Guterres: O enigma continua

Socialistas não dão por findo o tabu de Guterres sobre as presidenciais, e admitem que Belém possa ser uma segunda escolha, se falhar a hipótese de secretário-geral da ONU. O presidente do PS, Carlos César, diz que há vantagens em adiar a decisão para depois das legislativas. Mas dois meses podem não chegar para lançar…

Guterres: O enigma continua

Guterres não desmentiu as notícias de que terá comunicado ao líder do PS a sua indisponibilidade para concorrer às presidenciais. Sinal de que está fora da corrida a Belém? A resposta é negativa, para muitos socialistas, apesar das notícias da TVI e do Expresso. Quem o conhece bem acha que não atirou a toalha ao chão e que o enigma sobre a sua candidatura vai continuar. Na direcção do PS, há quem prefira não dar o assunto por arrumado, mantendo flexibilidade táctica. Mas a prioridade de Guterres é a ONU, asseguram.

«A única informação de Guterres a reter é que ele permanece livre, mantém todas as hipóteses em aberto», diz ao SOL o seu ex-ministro da Saúde, Correia de Campos.

No início de Janeiro, o Alto Comissário da ONU para os Refugiados disse ao Expresso que o prolongamento do seu mandato até ao final de 2015 (noticiado pelo SOL no dia anterior) não implicava a desistência de Belém. «Eu sou sempre livre de decidir a minha vida», afirmou então Guterres.

Um actual dirigente do PS, que acompanhou de perto o consulado guterrista, conclui que o ex-primeiro-ministro não quer fechar portas nesta fase. «Guterres sabe que nenhum outro candidato avança antes de haver uma comunicação oficial sua. Até lá, vai gerindo a coisa, como faz Marcelo Rebelo de Sousa», afirma.

Manuel Pizarro, membro do Secretariado de António Costa, disse ao Público que «Guterres continua a ser o mais forte candidato do PS e o mais provável candidato do partido».

Costa e as críticas a Vitorino

Já António Costa, comentando a última manchete do Expresso, refugia-se na ironia, afirmando: «Eu não serei candidato, isso posso assegurar». E esquivando-se a esclarecer o tema.

Em meios socialistas comenta-se que Costa poderá estar a adiar a notícia de não contar com o trunfo Guterres. «Por muito que ele vá lançando nomes alternativos, de Vitorino a Sampaio da Nóvoa, nenhum desses nomes lhe dá valor acrescentado nas legislativas. Pelo contrário, só puxam Costa para baixo», defende um dirigente do PS ao SOL.

 Alfredo Barroso, fundador do PS, atacou Vitorino, chamando-lhe «facilitador de negócios». A opinião foi secundada por Ana Gomes, ao dizer na Visão que «não é adequado ver na Presidência um advogado de negócios». Uma caracterização que, ao abrigo do anonimato, encontra seguidores. «Vitorino não tem carreira pública nos últimos anos, tem uma ligação a interesses económicos que não são o melhor cartão de visita nesta fase da vida política», diz um dirigente socialista da ala esquerda.

De notar que, no PS, mesmo quem ainda espera por Guterres admite que este dê prioridade ao cargo de secretário-geral da ONU. «Existe a sensibilidade de que Guterres está mais virado para um cargo internacional», admite Carlos César ao SOL. O presidente do PS, no entanto, lembra que as últimas declarações públicas de Guterres são no sentido de não afastar em absoluto uma candidatura a Belém. «O que ele disse no início do ano não sofreu alteração entretanto», nota.

No campo segurista, também se encara com normalidade que a ONU surja antes de Belém. «Guterres é o melhor candidato europeu a secretário-geral da ONU. Mas, como qualquer eleição, esta não está garantida e só lá para o final do ano saberemos se o temos como candidato a Presidente», diz Álvaro Beleza ao SOL.

‘Presidenciais não são prioridade’, diz Carlos César

Esperar pode não ser mau e há vantagens num tabu de Guterres. «É positivo que nos concentremos nas legislativas, deixando as presidenciais para depois», afirma Carlos César. «As presidenciais não serão, nessa altura, um factor de divisão. Se não houver um candidato único na nossa área, o PS pode dar uma indicação, mas os eleitores socialistas decidirão como entenderem», explica. César diz que «o PS será prudente» nas eleições para Belém.

Correia de Campos concorda que é positiva a separação de actos eleitorais. «É confortável para os partidos políticos, para não se dispersarem com faits divers presidenciais», diz o ex-ministro da Saúde.

Três meses podem não chegar para Rio e Vitorino

Mas o calendário das presidenciais que empurra os candidatos para depois das legislativas pode criar um problema a quem não tenha a notoriedade de Guterres ou de Marcelo Rebelo de Sousa. Três meses chegam para vencer as eleições de Janeiro de 2016? «António Vitorino não precisa de grandes apresentações», responde Carlos César. «Rui Rio ou Vitorino são suficientemente conhecidos», diz por seu lado Correia de Campos.

À direita, com os potenciais candidatos – de Marcelo a Santana Lopes e Rui Rio – alinhados em adiar uma decisão para depois das legislativas, Rio poderá estar em desvantagem face à notoriedade de que gozam a nível nacional  quer Marcelo quer Santana.

Apesar de tudo, a maioria dos dirigentes do PSD ouvidos pelo SOL desvaloriza a alegada desvantagem de Rui Rio numa campanha mais curta.

Um membro do Governo do PSD diz mesmo que «toda a gente sabe quem é Rui Rio» e recorda que «não foi um presidente da Câmara do Porto qualquer», sublinhando que o confronto com Pinto da Costa, o presidente do Futebol Clube do Porto, lhe deu uma notoriedade nacional muito significativa.

Três meses diariamente debaixo dos holofotes da comunicação social durante uma campanha são, por isso, considerados mais do que suficientes para Rio recuperar terreno. Por outro lado, também há quem sublinhe que «a notoriedade tanto pode ser positiva como negativa» e, neste caso, adianta o mesmo dirigente do PSD, «Santana Lopes até pode estar em desvantagem».

Um vice-presidente centrista sublinha ao SOL as vantagens de Rui Rio à direita: «Marcelo tem uma personalidade muito hesitante e Santana tem uma imagem negativa».