O anúncio dos salários ganhos pelos CEO das empresas do PSI20 em 2016 fez Marcelo Rebelo de Sousa defender que é preciso “debater seriamente o problema” das disparidades salariais. À esquerda, as ideias já existiam antes do repto do Presidente da República e devem voltar à agenda. Hoje, PCP e BE debatem no parlamento a contratação coletiva como forma de reduzir as desigualdades e os bloquistas anunciam “para breve” um projeto para definir um máximo para os salários nas empresas.
O PS foi o primeiro a aprovar na Comissão Política Nacional uma proposta da JS para combater as disparidades de vencimentos. A moção foi aprovada em março, mas o autor da ideia, João Torres, admite que de lá para cá “ainda não se avançou em nada concreto”.
A proposta da JS admitia a criação de um rácio que estabelece o número de vezes que o salário mais alto de uma empresa – pública ou privada – poderia ultrapassar o valor mais baixo pago pela mesma organização, deixando em aberto a possibilidade de aplicar sanções a quem excedesse esse valor.
“O texto inicial previa que houvesse um agravamento da TSU para as empresas que excedessem esse rácio nos salários mais elevados, mas a moção que foi aprovada deixou em aberto o tipo de penalizações”, explica o deputado João Torres.
Para já, os socialistas – pela voz do novo líder da JS, Ivan Gonçalves – comprometem-se apenas com a “realização de um estudo aprofundado sobre as desigualdades salariais gritantes que há em Portugal”.
JS aplaude Marcelo
Ivan Gonçalves acredita, porém, que “foi importante o Presidente vir defender uma posição que vai ao encontro da ideia da JS” e que isso pode ajudar o PS a legislar nesse sentido, mesmo que, por enquanto, ainda não esteja nada definido.
No BE já está bem definida a ideia de que é preciso estabelecer um rácio que limite os vencimentos mais elevados, mesmo que ainda se esteja a estudar qual e de que forma poderá ser aplicado.
“É preciso olhar bem para o âmbito da proposta, ver como ela se pode concretizar e quais as sanções que poderão ser aplicadas”, diz ao i deputado bloquista José Soeiro, que anuncia que o seu partido irá apresentar “muito em breve” uma proposta, que até pode assumir a forma de ante-projeto “para poder acolher outras ideias”.
Para já, José Soeiro tem estado a estudar o caso da Suíça, onde a ideia de um salário máximo nacional foi referendada e rejeitada pela maioria. Mas há também o caso de Israel, onde o governo de direita do Likud estabeleceu tetos máximos de vencimento para os banqueiros.
Enquanto consultam juristas e outros especialistas para desenhar este projeto, os bloquistas – tal como os comunistas – entendem que há outras formas de tirar Portugal do grupo da frente (quarto lugar) no ranking dos países da União Europeia onde é maior a diferença entre os mais bem pagos e os mais mal pagos.
a receita de be e pcp Uma das vias para o fazer, entendem BE e PCP, passa por desbloquear a contratação coletiva. “Em muitos casos, os contratos coletivos de trabalho estabelecem aumentos salariais anuais que ajudam a combater as desigualdades”, lembra Rita Rato do PCP, que hoje vai voltar a pedir o fim da caducidade dos contratos coletivos e a reposição do princípio do tratamento mais favorável.
O aumento do salário mínimo nacional é outro instrumento defendido por BE e PCP para diminuir as desigualdades. “O último relatório da OIT revela que o aumento da produtividade não se tem repercutido nos salários”, aponta José Soeiro, lembrando que “o salário mínimo se tem convertido numa espécie de salário nacional” e que a contratação coletiva é uma forma de inverter essa tendência.
Rita Rato assume mesmo que a redução de TSU que chegou a estar acordada entre o governo e os patrões como forma de compensar a subida do salário mínimo nacional este ano para os 547 euros teria “um efeito perverso”.
“Outra forma de diminuir as desigualdades é combater o trabalho precário”, acrescenta Rita Rato, frisando que muitas vezes “os mais mal pagos nas empresas são os trabalhadores temporários”.
O que o PCP não propõe é um salário máximo nacional, como os bloquistas estão a estudar e como a JS pretende. A única proposta comunista nesse sentido – chumbada por PS e PSD – era de repor um teto de vencimento para os gestores públicos fixado em 90% do salário do Presidente da República.
PSD contra limites
No PSD, defende-se que a solução passa por “criar mais riqueza para melhorar a sua distribuição”.
Pedro Roque explica que “a solução realista não é estar contra os ricos, mas acabar com os pobres”. O social-democrata lembra que as empresas atuam “num mercado livre e não é possível proibi-las de competir pelos melhores gestores, oferecendo os melhores salários”, pelo que o caminho será sempre o de tentar “subir os salários mais baixos”.