Cavaco assegura orçamento

Apesar das declarações de campanha que parecem inviabilizar quaisquer entendimentos  caso não haja maioria absoluta, Cavaco Silva conta ter condições para deixar Belém com um novo Governo em funções e o primeiro Orçamento do Estado aprovado, seja qual for o vencedor das eleições de 4 de outubro.

Em Belém, não se dá crédito a estas afirmações de rutura proferidas em tempo de campanha, já que para os partidos este não será o tempo certo e desejável para se admitirem determinados cenários e caminhos. Por isso mesmo, aguarda-se pacientemente pelo dia 5 de outubro. Mas acompanhando de perto o curso da campanha.

Até porque, caso a coligação Portugal à Frente (PàF) vença as eleições, António Costa não terá condições para continuar à frente do PS – tal como, se os socialistas ganharem, Passos Coelho deverá estar de saída da liderança do PSD. Nesse caso, não serão as atuais lideranças dos partidos a decidir a viabilização do OE para 2016 e é com isso que Belém conta para assegurar a estabilidade política pelo menos até março, altura em que Cavaco Silva abandona a Presidência da República.

Esta semana, os cenários de estabilidade foram postos em causa com  uma frase de António Costa. Questionado sobre a viabilização do OE para 2016 caso a coligação Portugal à Frente ganhe as legislativas, o líder do foi perentório. «É evidente que não viabilizaremos, nem há acordo possível entre o PS e a coligação de direita».

A mensagem fez soar os alarmes face à necessidade de assegurar uma solução  estável,  numa altura em que as sondagens ainda admitem um empate técnico e sustentam que deverá sair um  governo minoritário das legislativas.

Os planos B dos partidos

A última semana também deu pistas para a mudança de liderança no PS e no PSD, em caso de derrota. Uma manchete do jornal i fala de um plano B que entrará em ação logo a seguir às eleições. No PS, Francisco Assis e Pedro Nuno Santos são vistos como os challengers da liderança. E há quem preveja que a atual minoria segurista não deixará de cobrar  de imediato ao secretário-geral o facto de ter apeado Seguro depois de uma vitória nas europeias, que foi caracterizada por Costa como um resultado de «poucochinho».

Se houver uma disputa no PS entre Francisco Assis (capaz de reunir a maioria dos seguristas e setores que agora estão com Costa) e um mais radical Pedro Nuno Santos, um resultado favorável ao primeiro facilitaria entendimentos. «Assis é um moderado, não faz sentido que começasse com uma postura intransigente que levasse o país à ingovernabilidade», diz um social-democrata ao SOL. 

Também no PSD, em caso de derrota, haverá mexidas. «Se perder, Passos não fica. Quem perde é trucidado», analisa de forma implacável um destacado social-democrata. E já não faltam nomes que vão sendo falados para lhe suceder: de Rui Rio a Luís Montenegro, de Marco António Costa a Maria Luís Albuquerque.

Mas mesmo que ficasse depois de tantos apelos insistentes ao consenso, Passos Coelho nunca estaria em condições de criar instabilidade e chumbar o OE para 2016.   

Cavaco baixou expectativas

«Ninguém chumba o primeiro Orçamento do Estado mesmo de um governo minoritário», afirma convicto um ex-líder do PSD.

Do Presidente da República espera-se que chame todos os partidos após as eleições e que, no caso de não haver uma maioria absoluta, tente procurar criar consensos. «Cavaco vai cumprir um calendário previsível e sem qualquer sucesso», antecipa uma destacado social-democrata, que considera que «não há a mínima hipótese de haver qualquer entendimento nem formal nem informal».

Se Cavaco Silva tem a convicção de que não deixará Belém com um  país sem Governo e orçamento, também é certo que as expectativas na Presidência vão baixando e a ideia de um bloco central já nem se coloca. 

Cavaco registou esta semana   que, «comparando com campanhas anteriores, parece muito claro que o nível de crispação e de tensão é muito menor». E, questionado sobre se o tom mais moderado desta campanha poderia indiciar um caminho para o consenso, o chefe do Estado disse pensar que todos vão «aprendendo alguma coisa nesta matéria». 

Na coligação, são várias as fontes que afinam pelo mesmo diapasão. Mas, acima de tudo, na direção da PàF acredita-se que Cavaco Silva «é previsível» e dará posse a um governo do partido que se apresente com mais mandatos no Parlamento, insistindo depois na tese da necessidade de entendimentos. E essa é uma solução que encaixa à medida nas expectativas da PàF.

Passos deixa a porta aberta

Passos tem, aliás, tido o cuidado de deixar sempre aberta a porta da negociação e dos entendimentos. E ontem deixou sinais de ir ainda mais ao encontro dos apelos do PR. O líder da coligação assegura que PSD e CDS vão continuar «dispostos a dialogar com todos os partidos que tenham assento no Parlamento e queiram ajudar a fazer um Portugal melhor» e «abertos a estabelecer compromissos importantes».

Mas também deu eco às palavras do Presidente no que toca a deixar de lado a crispação. «Lanço daqui, por isso, a todos os partidos que concorrem connosco às eleições, um desafio para que usem a campanha eleitoral para mostrar as suas diferenças, para apresentar as suas propostas, que deixem de parte o insulto ou a insinuação». A frase é uma citação de Passos no almoço em Mirandela, mas podia ser retirada de um discurso do Presidente da República.

E com este discurso espera também convencer o eleitorado moderado do centro de que votar na coligação será a única forma de garantir que o país será governável depois de 4 de outubro.

Na primeira semana de campanha, «diálogo», «concertação social» e «consenso» têm sido palavras repetidas em quase todos os discursos. O líder do PSD  está convencido de que é possível fazer pontes com o PS e até já as identificou naquele que tem sido, curiosamente, o tema que mais tem servido para separar as águas eleitorais: a Segurança Social.

*com Manuel Agostinho Magalhães e Margarida Davim