O debate do Orçamento, ou melhor, a geringonça vs. a caranguejola

No encerramento do debate da especialidade sobre o Orçamento do Estado para 2016, esquerda e direita confrontaram-se em dois blocos. O PS e os partidos que suportam o governo elogiaram um orçamento que repõe rendimentos; o PSD e CDS criticaram o aumento de impostos e deixaram a previsão de que o Orçamento não se cumprirá,…

E se a direita tinha já uma alcunha para o adversário — a geringonça — coube ao socialista Carlos César equilibrar o jogo: CDS e PSD são, a partir de agora "a caranguejola", uma traquitana frágil, segundo o dicionário. 

"Da 'caranguejola' da direita, que se desconjuntou, foi o PSD que ficou a pé mas não de pé: não quis servir quem o elegeu, nem quis servir para o que foi eleito. Ficou à porta da democracia", criticou o líder parlamentar do PS.

A acusação ao PSD por se ter abstido de apresentar propostas ao OE foi repetida à esquerda. Mariana Mortágua disse que "o PSD provou ser absolutamente inútil ao país" e que o partido de Passos Coelho "acha que a política só vale uma pirraça". 

"O PSD está em estado de negação", disse por seu turno João Oliveira. Já "no CDS a ordem é para limpar rapidamente a imagem e apagar todos os vestígios do passado", esquecendo o que fizeram no governo, "nem que para isso tenham de sacudir o ex-parceiro de coligação", acrescentou o líder da bancada comunista.

CDS ironiza com "o homem-geringonça"

Em matéria de neologismos de arremesso político, o CDS também inovou. Telmo Correia inventou o "homem-geringonça", uma espécie de "homem novo socialista" que, para escapar ao aumento de impostos sobre os combustíveis, que penalizam todos os produtos de consumo, acabaria reduzido a uma agricultura de subsistência.

Telmo Correia foi o escolhido pelo CDS para uma dura intervenção de encerramento. Curiosamente minutos antes, Assunção Cristas foi toda sorrisos com António Costa, quando o primeiro-ministro lhe ligou para a cumprimentar pela eleição como líder do CDS. A apreciação que Telmo Correia fez do OE, pelo contrário, não provocou sorrisos à esquerda.

O deputado centrista diz que o OE faz uma "inversão de marcha" da anterior governação e que é "um erro colossal". "Este Orçamento é de facto, ao mesmo tempo, um risco para a nossa credibilidade e traz mais austeridade". E é "uma ilusão" de que é possível "dar tudo" e "cumprir as regras e fechar contas". Há mais austeridade para as empresas e as famílias – o OE é "um exercício estatista de um Governo 'familiófobo'" – ficou mais este neologismo.

Luís Montenegro, pelo PSD, justificou falta de apresentação de propostas, negando que o PSD esteja amuado ou a fazer birra. "A nossa atitude foi cristalina: votámos contra na generalidade e abstivemo-nos em todas as alterações, permitindo que as esquerdas se encontrassem sem queixumes".

Este é o orçamento das esquerdas, não do PSD, que cria austeridade e faz "o mais brutal aumento dos impostos sobre os combustíveis da história" do país. OS social-democratas ficam à margem e à espera do "dia em que o Governo e o primeiro-ministro não tiverem o apoio" de PCP, BE e PEV. 

"Se e quando a vossa maioria ruir, desaba naturalmente o poder que foi constituído pelo vosso conluio parlamentar", disse Luís Montenegro, exigindo a demissão de Costa, quando o apoio da esquerda lhe faltar.

"Não vendemos ilusões", responde Centeno

O ministro das Finanças, que fez a intervenção de encerramento pelo Governo, reagiu às críticas de irrealismo do Orçamento. "Não vendemos ilusões, nem apresentamos quimeras, porque medimos económica e financeiramente todas as propostas", garantiu Mário Centeno. 

Este é "um Orçamento melhor", em que "a receita dos impostos directos cai", com menos 320 milhões para as famílias e menos 70 milhões para as empresas". E que faz uma gestão orçamental "equilibrada e rigorosa", através de "escolhas" com impacto na economia, como a do aumento dos impostos indiretos, que "desincentiva o crédito escessivo". 

Centeno disse ainda que "ao contrário do que tem sido dito, este não é um orçamento irrealista". 

A meta para 2016 "é de um défice de 2,2% e de uma dívida pública de 127,7% do PIB". No final do ano, Portugal "vai sair, agora sim, do Procedimento por Défice Excessivo", previu. No entanto, "a fase que se inicia agora é de enorme responsabilidade para todos. Repito: para todos".