Presidente da República e patrões contra eleições

No Palácio de Belém reina uma certeza: o Presidente da República (PR) não espera receber de Passos Coelho uma carta de demissão, por consequência da decisão do Tribunal Constitucional (TC).

a leitura que se faz do estado de espírito do país não é idêntica à que se fez aquando do polémico pec iv, cujo chumbo ditou a saída de sócrates. o país agora, diz-se, não pode ir para eleições – como foi já pedido pelo ps.

um conselheiro do chefe de estado dizia esta semana ao sol registar com agrado que a época de páscoa «serenou os ânimos» de um lado e do outro, com o psd a desmentir a hipótese de demissão do primeiro-ministro e os socialistas a carregarem menos no pedido de eleições já. e deixava um recado directo para são bento: caberá ao governo encontrar os paliativos para o problema que o tc colocar.

«não vejo razões para o governo sair de cena. tem condições para governar, independentemente da contestação. senão, ficaria com o ónus de uma crise política», dizia um cavaquista, na certeza de que passos «não irá a belém deixar uma bomba para desarmadilhar».

e até as sugestões de dois conselheiros de estado, marques mendes e marcelo rebelo de sousa, para o pr convocar um conselho de estado é, por ora, descartada: «tinha que acontecer muita coisa antes».

três meses depois de cavaco silva ter enviado ao tc o pedido de fiscalização do orçamento, até entre os seus mais próximos se sente o incómodo com a demora da decisão. que aumentou a pressão sobre todos e pôs «tudo nervoso». a tese que mais corria em belém era a de que os juízes ainda procuravam argumentos e justificações. «devem estar lá muito divididos», admitia uma destas fontes, acrescentando que «encontrar um texto tecnicamente irrepreensível, sem desgraçar tudo, não é fácil».

o que também não caiu bem em belém, apurou o sol, foi a pressão que passos coelho colocou sobre o tc. a tese de que pode ter efeito contrário era levada a sério. e só a hipótese de o governo querer pôr pressão também na troika, preparando um pedido de maior flexibilidade, era vista como racional.

entre os conselheiros de estado – ouvidos sob condição de anonimato pelo sol – reina também a máxima de que o governo tem que continuar. «tudo depende da magnitude de um chumbo, mas é inusitado dizer-se que não há ‘plano b’, seja por 400, ou mesmo 700 milhões de euros», dizia um.

outra voz, a mesma tese: «eleições seriam um disparate, era o caminho para o segundo resgate». mas o que podia fazer o presidente, se houvesse uma demissão do executivo? «podia tentar um governo a três, mas um pr tem sempre pouca margem de manobra, como vimos na grécia e em itália». restaria manter este governo – com o adicional de vítor gaspar ficar fragilizado face ao segundo chumbo de um orçamento.

o problema do day after é o que mais preocupa os conselheiros do pr. há quem não esconda ver o executivo «em perda», ou até embrulhado em «coisas incompreensíveis». pior, a dimensão do chumbo pode deixar tudo num limbo onde o presidente teria que vir para a linha da frente.

por ora, cavaco silva mantém intacta a viagem programada para 15 a 20 de abril, à colômbia e ao peru. mas admite-se que poderia ser «revista» em caso de crise iminente.

depois, virá o 25 de abril: «o discurso não será fácil», admitia uma fonte próxima do pr.

empresários: estabilidade ou governo de salvação

na gestão de um problema sempre difícil, o presidente conta pelo menos com um trunfo: entre os banqueiros, associações patronais e empresários, ninguém aparece a defender eleições.

nuno amado, presidente do bcp, é claro e sucinto numa declaração ao sol: «o país precisa de estabilidade».

antónio saraiva, presidente da cip, vai mais longe: diz «não» a eleições e sugere que o governo arranje «formas de ultrapassar o problema» do tc – «não do lado da receita» –, bem como um «entendimento ps, cds e psd nas reformas que o país precisa, sob pena da democracia não avançar por causa dos jogos político-partidários». para o pr segue, porém, um conselho: «que possa influenciar estes acordos».

outro líder patronal, joão machado (cap), vai mais longe no pedido de acção ao presidente: antecipar eleições «seria dramático», mas, se for preciso, é possível «um novo governo de iniciativa presidencial». há uma voz mais veemente: carlos martins, da martifer. «eleições não resolvem nada. nesta fase, precisamos de um novo governo, de um novo primeiro-ministro, de iniciativa presidencial, com um entendimento entre os três partidos», diz o empresário.

entre os empresários que responderam a um inquérito do sol, outros admitem essa hipótese. jorge armindo (da amorim turismo) rejeita eleições e admite «a formação de um novo governo no actual quadro parlamentar com um entendimento entre os três maiores partidos», com um papel activo do pr. filipe soares franco (opway) pede, «de uma vez por todas, um governo de salvação nacional».

joão vieira lopes, líder da ccp, tem mais dúvidas: ir para eleições «depende da estabilidade política que se consiga obter». mas «o programa de ajustamento terá de ser renegociado».

numa linha mais cautelosa estão outros gestores, como patrick monteiro de barros: «eleições são contraproducentes e um acórdão do tc não as justifica». e francisco van zeller: «há um governo legal no parlamento que foi eleito para ter dificuldades e não facilidades».

mais ligados ao governo, pires de lima (cds), eduardo catroga e ângelo correia (psd) mantêm-se cautelosos. «se acrescentarmos aos problemas que temos uma crise política de dois em dois anos, isso põe em causa a própria sustentabilidade do país. só faltava que o tc fosse pretexto para despedir governos», diz o líder da unicer. «qualquer novo governo iria estar sujeito a tais eventualidades, seja no parlamento, seja a nível do tc», desvaloriza o chairman da edp. ângelo correia (fomentinvest) prefere apontar a um «acordo que perdurasse por vários anos, independentemente do partido que forma governo».

david.dinis@sol.pt
ricardo.rego@sol.pt
tania.ferreira@sol.pt
* com joão madeira

texto publicado na edição impressa do sol de 5 de abril