Mário Soares foi o único presidente da República a ser convidado para a tomada de posse de Václav Havel, o primeiro presidente checo, protagonista da Revolução de Veludo, em 1989. Hoje, a Embaixada da República Checa e a Fundação Mário Soares inauguram às 18 horas a exposição “50 mil rosas para a Revolução de Veludo. A amizade entre Mário Soares e Václav Havel”.
A história das 50 mil rosas começa no Porto, onde um grupo de “jovens profissionais”, médicos, agricultores, empresários, etc., decide num jantar ir a Praga assistir ao vivo à revolução que estava nas ruas a derrubar o regime comunista. Mário Soares referir-se-á sempre a eles como “os rapazes”.
O social-democrata José Pedro Aguiar- -Branco, ex-ministro da Defesa, estava nesse grupo. Na época era presidente dos jovens advogados e viveu nesse outubro de 1989 “um momento único” e “emocionalmente marcante”. “É o segundo momento mais importante a seguir ao 25 de Abril. Estivemos em Praga nos dois meses que antecederam a queda do comunismo. Quando vamos visitar Václav Havel a Praga, em outubro de 1989, dois meses depois dava-se a queda do regime comunista e Havel tornava-se presidente da República. Nós fomos lá em outubro e o ambiente era semelhante ao que se tinha vivido em Portugal em 1974, com um cariz político diferente. Era o reverso da medalha. Aqui era a queda de um regime ditatorial de direita, lá era a queda de um regime ditatorial de esquerda. Lembro-me até que Václav Havel, na altura, falou ao telefone com Mário Soares e na conversa tentava explicar a Mário Soares que estavam contra o socialismo, mas que o socialismo não era aquele que tinha expressão num socialista como Soares.”
Essa conversa telefónica marca o início de uma bela amizade. Outro dos “jovens profissionais” presente era Álvaro Beleza, presidente da Associação dos Jovens Médicos, que pôs Soares ao telefone com Václav Havel. Como Soares só falava francês e Havel inglês, Beleza serviu de tradutor.
“Foi a maior aventura da minha vida”, diz Álvaro Beleza ao i. O grupo de cerca de dez jovens onde estavam, além de Aguiar-Branco e Álvaro Beleza, os médicos Diogo Cabrita e Isabel Pedroto, o presidente dos jovens agricultores José Campelo e o presidente dos jovens empresários Paulo Barros Vale, entre outros, decide de um dia para o outro ir assistir à revolução que estava na rua e levar 50 mil rosas a Praga. Contactam o Presidente da República, Mário Soares, e o primeiro-ministro, Cavaco Silva, que não os deixam sair do país sem a companhia de um elemento dos serviços de segurança. A empresa era arriscada: na véspera da chegada do grupo de portugueses, a polícia tinha matado três manifestantes.
Beleza lembra-se do momento em que distribuíram as rosas – numa manifestação organizada pelo Fórum Cívico checo para receber os portugueses, que encheu a Praça Venceslau – e um homem de 70 anos, que tinha assistido à entrada dos tanques soviéticos em 1968 para acabar com a Primavera de Praga, chorou. “Foi uma coisa muito comovente”, diz. O médico Diogo Cabrita, cirurgião no Centro Hospital e Universitário de Coimbra, lembra a chegada de Václav Havel, escondido na parte de trás de uma ambulância, ao bar Redut, perto da Praça Venceslau, onde foram ter os portugueses. É depois que é marcada a manifestação. Diogo Cabrita escreve o discurso que, depois, Beleza vai ler às massas, curto, em inglês: “Nós estamos a abrir uma autoestrada da liberdade que una Lisboa a Praga. A Revolução de Veludo é mundial.”