Alinhados em quase tudo, Passos Coelho e Assunção Cristas não deixam de competir entre si. Ontem, os líderes disseram quase a mesma coisa e falaram quase ao mesmo tempo, atropelando a combinação prévia que tinha havido entre os dois partidos e deixando os centristas com a sensação de que a direita queimou cartuchos.
“Devíamos ter feito isto em fins de semana diferentes”, lamentava ao i uma fonte do CDS. Mas Cristas não desiste de marcar a agenda da oposição e já tem um plano para o conseguir: um segundo ato desta reentré centrista agendado para o próximo sábado. “Vai ser um comício popular em Oliveira do Bairro, com direito a porco no espeto e tudo”, revela a mesma fonte.
O menu está definido, mas o prato forte vai ser o ataque à política das “esquerdas unidas” que ontem serviu de mote à líder do CDS e que em tudo se alinhou com o discurso do líder do PSD. À direita a mensagem está bem oleada. “Esta solução [governativa] está condenada ao fiasco e ao fracasso”, sublinhou ontem Passos, porque – como apontou Cristas – o atual governo está “dependente de partidos que glorificam modelos que nunca trouxeram riqueza” e que “desconfiam do investimento privado, das empresas, das pessoas, da sua iniciativa, da sua capacidade”.
PSD e CDS
atropelam-se Pedro Passos Coelho e Assunção Cristas estão tão sintonizados no conteúdo, que quase completam as frases um do outro. O único problema foi mesmo sincronizarem o timing das intervenções com que ambos encerraram ontem as iniciativas das respetivas jotas que marcam a reentré política à direita.
Passos e Cristas tinham combinado que caberia à centrista começar a falar por volta das 12h15, começando a intervenção do social-democrata cerca de meia hora depois para que não houvesse atropelos. A combinação falhou, segundo uma fonte do PSD, porque as intervenções que antecederam as do líder foram mais curtas do que o previsto.
O gabinete de Passos ainda enviou um SMS ao ‘staff’ de Assunção para a avisar de que o discurso do social-democrata estava a começar antes do previsto, mas isso não impediu um certo incómodo entre os centristas que, naquele momento, perderam os diretos das televisões para o que se estava a passar no encerramento da Universidade de Verão do PSD em Castelo de Vide.
O deslizar dos tempos de intervenção não chega a ser um caso, mas mostra bem que à direita a coordenação – que ainda existe entre os dois partidos – não chega para apagar uma certa picardia. Desta vez, Assunção Cristas perdeu uns minutos de diretos televisivos, que procurará compensar na próxima semana com o evento programado para Oliveira do Bairro.
Mais importante que isso, é o facto de PSD e CDS partirem para as semanas em que se irá debater o Orçamento do Estado com a ideia forte de que o governo das esquerdas não virou a página da austeridade e que a forma como o PIB teima em não crescer é a prova de que o modelo económico desenhado por António Costa e Mário Centeno não está a resultar num dos seus principais objetivos que é o de estimular o consumo privado.
“É à classe média que a esquerda radical vai buscar o dinheiro”, atacou Assunção Cristas, que considera que a “festança” da esquerda está a ser feita à custa de mais impostos. “Aumentou-se a carga fiscal sobre os portugueses, aumentaram-se impostos e procuram-se pretextos uns atrás dos outros para tributar património, como o IMI ou o imposto sobre os combustíveis. Agora até querem cortar parcialmente a isenção de Imposto Único de Circulação para pessoas com deficiência acima dos 60%!”, denunciou Cristas, enquanto Passos Coelho em Castelo de Vide avisava Costa de que não poderá contar com o PSD para ser “cúmplice de uma solução em que o país tenha de passar por novos sacrifícios”.
O recado de passos Passos trouxe, contudo, uma nuance importante que é um recado interno para quem no PSD pensa em pôr em causa a sua liderança. “O verdadeiramente importante não é termos pressa de regressar ao poder, ao governo, para nos desforrarmos, para voltarmos a ser o que já fomos, isso não interessa nada”, avisou, baixando a fasquia para as autárquicas de 2017 e deixando claro que começa a ver como mais provável que a geringonça dure até ao fim da legislatura. É o regresso do “que se lixem as eleições”.