A manhã começou num barco moliceiro com um nome que chamou a atenção do líder da PàF, «onda colossal». Passos ainda está à espera de uma. Para já, conta com sondagens positivas, mas que não permitem cantar vitória, apoio nas ruas, mas não multidões. E, pelo meio, protestos tímidos, queixas de pessoas que sofreram com a austeridade e um ou outro insulto.
Já a comitiva tinha embarcado e da margem uma mulher tentava interpelar o primeiro-ministro, gritando que estava desempregada. Passos foi acenando dizendo que não conseguia falar assim.
Paulo Portas, num distrito onde o CDS é forte, contava com aplausos entusiasmados na margem da ria. Mas não se livrou de uma provocação atirada ao longe. «És muito fixe, mas é porque não há submarinos aí, se não ias ao fundo».
Numa ponte sobre a ria lia-se «Portas, Aveiro está contigo». Uns metros mais à frente, o apoio equilibrava-se «Passos, Aveiro está contigo». Pedro e Paulo não podiam estar mais afinados na campanha e raramente se nota nas ruas ou nos jantares e comícios a diferença entre sociais-democratas e centristas. Mas nas estruturas locais, a história é diferente. «De cada vez que alguma coisa corre mal, vem logo isso ao de cima. O que vale é que o exemplo vem de cima», conta uma fonte da coligação em Aveiro.
Já em terra e por entre uma pequena multidão de apoiantes e bandeiras, um homem gritava insistentemente «ladrões», enquanto Passos e Portas desembarcavam. As palavras eram abafadas por gritos entusiasmados de «Portugal» e «Portas», claramente a jogar em casa. Mas o tom exaltado do homem chamou a atenção de apoiantes e seguranças que o tentaram afastar de forma enérgica do primeiro-ministro.
«Vão-me bater», gritava o homem. «Não vão nada», assegurava Passos, enquanto lhe apertava a mão.
Apostado em que nada corra mal e com vontade de mostrar que está à vontade nas ruas, Passos passeou pelo centro de Aveiro.
Foi lá que encontrou uma professora com quem discutiu longamente a colocação de docentes. E um jovem com que conversou mais de 10 minutos sobre o estado do país, a dívida, «que é como um barco moliceiro que não pode ser travada de repente por causa da inércia», e a emigração de jovens.
Passos até pode ser acusado pela comitiva de ser demasiado «palavroso» e «explicativo», mas não está disponível para mudar de estilo. E tem-se revelado com tempo e paciência para ouvir quem lhe fala e explicar a cada um o que tem andado a fazer.
Passos não tira o fato de primeiro-ministro
O que é certo é que Passos Coelho não tem tirado o fato de primeiro-ministro, mesmo quando o amarrota ou quando o calor aperta e o obriga a tirar o blazer. A pose de Estado está sempre lá e Passos mostra-se como o homem responsável que fez o trabalho que tinha a fazer e não vai em promessas.
A ideia é que o contraste com a figura de António Costa seja o maior possível. Por cada promessa que Costa faz, Passos fala na «velha política» e na «demagogia». Por cada tentativa de Costa de distanciamento e dramatização em torno da governabilidade, Passos fala em «radicalização» e mostra-se «disponível» para compromissos. De cada vez que Costa aparece nervoso ou irritado, Passos apresenta-se paciente a ouvir e a explicar.
Mesmo que os ataques mais fortes e diretos fiquem a cargo de Paulo Portas, no subtexto de tudo o que Passos Coelho faz está um distanciamento de tudo o que António Costa faz.
margarida.davim@sol.pt