E la nave va…

Pode  gostar-se  ou  não  dela, ou tentar defenestrá-la no pelourinho da praça pública, mas é inquestionável que Maria Luís Albuquerque – a antiga professora de Passos Coelho –, soube distinguir-se, desde muito cedo, por um discurso articulado e fluente, ao herdar uma pasta delicada num período tenso.  

Ao contrário do seu antecessor, baço e monocórdico, a ministra das Finanças conseguiu apurar um estilo sóbrio, mas comunicativo, selando as suas intervenções com firmeza e domínio dos dossiês.

Mal  afeiçoada  ao  lugar   já Maria Luís era chamada a uma Comissão Parlamentar de Inquérito,  em  nome  dos  swaps,  revelando uma inesperada segurança para quem a não conhecia, sujeita às catilinárias dos deputados das  esquerdas,  PS  incluído.  Foi capaz  de  responder  com  frieza  e elegância   à   sobranceria   insolente  de  alguns  deles. 

Quiseram passar-lhe uma ‘certidão de óbito’ político, mas resistiu e afirmou-se no meio de uma terapêutica de choque, apesar da ‘marcação’ de Paulo Portas, contra quem foi escolhida. O que não é de somenos.

A ministra sabe do que fala, mesmo quando dela se discorda. Com a troika revelou-se. E, assente a poeira levantada pelo DEO, vai perceber-se que o funcionalismo público recupera algum poder de compra, enquanto os reformados e pensionistas perdem menos do que esperavam. O agravamento residual do IVA e TSU, será, apesar de tudo, um mal menor. 

No 1.º de Maio, as clareiras da CGTP pintadas na Alameda, e a aflitiva falta de gente na concentração da UGT em Belém, constituem, talvez, um primeiro sinal das deserções.

De caminho, é uma autoflagelação ouvir António José Seguro. Desgasta-se em clichés. Esgrime ‘escândalo’ a despropósito e tem propostas tão absurdas como retirar todos os sem-abrigo das ruas, reabrir os tribunais fechados pelo novo mapa judiciário ou criar um tribunal especial para grandes investidores. Nem o ‘pronto-socorro’ Jorge Coelho lhe restituiu a sensatez. 

A doença do despesismo não larga o PS. Teme-se que seja um mal crónico e sem remédio. 

Em Junho de 2011, em vésperas da derrocada iminente do Governo socialista, Vasco Graça Moura – esse princípe das Letras, também polemista de verbo afiado, prematuramente desaparecido – escreveu no DN que «Portugal não pode ter um Governo que, além de obscenamente incompetente, escamoteie as obrigações negociadas com a troika e assumidas perante a comunidade internacional. Dessas obrigações e do que significam, o PS, o seu líder e os seus aflautados tenorinos nem falam. Nem da bancarrota».

Estávamos assim. Aproximavam-se, então, as legislativas que ditariam a queda aparatosa de José Sócrates. Incorrigível, já se pavoneia por aí, utilizando sem pudor a RTP – uma obscenidade –, agora de braço dado com Francisco Assis, ainda convencido de uma mais-valia que ele não tem. 

Quase a emancipar-se da troika, e antes das eleições europeias, o Governo coligiu medidas que, mesmo atabalhoadas, abalaram as oposições.
Ao encenar a ‘saída limpa’, Passos Coelho imitou a Irlanda, afirmando que o país anda por si. Oxalá não se engane. Com uma dívida pública superior a 130% e os credores atentos, os truques de ilusionismo perderam a virtude. À cautela, convirá ter à mão a ‘carta de conforto’ dos financiadores. E la nave va…