Linces: Um regresso com riscos

Atropelamentos são a principal ameaça à sobrevivência dos primeiros linces agora libertados.

Os atropelamentos são a principal ameaça à sobrevivência da Jacarandá e do Katmandu, os dois linces ibéricos devolvidos à natureza, no Parque Natural do Vale do Guadiana, em Mértola. No próximo mês e meio, ainda vão permanecer num cercado de dois hectares, dentro de uma zona de caça, sob monitorização apertada – depois, ficarão livres.

Em Espanha, de onde Katmandu veio, os atropelamentos são mesmo a principal causa de morte dos linces aí soltos: 14 em 2013 e cinco este ano, segundo a organização ambientalista World Wide Fund. Em Portugal, esta é a primeira vez que ocorre uma ‘operação especial’ como a de terça-feira, resultado do Pacto Nacional para a Conservação do Lince Ibérico que reúne cerca de 20 proprietários, produtores, caçadores, organizações não governamentais e investigadores.

Mas o verdadeiro teste para as políticas de ambiente em que se insere esta libertação – e que prevêem a devolução à natureza de mais oito linces nos próximos meses – está apenas a começar, avisam ambientalistas e investigadores. O sucesso da reintrodução do felino mais ameaçado do mundo dependerá da disponibilidade de alimento, ou seja, de coelho bravo, a espécie que constitui a base do sua dieta e que, em 2013, começou a ser dizimada por uma nova estirpe do vírus da doença hemorrágica viral: "Os últimos dados na zona, de cerca de cinco coelhos por metro quadrado, são animadores", aponta Pedro Esteves, do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos da Universidade do Porto. Mas "nada garante que a estirpe do vírus não se torne mais letal em 2015, matando mais coelhos".

Caso a população de coelhos diminua na zona onde os linces foram libertados, o casal poderá ter de deixar o seu habitat para procurar alimento noutros territórios – como, aliás, fez Hongo, o lince libertado na Andaluzia e que no ano passado foi detectado em Vila  Nova de Milfontes, onde «existe uma população estável de coelho bravo».

A Quercus e a Liga de Protecção da Natureza – que subscreveram o Pacto –, pedem cautela às entidades nesta reintrodução. "Trata-se de uma corrida de fundo. Temos de garantir que as condições se mantêm a longo prazo. Por isso, é importante que se olhe para a experiência espanhola para tentar evitar os mesmos erros", refere Paulo Lucas, da Quercus.