O BE está preparado para aceitar o fim faseado da sobretaxa de IRS. Tudo vai depender do ritmo de eliminação deste imposto nos escalões mais baixos que ainda o pagam, pelo que os bloquistas não querem assumir já publicamente a disponibilidade para aceitar a medida. Mas o i sabe que o partido está preparado para fazer essa cedência.
Uma das razões para isso passa pela margem de manobra política que existe para o fazer. Não ficou escrito no compromisso assinado entre o BE e o governo que a sobretaxa acabaria para todos em 2017. Ora, estando fora do acordo, não há motivo para a rutura. E, de facto, no BE valorizam-se mais as conquistas alcançadas pela solução de governo à esquerda do que cedências em matérias que estão fora do acordo assinado.
O conhecimento dessa posição dos bloquistas deu a António Costa conforto para a declaração que fez ainda na China. “Iremos cumprir, seguramente no próximo ano, o compromisso de eliminar a sobretaxa. Mesmo que esse compromisso não seja integralmente cumprido no dia 1 de janeiro”, dizia Costa horas antes de aterrar em Lisboa para o Conselho de Ministros sobre o Orçamento do Estado.
A disponibilidade do BE para aceitar que a sobretaxa não acabe logo em janeiro do próximo ano – como prevê a lei aprovada no parlamento – não significa, porém, que as negociações à esquerda para a aprovação do Orçamento do Estado de 2017 estejam mais fáceis.
Além de quererem conhecer a que ritmo será eliminada a sobretaxa de IRS, os bloquistas precisam também de saber em que pé estão os aumentos que reclamam nas pensões e o desenho final do imposto sobre património imobiliário global, que ainda está por definir.
Desde terça-feira à noite que o BE espera por uma contraproposta do governo, depois de terem nessa reunião entregue um documento com as suas propostas.
As vitórias do BE
Ontem, os bloquistas esperavam que terminasse o Conselho de Ministros – que começou às 9h30 da manhã e se foi prolongando até ao princípio da noite – para perceberem se ainda iriam reunir com o governo durante a noite ou se o encontro ficaria adiado para hoje de manhã.
Entre as medidas que o BE apresenta como formas para aumentar a receita está uma ideia saída do grupo de trabalho sobre reestruturação da dívida que reúne bloquistas e socialistas: reclamar para Portugal os lucros que o Banco Central Europeu faz com a venda de dívida pública portuguesa.
Os bloquistas continuam também a insistir no imposto sobre património imobiliário global. Mas, ontem, uma fonte socialista garantia ao i que “o desenho final da medida não está fechado, falta definir patamares e taxas”. Em cima da mesa estava já, contudo, a ideia de tributar o património imobiliário global das empresas acima dos 250 mil euros, mas isentando instalações usadas para indústria, serviços e hotéis – ou seja, introduzindo tantas isenções que, na prática, a margem para conseguir receita é pequena.
É nesse jogo, entre a necessidade de não criar medidas que hostilizem os investidores e conseguir novas fontes de receitas, que se faz a negociação à esquerda.
Pelo meio, os bloquistas valorizam as vitórias que já alcançaram e que estão sobretudo no dossiê das rendas da energia. Graças a essa negociação, a tarifa social da água passará a ser automática para as famílias de menores rendimentos e há também medidas que tornaram mais baixa a fatura da energia. Uma dessas medidas passa por obrigar a apreciação parlamentar os projetos de investimento das redes de eletricidade e gás natural, evitando investimentos supérfluos ou exagerados, como o BE acredita terem sido alguns dos que têm sido feitos nos últimos anos.
Estes ganhos na área das energias poderão fazer aumentar o rendimento disponível das famílias, mas não terão impacto orçamental: não aumentam a receita nem diminuem a despesa, apenas reduzem a tarifa energética.
ORÇAMENTO “CONSERVADOR
"Uma coisa é certa: a única meta ambiciosa no quadro macroeconómico do Orçamento que Mário Centeno está a desenhar é a do défice. Centeno prevê fechar 2017 com um défice entre os 1,7 e os 1,8%, muito abaixo dos 2,5% previstos para este ano.
As restantes previsões são – como classifica uma fonte do PS – “conservadoras”. Centeno estima que o país cresça 1,5%, o que corresponde a uma aceleração de apenas três décimas. Também conservadora é a estimativa para as exportações, que devem subir 4%. E para o desemprego, que deve descer dos 10,8% – que se preveem para o fim deste ano – para os 10,4%.
Com o governo a assegurar que “a carga fiscal vai baixar”, a solução para baixar o défice passa por um forte controlo da despesa, mas também pelos efeitos positivos que o executivo espera obter da subida do emprego e do aumento do rendimento disponível das famílias.