No texto que enviou à Assembleia da República pedindo àquele órgão que reaprecie o diploma, Cavaco explica em 13 pontos as dúvidas que lhe suscita a adoção gay, sublinhando que “é consensual que, em matéria de adoção, o superior interesse da criança deve prevalecer sobre todos os demais, designadamente o dos próprios adotantes”.
Cavaco defende, por isso, que “o argumento segundo o qual a solução normativa agora aprovada resultaria de uma imposição constitucional ou legal é desprovido de sentido, uma vez que o princípio da igualdade não impõe necessariamente a solução agora consagrada”.
“Está, ainda, por demonstrar em que medida as soluções normativas agora aprovadas promovem o bem-estar da criança e se orientam em função do seu interesse. Com efeito, um grupo de reputados juristas e professores de Direito que remeteu uma exposição sobre o Decreto em causa à Presidência da República, sustenta que o regime foi aprovado ‘com base em fundamentos descentrados da tutela jurídica destas crianças’”, escreve Cavaco Silva na nota enviada ao Parlamento.
Para sustentar a sua tese, o Presidente recorda mesmo o processo que levou ao chumbo da co-adoção gay durante a legislatura anterior, quando PSD e CDS estavam em maioria no Parlamento, lembrando que esse diploma suscitou grande debate na sociedade e levantou sérias dúvidas, apesar de se tratar de um regime muito menos amplo do que aquele que foi agora aprovado.
Recorde-se que a co-adoção previa que um dos membros de um casal homossexual pudesse adotar uma criança em relação ao qual o outro momento do casal tivesse já a guarda, fosse por adoção ou por filiação biológica.
“Ora, e contrariamente ao que sucedia no caso da co-adoção, o Decreto em apreço introduz uma alteração radical e muito profunda no nosso ordenamento jurídico, permitindo a adoção plena e irrestrita a casais do mesmo sexo, o que sempre havia sido excluído pela legislação em vigor, mesmo naquela que, sublinhe-se, aprovou a possibilidade de casamento entre pessoas do mesmo sexo”, aponta Cavaco que quer “assegurar que uma alteração tão relevante numa matéria de grande sensibilidade social não entre em vigor sem ser precedida de um amplo e esclarecedor debate público, que envolva múltiplas correntes sociais e especialistas em diversos domínios com vista à consagração da solução normativa que, consensualmente, garanta que nos processos de adoção seja acautelado prima facie o superior interesse dos menores”.