibeja, onde estará a ministra da Agricultura. Que apelo vão deixar ao Governo?

A antecipação de ajudas (para maio) é bem-vinda, vai dar alguma liquidez, mas eram ajudas que iríamos sempre receber, por isso pensamos que temos de ir mais além perante a situação que se está a viver. A médio e longo prazo, uma das questões que nos parece importante discutir é que haja seguros que cubram situações de seca, que é algo que os nossos vizinhos em Espanha têm. Seguros que assegurem por exemplo num terreno que dá 4 mil quilos de trigo, se isso não acontece por uma situação de seca, é-se indemnizado pela companhia de seguros. A seca tem de passar a ser um risco coberto pelos seguros. É algo de que falamos há muito, depois quando não há seca esquecemo-nos – por culpa também nossa, não é só dos políticos – mas é algo que só se faz com vontade política. Implica que as seguradoras adiram mas que haja apoios para isso. Depois na parte dos custos energéticos, já houve no passado um subsídio de apoio à eletricidade que era importante e eventualmente haverá casos em que se justifique outras ajudas diretas.

O tema da Ovibeja é como alimentar o planeta, numa altura em que a guerra na Ucrânia faz disparar o risco de insegurança alimentar. O que o preocupa?

Já tínhamos pensado no tema antes da guerra e ainda bem que o escolhemos porque ninguém imaginava que tivéssemos este problema, que vem agravar ainda mais a soberania alimentar. Mas antes desta guerra já tínhamos este problema: a população não para de crescer e temos de encontrar forma de alimentar o mundo sem descarar soluções à partida, seja a pecuária ou a agricultura mais intensiva. Não podemos ter medos nem tabus, a agricultura intensiva está para ficar. Claro que isto traz preocupações de sustentabilidade ambiental, mas é para isso que precisamos de juntar produtores, universidades, investigação e queremos juntar os vários intervenientes para em conjunto encontrar soluções. Quando à soberania, é sabido que não somos um país agrícola como a França e nunca conseguiremos ser autossuficientes, mas podemos tentar mitigar isso exportando aquilo que produzimos melhor.