Desde então Pedro Lemos tem tido uma vida ainda mais agitada que o habitual. O seu telefone, que não parou de tocar durante a conversa com a Tabu, testemunha que as solicitações têm sido muitas, tal como a curiosidade pelo seu trabalho. “Tem sido uma loucura”, diz acerca da actividade frenética do telemóvel.
Apesar de desconhecer os critérios que lhe valeram a estrela, acredita que vem do trabalho consistente que ele e a sua equipa têm desenvolvido desde que o espaço Pedro Lemos abriu, há cinco anos. “Achamos que tem a ver com o trabalho honesto, com o respeito pela matéria-prima e com o serviço. Um conjunto de experiências que nos destacou e nos levou à estrela”. O restaurante, situado na Foz Velha do Porto, ocupa uma casa do século XIX que já albergou um forno de padeiro e um dos primeiros pubs da cidade. Hoje, as paredes exteriores de granito escondem um ambiente requintado e com atenção a todos os detalhes, com lotação máxima para 34 pessoas. A experiência tem um custo médio de 75 euros por pessoa.
O segredo é o caminho
Pedro tem, ainda, de conciliar a dualidade dos papéis que desempenha: o de gestor, que lhe mantém o cérebro activo, e o de chef, que é uma vocação e uma terapia. “Sou uma pessoa muito prática e gosto de estar em contacto com a matéria. E tenho um problema: sinto-me capaz de fazer qualquer coisa”. Talvez tenha sido esta característica que o levou a desistir da carreira de Engenheiro Civil para se dedicar à cozinha. “Quando deixei o curso universitário acreditava que podia ser chef, mas a verdade é que quando somos jovens acreditamos em muita coisa. Por isso decidi fazer um teste com Miguel Castro Silva, que teve um percurso semelhante: tinha deixado a Indústria Têxtil para se dedicar à cozinha. Apostou que não aguentava duas semanas, mas ao fim de uma semana eu já não tinha dúvidas. Já lá vão quase 14 anos!”.
Começou por bater à porta do Porto Palácio onde trabalhou com o chef Hélio Loureiro. Mais tarde rumou a Lisboa para estudar, mas acabou por se dedicar à cozinha, sob a batuta de Aimé Barroyer. Marcaram-no particularmente o perfeccionismo, a técnica, a arte e a mestria deste chef. “A sua capacidade de trabalho e percepção eram incríveis. Acho que não há nada que ele não consiga fazer”.
Mas as primeiras lições na cozinha teve-as muito antes, em casa, com as suas duas avós. Se pelo lado materno vinham as influências transmontanas com a sua relação especial com o fogo, com a criação de animais, com o azeite e os legumes colhidos na hora, do lado paterno havia uma forte ligação ao mar e ao peixe. Pedro, nascido e criado no Porto, ainda retém na memória as visitas à lota de Matosinhos, onde a avó se abastecia do peixe que vendia pelas ruas da Invicta, numa canastra. “O maior segredo que eu retirei dessas memórias de infância era a humildade, a honestidade e o respeito e carinho com que elas cozinhavam. Poderem colocar na mesa uma refeição boa era um orgulho e o resultado de muito trabalho”. Quanto ao principal ingrediente da sua receita de sucesso, não tem dúvidas em apontar a sua a equipa. “Quando falta alguém, as coisas não funcionam da mesma maneira”.
Nada é dado, tudo é conquistado
Com 35 anos de idade e quase uma década e meia de carreira, Pedro Lemos assegura que nesta área é preciso ter uma grande capacidade de trabalho, de resistência ao stresse, e uma grande memória. Quando está na cozinha, tudo o que vê, ouve, cheira e prova é um bailado intuitivo que o faz entrar em transe. “Mal visto o uniforme começo a ouvir a metros de distância o tilintar, o borbulhar… ao início assustava-me toda esta informação, agora gosto. Basta olhar para a panela ou frigideira e percebo o que vai resultar dali”. Nem sempre foi assim. Um dia, no início do seu percurso, ainda em pânico a tentar acompanhar o ritmo dos seus colegas, um dos sub-chefs passou por ele, apontou para uma das dez panelas que tinha ao seu controlo e, no meio da correria, disse-lhe: “Falta sal”. Pedro julgou que o comentário não era para si mas quando o sub-chef insistiu, provou e de facto faltava sal. “Aquilo intrigou-me. Perguntei-lhe como é que só de olhar conseguia saber isso. Depois percebi que tem a ver com a evaporação, com a concentração, com o iodo”.
Para quem quiser provar o ‘sabor Michelin’ por um preço mais acessível (cerca de 10 euros) existe o recém-inaugurado Stash – The Sandwich Room, um projecto conjunto com Joana Espinheira, a sua esposa. Ali dão-se a provar as suas requintadas receitas, mas em forma de sandes.
Para o futuro a sua ambição é a mesma de sempre: “Ser feliz no que faço e ter o reconhecimento por parte dos clientes. E isso acontece quando eles regressam”.