O problema persiste desde as autárquicas, quando o PS subtraiu o Partido Comunista em várias câmaras históricas. Que partido é que está a “lucrar” com o sucesso da geringonça? Depois das autárquicas, o Comité Central do PCP reconheceu que ficou evidente que o eleitorado de esquerda não ganhou “a consciência de que as possibilidades de ir mais longe e seguir em frente seriam sobretudo asseguradas com o reforço da CDU e não do PS”.
Obviamente, a menorização do papel dos comunistas no quadro da solução governativa é uma das maiores preocupações do partido. Na última edição do “Avante!”, o jornal oficial do PCP, o editorial faz uma violenta crítica à comunicação social por “permitir que outros, em particular o governo do PS, capitalizem o resultado das medidas aprovadas [no Orçamento de Estado para 2018]”.
Sem atacar o governo, o editorial arranca com uma dura diatribe contra “a comunicação social dominante”. O parágrafo completo é o seguinte: “A comunicação social dominante persiste na sua agenda mediática para condicionar a opinião pública e desviar atenções dos avanços alcançados com a aprovação do Orçamento do Estado para 2018. Explorando uma sucessão de ‘factos’ que se prestam à instrumentalização política procura branquear as grandes responsabilidades do PSD e do CDS pelos graves problemas que o país vive, atacar o PCP e silenciar o seu determinante papel e contributo para os avanços neste Orçamento de Estado e, ao mesmo tempo, permitir que outros, em particular o governo do PS, capitalizem o resultado das medidas aprovadas”.
No dia seguinte à ida para as bancas do “Avante!”, reagindo à promulgação pelo Presidente do Orçamento do Estado, os comunistas colocam o PS no pacote dos “partidos da direita”. “Nos limites e insuficiências do Orçamento do Estado para 2018, estão bem visíveis, as opções estruturais do PS e que convergem com opções e práticas do PSD e CDS”, afirma o PCP, em comunicado, onde também insiste em que “a resposta aos problemas do país não está no regresso a um passado de agravamento da exploração e do empobrecimento, não está na continuação da política de direita seja pela via do PS, seja por via do PSD ou do CDS, seja ainda em torno de um aclamado consenso entre estes partidos que consagraria tal política”.
Enquanto o Bloco de Esquerda saudou a mensagem de Natal do primeiro-ministro – centrada nos traumas dos fogos de Pedrógão e de outubro e na recuperação da economia – os comunistas foram muito mais duros. “Se o governo continuar amarrado às metas para redução do défice ou a pagar dívida a este ritmo dificilmente terá recursos para cumprir objetivos como revitalizar o interior ou avançar com o reordenamento da floresta. Depois faltarão meios humanos e financeiros, sobrando apenas promessas”, disse o membro da Comissão Política do Comité Central do PCP Gonçalo Oliveira, que apontou a Costa “contradições”: “Quando o primeiro-ministro refere como prioridade o emprego digno com um salário justo, é preciso não esquecer que, ainda há pouco tempo, foi o governo que travou o salário mínimo nacional nos 500 euros, quando devia ter ido até aos 600”. Ora, para o dirigente comunista, esta recusa do governo em chegar aos 600 euros de salário mínimo “significa continuar a apostar numa política de baixos salários e de exploração de quem trabalha”.
A dureza com que o PCP voltou a insistir que mudanças a sério só com “uma política diferente” – “O PCP está confiante de que é possível assegurar um futuro melhor, mas tem de ser construído. Para continuar a chegar lá é preciso uma política diferente” – contrastou com alguma simpatia do Bloco. A reação a Costa ficou a cargo de Ricardo Robles, o vereador em Lisboa que tem um acordo com o PS de Fernando Medina.
Robles afirmou que Costa “focou o mais importante no país” e que foi “a solução política que resultou dos acordos (…) que permitiu a recuperação da economia”. “Temos um país que devolveu rendimentos e ao mesmo tempo permitiu à economia crescer e recuperar emprego. A receita da austeridade falhou e este ano é essa prova”.
“[A comunicação social] procura atacar o PCP e silenciar o seu determinante papel e contributo para os avanços neste Orçamento e, ao mesmo tempo, permitir que outros, em particular o governo do PS, capitalizem o resultado das medidas aprovadas”