PS leva Domingues e Centeno à AR… mas com regras diferentes

O PS apresentou um requerimento para ouvir António Domingues e Mário Centeno, depois de ontem se ter juntado a BE e PCP para inviabilizar a audição dos dois na Comissão de Inquérito à Caixa Geral de Depósitos. Parece contraditório? Mas não é.

O requerimento socialista é para uma audição na Comissão de Finanças, que não está sujeita às mesmas regras que existem numa comissão de inquérito.

Numa comissão de inquérito, quem é chamado a depor não se pode recusar a ir, responde a perguntas diretas e não pode negar-se a responder. Mas há mais: o regime jurídico que regula as comissões de inquérito faz com que mentir seja crime. Caso as declarações feitas venham a ser contraditadas por outras declarações ou documentos pode estar em causa uma participação ao Ministério Público pela prática do crime de falsas declarações.

Ora, nenhuma destas regras se aplica às comissões permanentes que existem na Assembleia da República. E é numa dessas comissões, a de Orçamento e Finanças, que Domingues e Centeno deverão ser ouvidos ao abrigo deste requerimento apresentado pelo PS.

Guerra de requerimentos entre PSD e esquerda

Ontem, a ida de António Domingues e Mário Centeno causou polémica no Parlamento, depois de várias tentativas frustradas do PSD para ouvir o demissionário administrador da CGD e o ministro das Finanças sobre o caso que levou à saída da administração.

O PSD começou por apresentar um requerimento para a audição na Comissão de Inquérito à Caixa que foi chumbado. Para ultrapassar o chumbo da esquerda os sociais-democratas fizeram um requerimento potestativo que em tese não poderia ser travado pelas restantes bancadas, já que se trata de uma figura regimental segundo a qual cada partido tem um número limitado de requerimentos que pode impor sem votação.

O problema foi que o PCP levantou uma objeção à mesa da Comissão de Inquérito, pedindo que o presidente analisasse se as audições requeridas pelo PSD cabiam ou não no objeto da dita Comissão.

O presidente da Comissão de Inquérito, o social-democrata Matos Correia, entendeu que sim. Mas o PS apresentou um recurso da decisão de Matos Correia ao plenário da Comissão de Inquérito que deverá ainda ser analisado na próxima terça-feira quando a Comissão voltar a reunir.

Como a esquerda está em maioria e BE e PCP anunciaram que iriam votar favoravelmente o recurso socialista, é quase certo que será chumbada na terça-feira a pretensão social-democrata de ouvir Domingues e Centeno.

A atitude da esquerda levou, ontem, o social-democrata Hugo Soares a acusar PS, BE e PCP de se estarem a comportar como uma “força de bloqueio” e um “rolo compressor anti-democrático”, já que o PSD entende que o objeto da Comissão de Inquérito é a gestão da CGD e recorda mesmo que Domingues já foi ouvido por essa mesma razão naquele órgão.

PS defende que ouvir Domingues viola objeto da Comissão de Inquérito

Hoje, o porta-voz socialista veio anunciar que o PS quer ouvir António Domingues, mas continua a achar que a audição não deve decorrer numa Comissão de Inquérito que deve tratar de factos do passado da Caixa – esse foi, aliás, o âmbito que foi definido para os trabalhos depois de uma polémica que só acabou com um parecer dos serviços jurídicos do Parlamento, pedido por Ferro Rodrigues, que esclareceu que as comissões de inquérito só tratam de atos do passado, razão pela qual o processo de recapitalização ficou fora da análise deste órgão.

“Não tem como objetivo ser uma comissão aberta para o futuro. É sobre o passado da CGD e o que nos trouxe até aqui. Não podemos ter uma comissão de inquérito sem objeto definido em que, de cada vez que há uma notícia sobre a CGD ou um ato de gestão que deputados entendam dever ser escrutinado – isso não cabe numa comissão de inquérito, sob o risco de a tornar permanente”, afirmou João Galamba, que voltou a considerar “nulos” os “requerimentos do PSD para ouvir estas personalidades na comissão de inquérito”, uma vez que violam “o objeto daquela comissão”.