A campanha que o PS devia estar a fazer

A campanha do PS para as eleições de Outubro tem um erro grave de concepção.

Ela estaria certa em 2013, ou mesmo nos princípios de 2014, quando o país estava na fossa e ainda não se via nenhuma luz ao fundo do túnel.

Mas essa época passou.

Vive-se um outro tempo.

As pessoas voltaram a consumir loucamente, o crédito às famílias disparou, as compras de carros idem, o Algarve está a rebentar pelas costuras, a confiança regressou.

Hoje, já não faz qualquer sentido passar a vida a falar da crise.

Na cabeça da maioria das pessoas, a crise já ficou para trás.

Até o desemprego voltou aos valores em que estava antes de este Governo tomar posse.

O PS planeou toda a sua campanha em função de uma realidade que já não existe.

O seu discurso já não se adequa a este novo tempo que estamos a viver.

O PS insiste em falar obsessivamente no desemprego – quando este já está a diminuir.

O PS diz que quer reanimar a economia – quando o PIB, como se sabe, já está a crescer mais do que a média europeia.

O PS ainda fala na renegociação da dívida – quando isso, como se viu na Grécia, é uma perigosa aventura.

O PS deveria ter baseado esta campanha numa ideia muito simples:

– Sim senhor, o Governo evitou um segundo resgate, e isso foi importante, mas vamos agora entrar num novo ciclo, que exige novas soluções e novas pessoas; a missão desta maioria acabou e é tempo de dar o lugar a outros. 

Se dissesse isto, o PS credibilizava-se.

Mostrava-se capaz de reconhecer os méritos do adversário, não poderia ser acusado de dizer mal por dizer mal, mas remetia o PSD e o CDS para o passado – apresentando-se a si próprio como o partido do futuro.

Além disso, os números que vão sendo conhecidos não o atraiçoariam.

Não teria de estar sempre a justificar-se: “É verdade que o desemprego desceu, mas…”, “É verdade que o PIB está a subir, mas…”, “É verdade que as exportações estão a crescer, mas…”, “É verdade que os juros da dívida baixaram, mas…”.

O PS tornou-se o partido do ‘mas’.

Ora, quem sente necessidade de se justificar é porque está na posição fraca.

E é essa a ideia, de facto, que o PS agora transmite: apesar de ser oposição, apesar de enfrentar um Governo teoricamente enfraquecido pela austeridade, o PS parece estar na defensiva.

No fundo, o discurso que António Costa fez aos chineses é que seria adequado: “O país está melhor do que em 2011, é altura de agradecer a quem o conseguiu mas também de começar a escrever uma nova história”.

Insistindo em dizer que ‘está tudo mal’ e que é imperioso ‘mudar de vida’, o Partido Socialista acaba por fazer um discurso que já não tem aderência à realidade – e, pior do que isso, pode assustar muita gente.

As pessoas interrogam-se: se as coisas estão agora a correr melhor, será boa ideia mudar tudo?

Não corremos o risco de voltar para trás?

Já que aqui chegámos, não será preferível continuar no mesmo rumo para ver se nos safamos de vez?

Mesmo os que sofreram muito com a austeridade, pensarão duas vezes antes de apostarem numa mudança que comportará sempre um grau de incerteza.

Um cartaz recentemente colocado ilustra bem os erros que o PS tem cometido nesta pré-campanha.

Ao lado de uma fotografia de António Costa, lê-se a frase: “É tempo de confiança”.

Ora, isto dá ideia de que já estamos a viver um tempo novo, em que a confiança regressou.

E, se assim é, que necessidade há de mudar?

O que o PS queria dizer é que, com António Costa, podemos confiar no tempo que ‘aí vem’.

Mas, para isso, a frase associada à foto deveria ser: “Confiança no Futuro”.

Não será isto evidente?

P.S. – Ao dizer esta semana que se candidatará à Presidência da República, Maria de Belém – mais do que anunciar uma candidatura  presidencial – deu um sinal de que o PS está irremediavelmente dividido. E, assim sendo, António Costa falhou o objectivo que se propôs ao candidatar-se à liderança: unir a família socialista. 

jas@sol.pt