Tem a noção de que as suas críticas a Poiares Maduro («falta de confiança e liderança política») foram incendiárias no PSD?
Eu lancei um alerta. As declarações tomam outra proporção quando o presidente da Câmara de Cascais é também vice-presidente do PSD. Sou a favor da municipalização na educação, e na saúde, mas é um processo com obstáculos, desde logo o da não confiança gerada por sucessivos governos centralistas. EsteGoverno não se apercebeu desse problema.
E como se ultrapassa?
Com um período de adaptação, de co-gestão dos recursos e dos objectivos.
Que reacção teve do ministro?
A questão essencial aqui é sobre o modelo de gestão e tive da parte do ministro Poiares Maduro a abertura para voltarmos a sentarmo-nos e discutirmos esse modelo de gestão. É o que faremos nos próximos tempos. Entretanto, a Câmara de Cascais participará no dia 18 de Fevereiro no debate organizado pelo Conselho Nacional de Educação, que ouvirá perspectivas favoráveis e desfavoráveis à descentralização, com participação de pais e dos professores. Acredito que esse debate será esclarecedor sobre o modelo a seguir.
Porque disse que falta liderança e coordenação política a Poiares Maduro?
Tem a ver com este processo. Penso que seria natural uma maior aproximação do Governo às autarquias do PSD, dado que o local próprio, que é a Associação Nacional de Municípios, está contaminada pela lógica eleitoral imprimida pelo PCP e pelo PS. Portanto, essa coordenação e essa liderança política deveriam ter encontrado outros mecanismos no contacto com as câmaras do PSD.
A melhor estratégia para António Costa chegar ao poder é fazer-se de morto, como diz Mira Amaral?
Talvez seja um bom conselho. Porque pior do que fazer de morto, é não apresentar uma ideia para o país. Ou então contradizer-se, como pôr a regionalização na agenda política e ao mesmo tempo dar ordens aos autarcas socialistas para abandonarem qualquer negociação nas transferências de competências para as autarquias. Foi uma desfaçatez e um desrespeito pelo poder autárquico. Costa é um tacticista e o país não precisa de tacticistas.
As sondagens continuam a dar vantagem ao PS.
O que as sondagens mostram é que a diferença para o PS entre PSD e CDS somados é inferior à diferença que o PS teve para a coligação nas últimas eleições europeias. E António Costa achou na época que isso era motivo para a destituição de António José Seguro, convencido que a sua liderança daria ao PS para cima de 50%!
Uma vitória do Syriza na Grécia, seguida de um Governo que consiga melhores condições no pagamento da dívida grega não porá em causa a estratégia de ‘bom aluno’ do Governo português?
A Grécia vai demonstrar que uma coisa é a realidade outra a demagogia e o populismo. Mas admitamos que o Syriza consegue a reestruração da dívida. Vamos ver se isso tem consequências positivas ou negativas para os gregos. Se calhar servirá de alerta para quem queira ir nesse aventureirismo em Portugal. Mas ainda há mais um cenário: o de o partido que está no Governo [a Nova Democracia, de Antonis Samaras] voltar a ganhar as eleições. [NOTA: Esta entrevista foi realizada antes de serem conhecidos os resultados da votação de domingo, ganha pelo Syriza.] Também será um bom sinal para Portugal, o de que as pessoas conseguem reagir ao populismo. Aconteça o que acontecer na Grécia, a coligação em Portugal ficará sempre validada, sobre a necessidade da política que aplicou.
O que acha de Rui Rio como candidato presidencial?
Não vou falar sobre presidenciais. Porque o que se passa neste momento tem apenas a ver com a táctica – legítima – dos potenciais candidatos. De modo algum é o momento do PSD se pronunciar. Depois de manifestações de vontade dos próprios é que haverá essa decisão. Ou então não, não a vejo como necessária.
É indiferente o PSD ter uma decisão sobre as presidenciais antes das legislativas, apoiando um candidato?
Considero que não é obrigatório.
Não vê necessidade em tratar as legislativas e presidenciais como um pacote, pela sua proximidade no tempo e implicações mútuas?
Não vejo que haja essa necessidade. Até porque se as relacionarmos corremos o risco de baralhar a discussão na apresentação de propostas e às tantas estamos a confundir propostas e estamos eleger um candidato que é a Presidente para primeiro-ministro e vice-versa. Tudo o que seja perturbar ainda mais um ano que já é intenso será prejudicial para os portugueses.
Mas não ambiciona ter uma maioria, um Governo, um Presidente?
Sim. E isso faz sentido tanto para o PSD como para o PS.
Como encara o facto de todos os candidatos fortes à esquerda (Guterres, Vitorino) surgirem à frente dos candidatos da direita?
As sondagens que vi foram sempre numa lógica de bloco, um contra outro, mas haverá mais do que dois candidatos nas eleições. Em segundo lugar, é curioso ver que o grau de indecisos é elevadíssimo, quando a vantagem nas sondagens é só de 2 ou 3 %. O que as sondagens verdadeiramente revelam é que tudo está tudo em aberto, sejam quais forem os candidatos.
Marcelo Rebelo de Sousa diz que será muito difícil um candidato de direita ganhar. O que acha?
Digo que é natural que cada proto-candidato esteja a seguir a estratégia que é melhor para ele. Todos o têm feito, à esquerda e à direita.
O PSD está prestes a avançar com um novo projecto de criminalização do enriquecimento ilícito, apesar das dúvidas sobre a sua viabilidade jurídica. É um risco?
Sinto-me dividido sobre o enriquecimento ilícito. Por um lado vejo vantagens em mecanismos para uma maior transparência e reforço dos laços de confiança na sociedade. Porém, há tantas restrições sobre os agentes políticos que qualquer dia ninguém quererá vir para a política. No saldo global, e do que percebi, sou favorável ao que me parece ser a proposta em que a minha colega Teresa Leal Coelho se tem empenhado.
Preocupa-o o potencial de estrago na imagem do Governo da crise nas urgências hospitalares?
Não é uma matéria que acho que tenha impacto político e muito menos eleitoral. Para já, como autarca, fico muito satisfeito por Cascais não estar confrontada com esse problema. Em geral, acho que se empola um bocadinho. Faz-me lembrar o caso dos nascimentos nas ambulâncias, que parece que só aconteceram com um ministro. Agora, houve um conjunto de ocorrências lamentáveis nas urgências, numa altura de férias e de pico anormal de frio, mas também ninguém disse o que era normal noutros anos.
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