Educação. Parlamento chumba em peso proposta do CDS da lei de bases

Centristas são o primeiro partido a apresentar propostas que alteram a fundo o sistema educativo. Mas são vários os pontos que provocam a discórdia de todos os partidos com assento parlamentar

O parlamento vai rejeitar hoje em peso o projeto-lei do CDS que fazia alterações de fundo no calendário escolar, na organização dos ciclos escolares e no acesso ao ensino particular e cooperativo.

Há 30 anos que a Lei de Bases do Sistema Educativo não sofre alterações profundas e a proposta dos centristas é a primeira que, nos últimos anos, vai ser debatida e votada no parlamento, em debate potestativo (de caráter obrigatório) – o primeiro do CDS nesta sessão legislativa.

Mas entre as propostas de alteração aos 28 artigos da lei-mãe do sistema educativo, são vários os pontos rejeitados por todos os partidos com assento parlamentar, apurou o i.

O PSD, que vai optar pela abstenção, lembra ao i que o Conselho Nacional da Educação (CNE) tem um grupo de trabalho que vai apresentar propostas para a revisão da mesma lei, que resultam de um amplo debate com vários agentes do setor da educação. Por isso, explica fonte social-democrata, “devemos aguardar pelas conclusões que serão apresentadas” pelo CNE, órgão consultivo do Ministério da Educação. Além disso, os sociais-democratas também se preparam para apresentar a sua própria proposta depois de uma discussão “consensual e alargada” no fórum de políticas sociais do partido.

Já os partidos de esquerda – PS, Bloco de Esquerda e PCP – vão optar pelo voto contra. Desde logo, apurou o i, pelas “divergências profundas” já conhecidas quanto ao papel do Estado no acesso à educação, na escola pública e no ensino privado. Recorde-se que os partidos de esquerda defendem que a prioridade do Estado é o acesso à escola pública e defendem a racionalização dos apoios públicos ao ensino privado, como é o caso dos contratos de associação. Por sua vez, o CDS defende que as famílias devem ter liberdade de escolha na escola onde querem colocar os seus filhos, seja pública ou privada, sendo apoiadas pelo Estado (o chamado cheque-ensino).

Além destas divergências, fonte socialista refere que o partido também aguarda as propostas do CNE e sublinha ao i que o projeto-lei dos centristas introduziria alterações “perigosas” na organização dos ciclos escolares, permitindo que os alunos entrassem para a via profissional do ensino “a partir do 7.o ano de escolaridade”.

Contactada pelo i, a deputada do CDS Ana Rita Bessa confessa que o chumbo do parlamento “não surpreende, mas dececiona”. Para o CDS, a rejeição da proposta revela que ou os partidos “entendem que a lei está ótima assim ou que, por alguma razão, não querem dar a conhecer as suas ideias a curto-médio prazo” para a educação, remata Ana Rita Bessa.

A intenção dos centristas era, explica a deputada, “lançar um debate sobre a lei no sítio certo, que é o parlamento”. Ana Rita Bessa reconhece ainda que a proposta “é o espelho do CDS e tem as suas características mas que, em sede de especialidade, seria passível de ser alterada com os contributos dos outros partidos”.

O que diz a proposta?

O CDS defende que o sistema de ensino deve ser dividido em apenas dois ciclos de seis anos na escolaridade obrigatória: um do 1.o ao 6.o ano, apenas com um professor, e outro ciclo do 7.o ao 12.o, em vez dos atuais 1.o, 2.o, 3.o ciclo e ensino secundário. O objetivo é, diz a proposta, “eliminar a excessiva segmentação potenciadora do insucesso escolar”.

Outra das grandes alterações prevista no projeto-lei passaria por aplicar as mesmas regras de avaliação dos alunos e do currículo das disciplinas durante ciclos de seis anos, além dos quatro anos dos mandatos governativos. Só assim, defendem os centristas, é possível conseguir estabilidade num setor em que “cada vez que muda um ministro mudam todas as políticas”, salienta ao i Ana Rita Bessa. A deputada frisa que as constantes alterações na Educação são “a queixa mais forte” que o partido recebe das escolas.

A proposta defende ainda “o alargamento dos contratos simples, enquanto instrumento de liberdade de escolha para as famílias” – ou seja, alargar o apoio do Estado às famílias que têm crianças em escolas privadas.

Outra das alterações previstas na proposta passaria também pela redução do período de férias escolares. Para o CDS, as férias de verão deveriam ter no máximo oito semanas consecutivas, de forma a atender “melhor às necessidades de conciliação família-trabalho”.

Há mais de um ano que o Conselho Nacional de Educação, presidido pelo antigo ministro David Justino, está a rever a lei fundamental do sistema educativo. Esta foi, aliás, a primeira prioridade assumida por David Justino quando foi nomeado pelo parlamento presidente do CNE, que tem vindo a realizar vários debates onde já participaram 11 ex- -ministros da Educação de todas as cores políticas.

Justino diz que a lei está “desadequada e desenquadrada” da atual realidade educativa e que é preciso afinar “o que ensinar e como ensinar”, e “melhorar os resultados e a equidade no acesso” à educação.