PSD, IL e Chega ensaiam pacto de não agressão

As movimentações começaram nas segundas linhas dos partidos e ganham força com a viragem da Europa à direita. Estratégia do PSD é não hostilizar Chega e IL e unir forças contra o PS, com a mira em Pedro Nuno Santos como líder da esquerda unida em 2026.

Depois dos ziguezagues sobre o Chega na campanha interna do PSD, os sociais-democratas voltaram à ponderação dos cenários da governabilidade para discutir o que fazer com o partido de André Ventura e como chegar ao poder. Na cabeça de Luís Montenegro, tal como reiterou esta semana, não restam dúvidas de que insistir na tática do ‘papão da democracia’ seria um erro que só serve aquele partido emergente e o PS. É com esse horizonte até 2026 em mente que PSD, Chega e Iniciativa Liberal querem alcançar um pacto de não agressão entre si – uma espécie de entendimento tácito em que se comprometem a não atacar-se uns aos outros.

As movimentações, sabe o Nascer do SOL, não partiram das cúpulas, mas começaram nas segundas linhas dos partidos e têm na mira um inimigo em comum: o Partido Socialista. A convicção  – que é amplamente partilhada no centro-direita e foi até uma das previsões lançadas por Luís Marques Mendes durante a Universidade de Verão do PSD –  é que António Costa fique até ao fim da legislatura e que o candidato do PS às legislativas em 2026 seja Pedro Nuno Santos.

Os esforços de Luís Montenegro e do líder da bancada social-democrata, Joaquim Miranda Sarmento, para a eleição de Rui Paulo Sousa (Chega) como vice-presidente da Assembleia da República, com o pretexto de respeitar a «normalidade política das instituições», foram apenas o primeiro sinal deste conluio entre os três partidos da oposição, que vai ganhando força com a expectativa de uma viragem da Europa à direita, em linha com a vitória do partido de Giorgia Meloni em Itália e da coligação dos partidos de direita na Suécia.

É neste enquadramento que a direita tradicional em Portugal vai fazendo contas e estudando soluções como foram encontradas naqueles dois países. Neste jogo pela governabilidade, o PSD não esconde que Pedro Nuno Santos, que sempre foi visto como o obreiro e ‘cimento’ da geringonça, lhe seria mais conveniente. Aliás, o antigo eurodeputado social-democrata Carlos Coelho colocou mesmo em evidência que «não faz muito sentido um candidato da esquerda do PS disputar o espaço do eleitorado moderado que é essencial para o crescimento eleitoral do PS».

Essa é a razão que leva o partido ‘laranja’ a acreditar que pode ganhar as eleições legislativas e liderar um governo, antecipando que o líder da ala mais à esquerda do PS necessite de tentar um novo entendimento com os antigos parceiros, Bloco de Esquerda e PCP, para uma solução governativa.

A progressiva redução da diferença de intenções de voto para o partido encabeçado por António Costa que se tem verificado nas últimas sondagens é outra carta que joga a favor do PSD. Neste momomento, com a conjugação das intenções de voto no Chega e na IL, a direita já suplantaria os resultados do PS. 

Assente na perspectiva de uma  saturação do Governo PS e de uma esquerda que desilude o eleitorado, o PSD pode beneficiar ao ver no Chega e na IL eventuais parceiros de governo, numa solução que espelhe a que foi alcançada no quadro político de Itália e onde os sociais-democratas seriam a voz da moderação.

Na contabilidade eleitoral do PSD, o partido de André Ventura  pode vir a ocupar o lugar do velho CDS  e isso vem já do tempo da liderança de Rui Rio e do acordo nos Açores. Mas essa possível aliança dependerá da evolução do Chega, aponta José Miguel Júdice ao Nascer do SOL. «Não vejo nenhuma dificuldade, se o Chega largar temas completamente fraturantes, como a questão dos ciganos e da castração química, e passar a ser um partido inserido no sistema político em vez de um partido de nixo», defende.

O advogado e comentador político recorre também ao exemplo de Itália para lembrar que Giorgia Meloni «fez um processo de evolução muito grande» e por essa razão os italianos «não tiveram medo de votar no seu partido». «Mas provavelmente teriam, se não tivesse tido essa evolução», sublinha, vincando que o Chega terá de fazer o mesmo caminho se algum dia quiser fazer acordos com os restantes partidos.

Esta é também a posição adotada pelo presidente do PSD desde o primeiro dia. «Não somos nem populistas nem ultraliberais. E muito menos nos associaremos algum dia a qualquer política xenófoba ou racista», garantiu no Congresso do Porto em julho.

De resto, a estratégia de Montenegro passa também por fazer marcação cerrada ao Executivo socialista. Na primeira vez que reuniu o órgão máximo do partido entre congressos, fez de tudo para mostrar o contraste entre um partido que está «unido» e «coeso» e um Governo que está em roda livre. 

Num discurso de cerca de 40 minutos, a sua intervenção no Conselho Nacional de quinta-feira não podia ter sido mais em sintonia com as críticas de Aníbal Cavaco Silva num artigo de opinião no Público, divulgado enquanto ainda decorria a reunião dos sociais-democratas e numa altura em que Marcelo Rebelo de Sousa parece mais entretido nos Estados Unidos com o basebol do que com o caos no país.

Se o antigo Presidente da República se referiu ao Executivo de António Costa como «desarticulado», «desorientado» e a «sem rumo», o líder do principal partido da oposição escolheu dizer que o Governo está à «deriva», «sem liderança» e «desnorteado».

«No mesmo período em que o PSD está unido, coeso e entrosado, existe um Governo novo, recém empossado, dispondo de condições políticas excecionais, que se apresenta dividido, confuso, cheio de polémicas, cheio de contradições. É um Governo que está à deriva, que não tem liderança», traçou Montenegro, atingindo também no seu discurso o ministro das Infraestruturas, numa referência ao episódio sobre o novo aeroporto.

Curiosamente, ao mesmo tempo que Cavaco  pediu aos partidos da oposição que ajam para que Portugal entre no rumo certo, o líder do PSD não faltou à chamada, prometendo estar lá «quando for preciso encarreirar o Governo».

A estes sinais de um centro-direita com mais energia e sem os dramas de outros tempos, salta à vista outro: um alinhamento destas movimentações para que Pedro Passos Coelho seja o candidato às presidenciais. O antigo primeiro-ministro, que até agora andava afastado da vida política ativa, tem voltado de forma discreta ao espaço mediático.

Primeiro, com uma aparição surpresa na rentrée dos sociais-democratas no Pontal, e, agora, ao assinar o prefácio do livro Diplomacia em tempo de troika, do embaixador Luís de Almeida Sampaio, cujas 36 páginas dedica ao «falhanço clamoroso» dos Governos socialistas e à «economia estagnada e incapaz de gerar riqueza».