Pela forma como tratamos as crianças, podemos avaliar os progressos e as regressões da nossa sociedade em termos de desenvolvimento social e humano. Essa avaliação nem sempre é fácil porque são imprecisos ou inexistentes os termos de comparação. Há 40 anos e em épocas bem mais próximas de nós, a violência doméstica era encarada como um assunto de família. Os crimes daí resultantes não tinham um tratamento jurídico específico e só a partir de 2000 passaram a ser considerados crimes públicos. Tanto no âmbito das agressões sexuais a menores, como nos da violência física e psicológica que eles sofrem em ambiente familiar, o juízo que hoje fazemos pouco tem a ver com o das gerações anteriores.
Enquanto sociedade e enquanto Estado, somos mais exigentes e isso, só por si, representa um importante ganho civilizacional.
Não é diferente o que acontece com a violência sobre os idosos e as mulheres. Dificilmente se pode garantir se estamos melhor ou pior, numa perspectiva histórica, dada a ausência de registos fiáveis de outras épocas, quando o que se passava em cada família a ninguém dizia respeito, nem existia a mediatização dos casos mais chocantes que hoje se verifica.
Daí que muitas vezes se afirme, tal como em relação a outros podres da sociedade – a corrupção, por exemplo – que o número de crimes pode não ter aumentado realmente, mas sim e apenas, a sua descoberta e as notícias sobre eles.
Todas estas explicações são possíveis sem parecerem desculpas esfarrapadas para nos convencermos de que não estamos a regredir, se bem que, pelo menos quanto às crianças e às mulheres, as estatísticas de mortes em anos recentes assinalem uma forte e perturbadora tendência de crescimento. Desemprego, álcool, droga, desestruturação da família, ou a perda acelerada de valores que traz associada a miséria moral, tudo pode servir de explicação.
O que não se justifica nem se admite é que uma criança morra às mãos de familiares porque continuou à sua guarda depois de identificada pelas entidades competentes – no caso, as comissões de protecção de crianças e jovens em risco – a situação de perigo em que se encontrava, como parece ter sido o caso de Bia.
E que, perante cada nova morte, se ouçam queixas dos técnicos dessas comissões invocando a falta de pessoal, sem que o ministro da tutela, sempre pronto a comentar e a avocar as boas notícias, como a de menos uma décima na taxa do desemprego, se sinta na obrigação de dizer uma palavra.
O 'menino-guerreiro'
Na dança precoce das presidenciais, há um nome que sempre se desvaloriza: o do 'menino-guerreiro', que não se resigna nem renuncia a nenhuma oportunidade com que o futuro pareça acenar-lhe. Há muito que Pedro Santana Lopes pôs Belém na sua agenda. Embora militante do 'PPD/PSD', é um franco-atirador. Carrega o fardo de um desempenho como primeiro-ministro bastante desastrado e de uma derrota eleitoral que deu a José Sócrates a primeira maioria absoluta socialista. Foi considerado morto para a política, mas a notícia dessa morte é talvez exagerada. Quem o oiça todas as terças, na SIC-N, percebe que não perdeu a mão. Talvez isso não baste para fazer dele candidato, mas causa danos severos a outros que o pretendam ser. Marcelo que se cuide!…
Coligação para quê?
Em 2011, o PSD e o CDS concorreram em separado e só depois se juntaram numa coligação que vai conseguir o feito inédito de cumprir a legislatura. Mal se compreende, por isso, tanto nervosismo à direita. O método de Hondt pode favorecer, ou não, a aliança pré-eleitoral. Mas se essa aliança tivesse apenas benefícios, Passos e Portas não hesitariam. E compreende-se que hesitem. Amarrados um ao outro, não é certo que voltem ao Governo, mas é garantido que perdem autonomia e identidade. Já do ponto de vista do país, apresenta-se esta vantagem: sem coligação prévia à direita serão mais as hipóteses de se formar um governo, caso não haja maioria absoluta. Apesar das bravatas de Passos e Costa contra qualquer entendimento. E de Portas poder vender mais cara a sua posição. A um ou a outro.